Sindicato de vendedores ambulantes em Barcelona criou linha de sapatilhas para lutar contra estigma e discriminação dos imigrantes.
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"Não é apenas sobre fazer, mas sim sobre fazê-lo da forma correta". Este é o lema da linha de sapatilhas recentemente lançada pelos vendedores de rua de Barcelona - a sua maioria vindos do Senegal - que, cansados da discriminação e do preconceito por venderem produtos "contrafeitos", decidiram juntar-se para criar uma cooperativa ética, carregada de histórias de luta e sobrevivência, e lançar a própria marca de calçado sustentável com produção em Portugal e em Espanha. O objetivo é usar os lucros para melhorar as condições dos "manteros", tirá-los da rua e oferecer uma alternativa de vida mais digna.
"Criamos a marca Top Manta para combater a ideia de que somos ilegais e que vendemos falsificações. Queríamos acabar com esse estigma", contou ao JN Yacine Diop, 26 anos, porta-voz do Sindicato Mantero, criado em 2015 por 200 vendedores ambulantes de Barcelona.
Agora, apresentaram as sapatilhas "Ande Dem", que em uolof - idioma falado no Senegal - significa "caminhando juntos". "Nós somos um coletivo. Se um ganha, ganham todos e não deixamos ninguém para trás", explica Yacine.
Também ela veio do Senegal. Tinha apenas 10 anos quando pisou solo espanhol. E, por isso mesmo, é possível sentir-lhe a paixão na voz quando nos diz que a "Top Manta é a marca de todos os que fizeram uma viagem de coragem e de luta".
Uma marca que, nestes quase quatro anos, se tornou um agente social e político na luta pelos direitos dos "manteros"" e que almeja ser uma alternativa ao "capitalismo selvagem do sistema atual".
"São pessoas que arriscaram a vida para chegar aqui, que sobreviveram à viagem num bote, tiveram dificuldades para entrar no país e que têm necessidade de lutar, de dizer que têm os mesmos direitos que todos os outros", sublinha Yacine.
"Queremos ter voz"
Essa mesma ideia está representada no logótipo da "Top Manta", uma espécie de tapete que faz alusão, não só às mantas que os vendedores colocam no chão com os produtos, mas acima de tudo que recorda a arriscada viagem marítima que muitos fizeram para chegar a Espanha. "Queremos que nos escutem, queremos ter voz. Criámos o sindicato e conseguimos mesmo criar a nossa marca".
Das mantas para a loja física e online da cooperativa, os ganhos serão usados para combater as barreiras impostas pela lei de imigração espanhola, que exige uma morada fixa durante um ano, três de estadia no país, um contrato de trabalho e uma prova de aprendizagem da língua para que os imigrantes consigam uma licença de residência.
Além disso, com as sapatilhas, a "Top Manta" quer demonstrar que é capaz de fazer melhor do que muitas marcas internacionais, pouco preocupadas com a sustentabilidade e com produção que assenta na exploração de pessoas, diz a cooperativa.
"Lutámos muito para conseguir o que temos hoje e por isso decidimos fabricar as sapatilhas em negócios locais, com produção sustentável", acrescenta Yacine. Assim, o coletivo optou por uma produção sustentável e tem apenas um stock de 400 unidades. Já para a confeção recorreram a técnicas artesanais de pequenos negócios em Pedroso, Vila Nova de Gaia, em Guimarães, em Vila Nova de Famalicão e em Alicante, Espanha.