Depois da queda do presidente sírio Bashar al-Assad, militantes do Hayat Tahrir al-Sham (HTS) liderados por Abu Mohammed al-Golani tomaram o controlo da infame prisão de Sednaya, perto de Damasco, e libertaram milhares de pessoas, principalmente opositores do regime de Assad.
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Num local conhecido como "matadouro humano" pelos métodos de tortura e execuções em massa, muitos dos presos estavam retidos nas celas subterrâneas da prisão, às quais é difícil aceder por estarem trancadas códigos secretos conhecidos apenas pelos guardas da prisão, e devido construção complexa e labiríntica.
Os presos saíram da cadeia, reunindo-se com famílias que há muito acreditavam que tinham sido executados. De acordo com a BBC, uma mesquita a 20 quilómetros de distância está a ser usada como ponto de encontro para prisioneiros libertados e as suas famílias.
Na segunda-feira, o grupo de defesa civil sírio Capacetes Brancos disse ter enviado "cinco equipas de emergência especializadas para a prisão de Sednaya para investigar", após relatos de entradas secretas e celas subterrâneas escondidas vários andares abaixo do solo, onde outros prisioneiros poderiam estar detidos.
No entanto, a Associação de Detidos e Desaparecidos na Prisão de Sednaya (ADMSP) emitiu um comunicado na segunda-feira a negar a existência de celas subterrâneas. "A ADMSP confirma a libertação do último detido da Prisão de Sednaya ontem, 8 de dezembro de 2024, às 11 horas da manhã, horário de Damasco", lia-se. Não há verdade na indicação da presença de detidos presos no subsolo, e as informações contidas em alguns relatórios da imprensa são imprecisas", acrescentou.
Esta terça-feira, as buscas, que estavam a ser feitas com especialistas em arrombamento de muros e unidades de cães treinados, foram terminadas sem resultados.
Prisão para opositores
Localizada a 30 quilómetros a norte de Damasco, a prisão de Sednaya, com cerca de 1,4 quilómetros quadrados, está sob a jurisdição do ministro da Defesa e é operada pela Polícia Militar. Sednaya tornou-se famosa pelo uso de tortura e força excessiva após uma revolta de reclusos em 2008.
Os esforços para construir a prisão começaram em 1978, de acordo com um relatório publicado pela ADMSP em 2022. O governo sírio confiscou terras de proprietários locais, atribuindo-as ao ministério da defesa e a construção começou em 1981. O primeiro detido chegou em 1987.
Desde o início da crise na Síria em 2011, a prisão tornou-se o destino final tanto para opositores pacíficos das autoridades como para militares suspeitos de se oporem ao regime. Os detidos geralmente eram transferidos para a prisão depois de passar meses ou até anos presos noutro lugar. Essas transferências geralmente ocorriam após um julgamento num tribunal militar secreto ou até sem ter visto um juiz, não sabendo as acusações contra eles ou por quanto tempo ficarão detidos, de acordo com a Amnistia Internacional.
Sednaya consistia em dois edifícios principais, capazes de abrigar entre 10 mil e 20 mil prisioneiros. O edifício “branco” abrigava militares detidos por crimes ou delitos como assassinato, roubo, corrupção ou evasão de recrutamento. Já o edifício “vermelho” era para civis e militares presos “sob o pretexto de opiniões que expressavam, as suas atividades políticas ou alegações fabricadas de terrorismo”, segundo a ADMSP.
Tortura como método de humilhação
Na prisão, há relatos de espancamentos diários sistemáticos e condições e tratamentos degradante. Muitos prisioneiros eram privados de comida e água durante grandes períodos de tempo e outros eram submetidos a uma regra de silêncio absoluto.
Antigos prisioneiros descreveram o horror sofrido na prisão ao longo dos anos. Omar al-Shogre, que foi preso aos 17 anos e passou 10 meses atrás das grades em Sednaya, disse, segundo o "The New Arab", que tinham de escolher entre morrer ou matar outra pessoa. Os guardas perguntavam-lhes se tinham amigos ou parentes presos e davam-lhes a opção de matar um ou de eles próprios serem mortos.
A tortura também era usada na prisão, mas não para obter informações. O objetivo seria degradar, punir e humilhar. Segundo alguns sobreviventes, as visitas familiares eram sempre seguidas por espancamentos. Além disso, os detidos não tinha acesso a advogados.
Entre os métodos de tortura mais cruéis estava o "tapete voador", onde os presos eram amarrados de bruços numa tábua dobrável. Os prisioneiros também eram forçados a entrar num pneu de um veículo, com as testa pressionada contra os joelhos ou tornozelos, e espancados.
Entre setembro de 2011 e dezembro de 2015, pelo menos 13 mil sírios foram executados extrajudicialmente na instalação em "máximo sigilo", segundo a Amnistia Internacional. Muitos dos executados foram posteriormente enterrados em valas comuns. O Observatório Sírio para os Direitos Humanos (SOHR) disse, em janeiro de 2021, que cerca de 30 mil foram mortos pelas forças prisionais que seguiam ordens do regime.
Ao longo dos anos, as autoridades do regime sírio negaram as múltiplas alegações de abuso realizadas na prisão. O governo de Assad também recusou-se a fornecer informações sobre os detidos arbitrariamente, forçando-os a serem classificados como desaparecidos.