A Toshiba despediu-se da Bolsa de Tóquio após 74 anos. O epílogo de uma década de escândalos e más decisões foi escrito com a venda a um fundo financeiro, que assume a tarefa de tentar salvar uma empresa estratégica do Japão.
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O Japan Industrial Partners (JIP) adquiriu a Toshiba por 14 mil milhões de dólares (12,7 mil milhões de euros). Foi a solução encontrada para manter o conglomerado de eletrónica em mãos japonesas, após longas batalhas com acionistas estrangeiros que paralisaram uma empresa que chegou a ser a menina dos olhos dos japoneses.
"A Toshiba dará agora um grande passo em direção a um novo futuro com um novo acionista", informou a empresa, em comunicado, divulgado na quarta-feira, no dia em que findou uma presença de 74 anos na Bolsa de Tóquio. O grupo, que fabrica baterias, chips, equipamentos nucleares e material de defesa, foi adquirido pelo JIP.
A empresa tem cerca de 106 mil pessoas e atua em áreas estratégicas no Japão. Ainda não é certo o que vai acontecer aos chamados ativos não lucrativos, mas o diretor-executivo, que se mantém no cargo, apontou um caminho de futuro para a empresa, fundada há 140 anos. “Queremos expandir a capacidade de produção de chips de potência o mais rapidamente possível", disse Taro Shimada numa conferência de imprensa realizada para assinalar a conclusão de uma aquisição pela empresa de capitais privados JIP.
"Vamos otimizar a afetação de recursos às áreas de crescimento e de lucro potencial, tanto no Japão como no estrangeiro", afirmou o diretor-executivo, em declarações citadas pela Reuters, acrescentando que a empresa pretende atingir rapidamente um retorno mínimo de 10% em vendas. A Toshiba planeia gastar 125 mil milhões de ienes (cerca de 180 mil milhões de euros) para mais que duplicar a produção de chips de potência, com o objetivo de pedir meças aos gigantes do setor.
Escândalos e más decisões
A Toshiba é o maior desafio do JIP, um fundo de investimento que já trabalhou na reestruturação da divisão de computadores portáteis da Sony e na unidade de câmaras da Olympus. Após uma década de escândalos, guerras com acionistas estrangeiros e incertezas, a grande tecnológica nipónica tem uma oportunidade de virar a página.
"As dificuldades da Toshiba foram causadas, fundamentalmente, por uma combinação de más decisões estratégicas e má sorte", disse Damian Thong, chefe de pesquisa do Japão na Macquarie Capital Securities, citado na imprensa internacional. Os problemas começaram em 2015, quando foram reveladas más práticas contabilísticas em várias divisões, muitas das quais envolvendo a gestão de topo da empresa.
Durante sete anos, a Toshiba sobreavaliou os lucros em 1,59 mil milhões de dólares (cerca de 140 mil milhões de libras). Entre estas questões, uma má decisão estratégica, com efeitos catastróficos nas contas da empresa. Em 2016, a a Toshiba assumiu a responsabilidade por vários milhares de milhões de dólares relacionados com a construção de uma central nuclear comprada pela Westinghouse Electric, em 2015.
Três meses mais tarde, a Westinghouse declarou falência e começou o descalabro financeiro da empresa. Impactada com um passivo de seis mil milhões de euros, entrou num frenesim de alienações para tentar minimizar os prejuízos. A Toshiba vendeu várias empresas, incluindo telemóveis, sistemas médicos e produtos de linha branca.
Não foi suficiente e numa altura em que as empresas estavam a investir fortemente no futuro da tecnologia e da inovação, a empresa teve de vender a unidade de chips, a Toshiba Memory, um negócio que foi adiado durante vários meses devido a um diferendo com um dos parceiros.
No final de 2017, a Toshiba conseguiu garantir uma injeção de cerca de cinco mil milhões de euros de investidores estrangeiros, em sentido oposto ao que seria a estratégia da empresa. Segundo a BBC, uma investigação realizada em 2021 revelou que a Toshiba tinha conspirado com o Ministério do Comércio do Japão para abafar os interesses dos investidores estrangeiros, por considerar a empresa estratégica para o país.