Cartel de Sinaloa foi decapitado mas a detenção de "El Mayo" pode não afetar o negócio
Dois dos principais líderes do cartel de droga mexicano de Sinaloa foram detidos por agentes norte-americanos no Texas, quinta-feira, durante uma operação com contornos cinematográficos e sem o envolvimento das autoridades mexicanas, mas ainda é difícil perceber o que vai mudar no tráfico de droga na região.
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O cofundador do cartel, Ismael “El Mayo” Zambada, declarou-se inocente de acusações de tráfico de droga num tribunal dos EUA na sexta-feira, depois de detido, um dia antes, juntamente com Joaquin Guzman Lopez, filho de outro membro do cartel, Joaquin “El Chapo” Guzman, que já se encontra numa prisão americana. Quais são as implicações da captura dos dois dos traficantes de droga mais procurados do México?
Impacto no cartel de Sinaloa
A chefe da Agência Antidrogas dos EUA (DEA), Anne Milgram, considera que a prisão de Zambada “atinge o coração do cartel que é responsável pela maioria das drogas, incluindo fentanil e metanfetamina, que matam americanos de costa a costa”.
Mas especialistas afirmam que a captura não será um golpe de misericórdia para a poderosa organização criminosa. Foi “uma vitória importante, mas sobretudo simbólica” para as autoridades americanas, segundo os analistas do grupo de reflexão InSight Crime. Zambada, um veterano barão da droga que se evadiu da justiça durante décadas, já teria uma posição recuada nas operações quotidianas do cartel, explicam os especialistas.
Falko Ernst, analista do grupo de reflexão International Crisis Group, descreveu o cartel como “uma estrutura com mil cabeças que não mudará fundamentalmente de forma” com a queda de um ou dois chefes.
Efeito no contrabando de droga
“É improvável que exista uma redução substancial do fluxo de fentanil e outras drogas para os Estados Unidos”, escreveu num comentário Vanda Felbab-Brown, especialista do Instituto Brookings, com sede em Washington. “Para além das lutas internas, o cartel de Sinaloa tem sistemas de redundância para o tráfico e dois dos Chapitos (os filhos de El Chapo) continuam a monte, incluindo Jesus, o chefe das operações internacionais de Sinaloa”, acrescentou.
Mesmo que o cartel de Sinaloa implodisse, o cartel rival Jalisco New Generation assumiria a distribuição de fentanil para os Estados Unidos, aventa Felbab-Brown.
Os analistas da InSight Crime concordam que “estas capturas não são suscetíveis de afetar o fluxo de drogas sintéticas, especialmente o fentanil, para os Estados Unidos”. As barreiras relativamente baixas à entrada na cadeia de fornecimento de drogas sintéticas reduziram a importância de atores isolados como o cartel de Sinaloa, acrescentaram.
A violência dos cartéis vai aumentar?
O cartel de Sinaloa está envolvido em guerras territoriais ultra-violentas com grupos rivais, que, segundo os especialistas, podem tentar aproveitar a oportunidade para expandir as suas operações. Mesmo dentro da organização, há lutas internas entre fações rivais.
As prisões “provavelmente aumentarão a violência criminosa já muito intensa no México e possivelmente deixarão para trás um mercado criminoso ainda mais ameaçador para os Estados Unidos”, segundo Felbab-Brown. A luta pode fortalecer o cartel Nova Geração de Jalisco, “muito mais cruel” do que o de Sinaloa, alerta.
De acordo com Ernst, do Crisis Group, existem cerca de 200 grupos criminosos armados no México, o que complica os esforços para controlar o tráfico de droga. O analista teme também ainda uma intensificação dos combates com o cartel Jalisco Nova Geração, bem como entre as fações de Sinaloa.
Repercussões diplomáticas
As autoridades mexicanas disseram que não estavam envolvidas na operação de quinta-feira nem foram informadas previamente.
No passado, o México queixou-se de não ser informado sobre as atividades da DEA, nomeadamente após a detenção, pelos Estados Unidos, do antigo ministro da Defesa mexicano Salvador Cienfuegos, acusado de tráfico de droga em 2020. O presidente Andres Manuel Lopez Obrador acusou a DEA de fabricar crimes de tráfico de droga contra Cienfuegos e, em resposta, limitou as operações de agentes estrangeiros em solo mexicano.
“As relações já estão muito deterioradas. Não creio que possam ser ainda mais prejudicadas” com as prisões do cartel de Sinaloa, disse à AFP Mike Vigil, chefe aposentado de operações internacionais da DEA. Ele acredita que Washington não informou o México até que Zambada e Guzman Lopez estivessem sob custódia dos EUA para evitar prejudicar a operação.
“Se o México for informado, essa informação pode ser comprometida num minuto”, disse Vigil.