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A cerca de três meses de celebrar 94 anos e com o marido, Filipe, duque de Edimburgo, a dois de um século e problemas de saúde recorrentes, a britânica rainha Isabel II precisava de tudo menos do anúncio dos duques de Sussex - o neto Harry e a mulher, a norte-americana Meghan Markle - de renúncia às funções de membros seniores da realeza.
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Além do desencanto inerente à decisão do filho mais novo de Carlos e Diana, a monarca enfrenta sugestões de recontextualização do papel da instituição que lidera no cenário político e social do Reino Unido. Neste sentido, nem sequer surge como particularmente histriónica a proposta de Clive Lewis, candidato a líder do Partido Trabalhista, de um referendo sobre uma eventual nova estrutura monárquica.
De qualquer forma, a monarquia britânica sobrevive, há séculos, numa cuidadosa combinação de tradição e modernização e, desde 1952, Isabel II tem sido o fiel de um delicado exercício de equilíbrio. Sexto na linha de sucessão ao trono, não é nada líquido que reste muita simpatia pelo duque de Sussex e respetiva cara-metade na sua tentativa de reescrever o real livro de regras que sua majestade tem tão empenhadamente resguardado nas últimas seis décadas.
Além disso, a "deserção" não afetou o pragmatismo da soberana - ainda assim, segundo alguns média britânicos, revelou-se "devastada" pela atitude de Harry -, que já pediu aos elementos da equipa real que encontrassem rapidamente uma solução para a situação.
Ainda na vertente prática do dossiê, Graham Smith, porta-voz da plataforma Republic, que faz "lobby" por um chefe de Estado eleito, salienta que a decisão de Harry e Meghan vai levar os contribuintes a questionar que fundos vão ser utilizados para garantir a segurança extra intrínseca a uma vida do outro lado do Atlântico. Até porque o casal vai manter o título nobiliárquico.
A exemplo do candidato trabalhista, Smith crê que o atual quadro força a uma reflexão sobre o futuro da monarquia no Reino Unido.
Outra norte-americana
Mas, a avaliar pelas palavras do secretário de Estado da Justiça, Robert Buckland, essa discussão não está no horizonte dos conservadores, atualmente no poder. "Temos de continuar a celebrar e a apoiar a contribuição da família real para o Reino Unido no seu importante papel no serviço público."
Outro aspeto associado à decisão do casal é o desaparecimento de uma base de apoio adicional à transição do príncipe Carlos para o trono, expectável a curto/médio prazo. Como o próprio Palácio de Buckingham admitiu: "Estes são assuntos complicados".
Dickie Arbiter, antigo responsável pela comunicação real, compara a decisão dos duques de Sussex à abdicação de Eduardo VII, em 1936, que deixou a coroa ao fim de onze meses para se casar com a também norte-americana Wallis Simpson. "É o único precedente, não houve nada como isto [o anúncio de Harry e Meghan] na história recente."
Para Arbiter, a resolução mostra que o neto de Isabel II deixou "a emoção comandar a razão" e que o "massacre" da Comunicação Social aquando do nascimento do filho do casal, Archie, pode ter tido papel importante na decisão.
Não se subestime, contudo, a resiliência da monarquia britânica. Que enfrentou, nos últimos 25 anos, por exemplo, a extremamente mediatizada morte de Diana e a lamentável passagem de Sarah Ferguson pela condição de nora da rainha, por via do casamento com André, atualmente envolvido num alegado escândalo sexual com menores. Então como agora, reinou a dúvida. E Isabel.
