Uma mulher norte-americana passou a infância e a juventude a dizer que o pai era um assassino em série e que a obrigava a ajudá-lo a livrar-se dos corpos. O padre, a professora e a polícia ignoraram os relatos, mas, agora, aos 45 anos, conseguiu ser ouvida. Cães pisteiros identificaram possíveis restos humanos na quinta da família, no Iowa, EUA, onde poderão estar enterradas entre 50 a 70 mulheres.
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A quinta de Donald Studey, nos confins do Iowa, já perto da fronteira com o estado vizinho do Nebrasca, está no centro de uma investigação que pode levar à descoberta, ou confirmação, de um dos maiores assassinos em série dos EUA. A filha do suposto criminoso, Lucy, levou a polícia ao local onde passou a traumática infância, no qual poderão estar enterradas entre 50 a 70 mulheres vítimas da fúria do pai.
"Sei onde estão enterrados os corpos", disse Lucy. A mulher, atualmente com 45 anos, recordou como o pai, Donald Dean Studey, obrigava os filhos a ajudar no transporte dos corpos para os locais onde se livraria das vítimas, um poço com cerca de 30 metros de profundidade, utilizando um carrinho de mão, nos meses mais quentes, e um trenó, no inverno.
"Apenas dizia que tínhamos de ir ao poço, e eu sabia o que isso significava", disse Lucy. "Sempre que ia ao poço ou às colinas, pensava que não ia voltar. Achava que me mataria porque eu não me calava", contou a mulher à revista "Newsweek", lembrando que, em criança, contava a quem a queria ouvir que o pai era um assassino em série e que enterrava as vítimas, quase todas mulheres, num poço e noutros locais na quinta da família, no Iowa, perto da fronteira com o estado vizinho do Nebrasca, onde apanhava a maioria das vítimas, nos arredores da cidade de Omaha.
Studey disse que, ao longo dos anos, contou a história a professores, padres e forças da lei por todo o Iowa e Nebrasca. "Ninguém me dava ouvidos", revelou. "A professora disse que os assuntos familiares deveriam ser tratados em família, e as autoridades policiais disseram que não podiam confiar na memória de uma criança", recordou.
Lucy disse que Donald Studey, que usou múltiplos pseudónimos e nasceu Donald Dean Study, sem o "e", traficava drogas e armas, transportando-as através das fronteiras estaduais, com visitas frequentes ao Arcansas. Passava pelas inspeções com facilidade, tendo os filhos no banco de trás da carrinha. "O meu pai foi um criminoso toda a vida", desabafou.
Os registos que a "Newsweek" conseguiu obter mostram que Donald Studey passou algum tempo na prisão, no Missouri, nos anos 50 do século passado, acusado de pequenos furtos e que foi preso em Omaha, em 1989, por condução sob o efeito do álcool. O xerife disse que era uma pessoa que tinha tido problemas rotineiramente com a polícia.
Donald Studey teve duas mulheres, que alegadamente se suicidaram, embora a filha diga que ele as tentou matar em pelo menos duas ocasiões. De acordo com os registos policiais, adianta a "Newsweek", uma das esposas morreu estrangulada com um cabo elétrico e a outra deu um tiro na própria cabeça. Donald morreu em março de 2013, aos 75 anos.
Se a investigação confirmar a história, poderá desvendar um dos mais prolíficos assassinos em série conhecidos na história americana. A mulher acredita que o pai matou entre 50 a 70 mulheres, ao longo de três décadas. A maioria das vítimas tinha cabelos escuros. Eram caucasianas e, exceto uma fugitiva de 15 anos, estariam na casa dos 20 ou 30 anos. Há também dois homens entre as possíveis vítimas, um na casa dos 40 anos e outro na casa dos 20, disse Lucy, que foi acompanhada no local da investigação pelo xerife do condado de Fremont, Kevin Aistrope, dois agentes e um treinador de cães.
