Bruxelas propõe medidas para facilitar circulação de bens para a Irlanda do Norte
A Comissão Europeia propôs esta quarta-feira um pacote de medidas flexíveis com vista a "responder às dificuldades que as pessoas na Irlanda do Norte têm vindo a enfrentar devido ao Brexit", ao nível da circulação de mercadorias desde a Grã-Bretanha.
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As "disposições à medida" propostas pelo executivo comunitário, que contemplam novas flexibilidades na área da alimentação, saúde vegetal e animal, alfândegas e medicamentos, através da aplicação de um modelo diferente para a implementação do Protocolo da Irlanda do Norte, visam dar resposta não só às inquietações de Belfast mas também de Londres, que tem vindo a reclamar a renegociação deste elemento do acordo de saída do Reino Unido da UE.
Apesar de ter assinado o Protocolo ao cabo de anos de negociações, o Governo de Boris Johnson alega agora que o mesmo está a causar dificuldades inesperadas no fluxo de mercadorias para a Irlanda do Norte, cenário que Bruxelas tenta melhorar com o pacote de propostas apresentado esta quarta-feira pelo comissário das Relações Interinstitucionais, Maros Sefcovic.
O Governo britânico já prometeu estudar de "forma séria e construtiva" as propostas apresentadas pela UE. "O próximo passo deve ser negociações intensivas sobre os nossos dois conjuntos de propostas, conduzidas rapidamente, para determinar se há um terreno comum para encontrar uma solução", disse.
Redução de 80% dos controlos de bens
Na sua reunião semanal, o colégio da Comissão adotou então quatro textos não-legislativos que cobrem diferentes áreas, o primeiro dos quais relativo a uma solução "personalizada" para a Irlanda do Norte a nível de alimentação, saúde vegetal e animal - ou seja, "questões sanitárias e fitossanitária" - que alega que levará a uma redução de aproximadamente 80% dos controlos dos bens a serem consumidos pelo norte-irlandeses.
Por outro lado, propõe formalidades aduaneiras flexíveis para facilitar a circulação de mercadorias da Grã-Bretanha para a Irlanda do Norte, com vista a uma redução de cerca de 50% da burocracia atualmente em vigor, designadamente através da redução para metade da documentação exigida.
Uma outra proposta prende-se com a segurança ininterrupta do fornecimento de medicamentos da Grã-Bretanha para a Irlanda do Norte a longo prazo, o que exigirá a UE alterar a sua própria legislação a nível de medicamentos, sublinha a Comissão.
Por fim, Bruxelas propõe um "maior envolvimento com as partes interessadas e autoridades da Irlanda do Norte", para "melhorar o intercâmbio de informações" com os atores daquele território no que respeita à implementação do Protocolo e das medidas relevantes da UE, tornando a aplicação do acordo "mais transparente, ao mesmo tempo que respeitaria a ordem constitucional do Reino Unido".
A Comissão diz-se agora pronta a manter "discussões intensas" com o Governo do Reino Unido, "com vista a alcançar uma solução permanente acordada conjuntamente o mais rapidamente possível".
"Escutei e comprometi-me com as partes interessadas da Irlanda do Norte. As propostas desta quarta-feira são a nossa resposta genuína às suas preocupações. Temos trabalhado arduamente para que elas produzam uma mudança tangível no terreno, em resposta às preocupações levantadas pelos povos e empresas da Irlanda do Norte", comentou o comissário Sefcovic.
A Comissão diz acreditar que "este pacote de medidas fará uma verdadeira diferença no terreno na Irlanda do Norte e aborda os problemas relacionados com o Brexit no que diz respeito à circulação de mercadorias da Grã-Bretanha para a Irlanda do Norte que foram levantados pelos povos e empresas da Irlanda do Norte".
"Este pacote abre o caminho para uma resolução de todas as questões de implementação pendentes, estabelecendo assim previsibilidade, estabilidade e certeza para as pessoas e empresas na Irlanda do Norte", argumenta o executivo comunitário.
Um dos elementos que mais arrastou as negociações em torno da saída do Reino Unido do bloco europeu - definitivamente consumada no início do corrente ano - foi precisamente o protocolo com vista a evitar o controlo de mercadorias ao longo da fronteira terrestre entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda, que continua a ser Estado-membro da UE.
O mecanismo dá à Irlanda do Norte um estatuto especial e mantém o território na prática dentro do mercado único europeu devido à necessidade de manter uma fronteira aberta com a República da Irlanda, membro da UE, para respeitar o processo de paz na região. Como resultado, passaram a existir controlos aduaneiros e documentação adicionais no porto de Belfast de mercadorias que chegam do Reino Unido.
Na terça-feira, em Lisboa, onde se deslocou simbolicamente, "em nome da mais antiga aliança do Reino Unido", para apresentar a versão de Londres sobre as alterações ao protocolo, o secretário de Estado britânico para as Relações com a União Europeia (UE), David Frost, considerou que o documento constitui "a maior fonte de desconfiança" entre as duas partes, tema que pretende ver resolvido.