Dinheiro, sanções e inimigos: assassinato de Andriy Portnov em Madrid envolto em mistério
A investigação ao homicídio do polémico ex-político ucraniano Andriy Portnov, continua. Porém, após diversos confrontos com jornalistas, empresários e políticos, Portnov aumentou rapidamente a sua lista de inimigos, o que poderá dificultar a busca pelos seus assassinos.
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As autoridades espanholas estão a investigar o homicídio do advogado ucraniano Andriy Portnov, de 52 anos, que morreu atingido por cinco tiros nas costas, na quarta-feira, depois de deixar as filhas no Colégio Americano, em Madrid. A vítima conduzia um Mercedes quando foi surpreendido por dois ou três agressores numa mota, que se puseram em fuga. Um ajuste de contas, provavelmente por dívidas ou motivações políticas, está a ser apontado como o motivo principal para o crime.
Com grande influência na Ucrânia, onde foi conselheiro do ex-presidente, Viktor Yanukovych, uma figura antieuropeia e pró-Rússia, Portnov instalou-se numa mansão em Moraleja, Madrid, com a família, quando tinha 48 anos. Pouco se sabe sobre a vida de Portnov na capital espanhola. No entanto, de acordo com o jornal espanhol "El País", foi em Madrid que o ex-político ucraniano fez alguns movimentos financeiros e patrimoniais notáveis. Há alguns meses, por exemplo, colocou em nome dos filhos uma mansão que possuía nos arredores de Kiev, em Kozyn, nas margens do rio Dnipro, avaliada em 2,5 milhões de euros.
Segundo uma advogada do Centro Ucraniano Anticorrupção, citada pelo "Antikor", que investiga casos de corrupção na Ucrânia, a transferência de bens para familiares próximos pode indicar uma intenção de ocultar propriedade ou evitar a sua apreensão em caso de sanções ou processos criminais. Pode também dever-se a uma tentativa de ocultar a origem ilícita deste ou de outros bens.
Nascido na atual Luhansk ocupada em 1973, Portnov formou-se em direito na Universidade Nacional da Ucrânia Oriental. Nas décadas de 1990 e 2000, trabalhou como advogado privado e funcionário da Comissão de Valores Mobiliários do Estado e do Mercado de Ações e, de 2005 a 2010, Portnov foi aliado da então primeira-ministra Yulia Tymoshenko e legislador que representou o seu partido no parlamento.
Em 2010, Tymoshenko perdeu as eleições e Portnov tornou-se vice-presidente do gabinete do vencedor, Yanukovych, Portnov. Crítico acérrimo da direção pró-europeia e pró-NATO da Ucrânia, Portnov foi dos principais arquitetos jurídicos por detrás das leis repressivas utilizadas para reprimir os manifestantes do Euromaidan em 2014, uma onda de protestos e agitação civil ocorrida na Ucrânia entre 2013 e 2014, e ajudou a redigir legislação que restringia os direitos e liberdades civis para servir os interesses do regime de Yanukovych.
Em dezembro de 2021, nas vésperas da invasão russa ao país, os EUA impuseram sanções contra Portnov, incluindo a proibição de entrada no país e o congelamento de todos os seus ativos financeiros nos bancos americanos. Foi também incluído na lista de pessoas afetadas pela chamada "Lei Magnitsky", que tem como alvo os estrangeiros acusados de corrupção em larga escala e violações dos direitos humanos. Por outro lado, ironicamente, as suas filhas frequentavam o Colégio Americano de Madrid. O ex-político ucraniano também foi sancionado pela União Europeia por alegado desvio de fundos estatais e violações dos direitos humanos na Ucrânia e investigado por “alta traição” por envolvimento na anexação russa da Crimeia em 2014.
Além disso, durante anos, Portnov esteve em guerra aberta com os seus detratores na Ucrânia, levando a tribunal jornalistas e aqueles que o atacavam pela sua proximidade ao governo russo e a suas visões antieuropeias. Venceu todas as ações, o que lhe deu a reputação de exercer uma forte influência no poder judicial da Ucrânia, do qual foi responsável no governo de Viktor Yanukovych até 2014.
As fugas de Portnov
Andriy Portnov deixou a Ucrânia duas vezes. A primeira foi em 2014, após a deposição do presidente pró-Rússia Viktor Yanukovych durante os protestos do Euromaidan. Depois de deixar o país, mudou-se inicialmente para a Rússia e, mais tarde, viveu vários anos em Viena.
Regressou à Ucrânia em 2019, pouco antes da eleição do presidente Volodymyr Zelensky. De acordo com o jornal espanhol "El Español", o regresso foi motivado, pelo menos em parte, pela sua relação de proximidade com Oleg Tatarov, vice-chefe do gabinete do presidente Zelensky, e pela influência significativa que Portnov continuou a exercer no sistema judicial.
A segunda fuga de Portnov ocorreu em junho de 2022, meses após o início da invasão da Ucrânia pela Rússia. O ex-político fugiu pela Hungria com assistência do governo, segundo os meios de comunicação locais, contornando a lei marcial que impedia os homens em idade de alistamento militar de sair do país.
Conhecida pela sua ligação a Moscovo, a família de Portnov terá comprado propriedades de luxo na Rússia.
Crime organizado em Espanha
Esta é a 12.ª morte violenta ocorrida na região de Madrid desde o início do ano. Desde o início da guerra na Ucrânia, Espanha tem sido palco de vários crimes em que os serviços secretos de informações de potências estrangeiras podem estar envolvidos.
Um dos casos é o assassinato do desertor russo Maxim Kuzminov, piloto russo que desertou na Ucrânia e refugiou-se em Alicante. O corpo do ex-combatente do 319.º Regimento de Helicópteros da Aviação Militar Russa foi encontrado numa garagem num prédio no bairro de Villajoyosa e as autoridades espanholas acreditam que o piloto de 28 anos foi morto por homens contratados pelo Kremlin que se deslocaram a Espanha com o intuito de silenciar o desertor que, aquando da fuga para Alicante, denunciou o "genocídio" que estava a ser perpetrado pela Rússia.
Outro caso é a tentativa de assassinato de Alejo Vidal-Quadras, um incidente que os investigadores acreditam ter sido obra do Irão, mas que foi executado por uma célula da temível Macro Máfia holandesa. Alejo Vidal-Quadras, antigo dirigente do Partido Popular espanhol, fundador do Vox e ex-vice-presidente do Parlamento Europeu, foi baleado na cara numa rua do bairro de Salamanca, em Madrid, mas sobreviveu.