Governo iraniano não confirma mudança anunciada pelo procurador-geral no último sábado. Ativistas convocam protestos enquanto Justiça comunica mais execuções.
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Várias organizações de direitos humanos iranianas apelaram a uma nova onda de manifestações e greves após o procurador-geral Mohamed Jafar Montazeri revelar, no sábado, que a polícia da moralidade teria sido extinta. O anúncio foi recebido com desconfiança, uma vez que não houve um pronunciamento oficial por parte do Governo, o que leva os ativistas a acreditarem que se trata de uma encenação para travar a oposição interna.
"Não nos devemos deixar enganar pelas manobras que a República Islâmica utiliza em tempos de desespero", alertou, em declarações à AFP, Omid Memarian, responsável da organização Democracy for the Arab World Now, referindo-se ao facto de o regime iraniano usar táticas dilatórias que escondem ações de propaganda.
Além de não existir uma confirmação por parte do Ministério do Interior, responsável por mediar as práticas da Polícia da Moralidade, os órgãos de comunicação estatais assinalaram que Montazeri não tem poder para abolir esta força do regime, já que não é responsável por supervisionar a atuação dos agentes que a integram.
A juntar a isto, após uma reunião de altos funcionários iranianos, na qual o presidente Ebrahim Raisi participou, a agência de notícias ISNA escreveu que o Governo "está a observar com atenção os pedidos do povo", mas sem nunca abordar a eventual extinção total da força policial.
Apesar dos agentes da Polícia da Moralidade não serem vistos nas ruas há várias semanas, a inação do Governo leva a crer que o anúncio se trata apenas de uma forma de tentar amenizar os protestos que já duram há quase três meses e tiveram início após a morte de Mahsa Amini - que terá sido espancada por não fazer o uso correto do hijab (véu islâmico).
Mesmo que a polícia da moral fosse dissolvida, tal mudança não implicaria um revés na política ideológica islâmica, que exige às mulheres que tapem o cabelo e vistam roupas largas. Como explicou o procurador-geral, esta força "não tem nada a ver com o poder judicial", que continuará a fiscalizar o comportamento feminino na sociedade iraniana.
Execuções avançam
Aos olhos dos ativistas, esta seria apenas uma alteração tática na forma como é feita a fiscalização das regras do vestuário. "Nada impede que outras forças de segurança apliquem leis discriminatórias", assinalou Roya Boroumand, uma das fundadoras da organização Abdorrahman Boroumand Center, à AFP.
Ontem, no primeiro dia dos protestos convocados em todo o país, onde várias lojas e serviços estiveram paralisados, as autoridades judiciais anunciaram que vão ser executados alguns dos condenados à morte. A pena capital já tinha sido o destino de seis pessoas que participaram em ações contra o regime, sendo acusadas de travar uma "guerra contra deus" assim como de terem "corrompido a terra", conceitos que se englobam nos delitos contra o Islão.
Em quase três meses de protestos morreram mais de 400 pessoas e pelo menos 15 mil manifestantes foram detidos, de acordo com a organização não-governamental Iran Human Rights, com sede na Noruega.