A Sérvia presta, esta quarta-feira, homenagem aos seus "mártires" caídos no domingo no Kosovo, membros do comando acusado de matar um polícia kosovar numa emboscada, enquanto Pristina afirma ter impedido "um cenário de carnificina".
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As bandeiras estão a meia-haste na capital sérvia, Belgrado, porque hoje foi decretado dia de luto nacional, tal como nas localidades de maioria sérvia do norte do Kosovo.
Em declarações à televisão nacional (RTS), o ministro da Defesa sérvio, Milos Vucevic, equiparou os membros do comando paramilitar mortos aos sérvios caídos no passado "pela liberdade do Kosovo e pela liberdade da Sérvia". "São as novas vítimas desta linhagem de heróis ou de mártires (...) pela liberdade do povo sérvio no Kosovo", declarou.
Também os tabloides sérvios saudaram os membros do comando, chamando-lhes "Os nossos heróis kosovares" (Informer) e "As vítimas do terrorismo de [Albin] Kurti" (Alo), numa referência ao primeiro-ministro do Kosovo.
Há ainda muitos elementos pouco claros neste episódio de violência que fez, no total, quatro mortos, acirrando o conflito entre a Sérvia e a sua antiga província, de maioria albanesa, cuja independência, proclamada em 2008, nunca foi reconhecida por Belgrado.
Os três homens, residentes no norte do Kosovo, foram mortos numa operação das forças especiais kosovares, após a morte de um polícia kosovar albanês numa emboscada.
Algumas horas após o ataque mortal, perto da aldeia de Banjska, a alguns quilómetros da fronteira sérvia, dezenas de homens fortemente armados refugiaram-se num mosteiro.
Quando a polícia kosovar tomou o mosteiro, eles já lá não estavam. Segundo Pristina, pelo menos seis deles, feridos, terão atravessado a fronteira para a Sérvia, para receberem tratamento num hospital de Novi Pazar, no sul do país.
Só três foram detidos e colocados em prisão preventiva em Pristina, por "crimes contra a ordem constitucional e a segurança da República do Kosovo".
Pristina de imediato acusou Belgrado de estar por detrás daquele ataque "criminoso e terrorista". A Sérvia negou, culpando o líder do Governo kosovar e as suas "provocações" aos sérvios do Kosovo.
O ministro do Interior kosovar, Xhelal Sveçla, reiterou hoje as acusações, afirmando que um dirigente político dos sérvios do Kosovo, Milan Radoicic, fazia parte do comando e que um dos sérvios mortos, Bojan Mijajlovic, era um ex-guarda-costas do atual diretor dos serviços secretos sérvios, Aleksandar Vulin.
Segundo uma lista divulgada por Albin Kurti, a polícia apreendeu 150 quilos de explosivos, dezenas de espingardas automáticas, lança-'rockets' e um veículo blindado.
"Com mais de cinco milhões de euros de armamento militar e quantidades suficientes para um grupo de centenas de combatentes, o cenário de carnificina no Kosovo ficou provado", disse hoje Kurti numa reunião do Governo.
"A Sérvia está totalmente envolvida neste ataque terrorista", acrescentou, deixando entrever dias complicados no que diz respeito à "normalização" das relações com Belgrado, que já se encontram num impasse.
Cerca de 120.000 sérvios vivem no Kosovo, um terço dos quais no norte do país, numa população total de 1,8 milhões de habitantes, na grande maioria albaneses.
O ministro da Defesa sérvio lamentou também a ausência de reação da Kfor, a força da NATO (Organização do Tratado do Atlântico-Norte, bloco de defesa ocidental) no Kosovo, perante os recentes atos de violência.
"Estamos desiludidos com a reação da Kfor", declarou Vucevic, argumentando que aquela força "deve ser a primeira a reagir em tais situações, para impedir que o banho de sangue prossiga".
Por sua vez, a muito influente Igreja Ortodoxa Sérvia (SPC) exortou os seus fiéis a rezarem "por todas as vítimas (...) os sérvios e os albaneses" e pela "paz para todos".
Mas criticou, ao mesmo tempo, uma "política perigosa das autoridades de Pristina, cujo objetivo é escorraçar totalmente o povo sérvio" do Kosovo, que é, segundo a SPC, "parte inseparável do Estado da Sérvia".