O agente Mike Wake, natural de Fremont, cresceu na zona e lembra-se de ouvir rumores sobre Donald Studey. "Ouvimos histórias", disse, de espírito aberto às novas revelações. "Quando Lucy me chamou, fui lá fora e olhei. Ela disse-me onde pensava que o poço estava... Bem, havia um poço mesmo onde ela disse que estava", recordou.
Os cães pisteiros, treinados para detetar restos humanos, foram diretamente para os locais onde Studey dizia, desde criança, que os corpos tinham sido enterrados. Os animais dirigiram-se aos sítios, conta a "Newsweek", sem serem conduzidos pelo tratador, Jim Peters, que participou nesta visita de forma gratuita.
Um dos cães sinalizou prováveis restos mortais humanos ladrando e o outro sentando-se imóvel onde os restos mortais estariam. Os animais, cães de gado australianos, Heelers, chamados Jojo e Jetti, cheiraram restos mortais em quatro locais, com múltiplas indicações nos últimos dois locais onde os corpos poderiam estar enterrados.
"Isto diz-me que existe o cheiro da decomposição humana na área", disse Peters. "Mais trabalho tem de ser feito para confirmar. Sinto-me bastante bem com o que vi dos cães, mas não posso ficar à sombra da bananeira", acrescentou o treinador dos animais. A ciência sobre cães detetores de cadáveres levanta dúvidas em alguns setores da justiça criminal e da ciência forense. Estudos científicos têm demonstrado que a eficácia pode depender do tempo volvido desde a morte, composição do solo e níveis de humidade, bem como dos cães e do nível de treino.
"Penso realmente que há lá ossos", disse o xerife, Kevin Aistrope. "É difícil acreditar que dois cães bateriam exatamente nos mesmos lugares e seria falso. Não sabemos o que é, mas tenho tendência a acreditar na Lucy", acrescentou. "Neste momento, nem sequer temos um osso. De acordo com os cães, este é um local de enterro muito grande".
FBI inspecionou local há mais de um ano
Um homem que cresceu na quinta vizinha à dos Studey, identificado como Sean Smith, disse que pelo menos dois agentes do FBI inspecionaram o local do poço há mais de um ano e fizeram perguntas. A delegação de Omaha do FBI recusou-se a falar com a "Newsweek" ou confirmar se estava a decorrer uma investigação sobre as acusações a Donald.
Smith disse que o FBI tinha prometido regressar em agosto para averiguar o local. Há semanas, o FBI apareceu e escavou parte do poço, disseram à "Newsweek" fontes das forças da lei. Mas o que encontraram não é claro. O departamento do xerife do condado de Fremont disse que não tinha sido notificado da presença da agência federal de investigação.
A Divisão de Investigação Criminal (DIC) de Iowa é esperada na segunda-feira no local. O passo seguinte será utilizar um sonar, onde a terra permitir, para averiguar o subsolo e depois escavar os locais à procura de restos humanos. "Tudo o que quero é que se dê alguma paz às pessoas e estas mulheres tenham um enterro adequado", disse Lucy Studey.
O gabinete do xerife, com um orçamento de 1,8 milhões de dólares, sensivelmente o mesmo valor em euros, coloca o custo da perfuração do poço em cerca de 25 mil euros, com uma escavação completa a poder ascender aos 300 mil. "Se for necessário, derreto o orçamento do condado, mas vou fazer a escavação", disse o xerife, acrescentando que acolheria de bom grado a ajuda do FBI.
Para além do DCI de Iowa, que sai na segunda-feira para inspecionar a área e possivelmente ajudar no esforço, Aistrope disse que o Departamento de Polícia de Omaha ofereceu ajuda nas perícias, uma vez que as vítimas, segundo Lucy, eram maioritariamente daquela cidade do estado vizinho do Nebrasca.
Entretanto, várias agências estão a procurar registos sobre Donald Studey e pessoas desaparecidas para ver se há correspondência com a descrição que Lucy Studey faz das mulheres que terão sido enterradas no poço.