O médico Hussam Abu Safiya, diretor do Hospital Kamal Adwan, no norte da Faixa de Gaza, está a ser mantido em condições "desumanas" e submetido a "intimidação física e psicológica" por Israel, disse a sua advogada à AFP.
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O médico de 52 anos ganhou destaque durante a ofensiva israelense no norte de Gaza, relatando nas redes sociais a situação dos doentes, feridos e deslocados no seu hospital. Pediatra de formação, recusou-se a abandonar o complexo localizado em Beit Lahia, no norte, apesar dos avisos do Exército israelita.
Forças israelitas invadiram o hospital em 27 de dezembro, alegando que abrigava um "centro de terror" do movimento islamista palestiniano Hamas.
Dezenas de funcionários foram presos, incluindo Abu Safiya, acusado de ser membro do Hamas, que desencadeou a guerra em Gaza após o seu sangrento ataque ao sul de Israel em 7 de outubro de 2023.
O Ministério Público Militar classificou o caso do médico como "confidencial" e a defesa não teve acesso ao inquérito. A advogada, Ghaid Qassem, conseguiu visitá-lo em 19 de março na prisão de Ofer, na Cisjordânia ocupada. O encontro com Abu Safiya, sob rigorosa vigilância, durou apenas 17 minutos.
"Está a sofrer muito. Está exausto pela tortura, pela pressão e pela humilhação que sofreu para ser forçado a confessar atos que não cometeu", disse.
"Assustadora realidade"
O "calvário" do médico começou em Sde Teiman, base militar no deserto de Negev, no sul de Israel, para onde foi transferido antes de Ofer. No complexo, foi submetido a quatro interrogatórios "com espancamentos, maus-tratos e tortura". Mais tarde, em Ofer, passou 25 dias numa pequena cela, onde também foi interrogado, disse a advogada.
As autoridades israelitas designaram-no como "combatente ilegal" por um período ilimitado, acrescentou.
A lei israelita sobre "combatentes ilegais", adotada em 2002, permite a detenção de suspeitos de pertencerem a "forças hostis" fora das estruturas legais. A legislação foi alterada após o início da guerra em Gaza, observa Adalah, o centro de defesa de direitos das minorias árabes em Israel.
A ONG Anistia Internacional pediu a sua libertação após citar depoimentos sobre a "assustadora realidade" das prisões israelitas, onde os detidos são submetidos a "tortura sistemática e outros maus-tratos". Também organizações de saúde, figuras proeminentes e funcionários da ONU uniram-se a uma campanha nas redes sociais a pedir a sua libertação.
Segundo a advogada, a saúde do médico é "muito preocupante". "Sofre de pressão alta, arritmia cardíaca e problemas de visão", disse. "Perdeu mais de 20 kg em dois meses e partiu quatro costelas durante os interrogatórios, sem receber atendimento médico", disse.
Embora mantenha a "calma", Abu Safiya "interroga-se sobre que crime cometeu" para ser preso "em condições desumanas".
"Dever moral"
Segundo a advogada, os guardas israelitas "estão a exigir que ele confesse ter operado membros do Hamas ou reféns israelitas , mas ele não cedeu" e nega as acusações. Como pediatra, "tudo o que fez foi por dever moral, profissional e humano para com os pacientes e feridos", acrescentou.
Qassem denunciou as restrições impostas às visitas de advogados, que não estão autorizados a informar aos detidos sobre "a guerra, o dia, a hora ou a sua localização geográfica".
Desde 7 de outubro de 2023, cerca de cinco mil moradores de Gaza foram presos por Israel. Alguns foram libertados na troca por reféns do Hamas. Geralmente são acusados de "pertencer a uma organização terrorista" ou representar "uma ameaça à segurança de Israel".
Segundo Qassem, muitos foram presos sem acusação ou julgamento, e os advogados muitas vezes não sabiam o paradeiro dos clientes durante os primeiros meses da guerra.