O Tribunal Constitucional espanhol reconheceu, esta quinta-feira, pela primeira vez a identidade de género como um direito fundamental protegido pela Carta Magna, diferente do sexo, declarando ilegal qualquer tipo de discriminação motivada por este motivo.
Corpo do artigo
O Tribunal Constitucional fê-lo numa sentença em que, embora negue que o despedimento de uma trabalhadora transexual no final do período de experiência foi motivado pela sua identidade de género ou pela expressão externa dessa identidade, aproveita para fazer uma "construção jurídica específica" sobre os conceitos de sexo e identidade de género, o que até então a jurisprudência constitucional não havia feito.
Desta forma, equipara a identidade de género aos restantes aspetos incluídos na Constituição no seu artigo 14, que declara que "os espanhóis são iguais perante a lei, sem qualquer discriminação baseada em nascimento, raça, sexo, religião, opinião ou qualquer outra condição ou circunstância pessoal ou social". Considera, assim, que "deve ser declarada também a ilegitimidade constitucional do tratamento discriminatório, cujo fator determinante parece estar baseado na identidade de género".
Os magistrados explicam que sexo e identidade de género foram usados "indistintamente, tomando-os como sinónimos" na jurisprudência constitucional, como também ocorreu nas normas sobre igualdade entre homens e mulheres. No entanto, nas últimas duas décadas, uma nova lei de igualdade de tratamento em sentido amplo, a evolução da teoria da igualdade entre homens e mulheres e da discriminação interseccional, e o reconhecimento dos direitos ao desenvolvimento da própria orientação sexual e de identidade de género realçaram "a necessidade de especificar a definição dos conceitos de sexo e género".
O Tribunal Constitucional só se referiu a este assunto numa outra resolução de 2019 em que abriu a porta para que os menores "com maturidade suficiente" e que "estão em situação de transexualidade estável" mudem de género para fins legais, mas que nenhum dos dois formulou "uma noção clara de alguns e outros conceitos".
Agora, a Constituição diferencia o sexo, que "permite que as pessoas sejam identificadas como seres vivos femininos, masculinos ou intersexuais" e que "é dado por uma série complexa de características morfológicas, hormonais e genéticas, às quais estão associadas determinadas características e potencialidades físicas que nos define".
Tal diferencia-o do género, que "está ligado a realidades ou características biológicas", mas "não se identifica totalmente com elas", mas define a identidade social de uma pessoa com base nas "construções sociais, educacionais e culturais de papéis, traços de personalidade, atitudes, comportamentos e valores.
O Tribunal considera que "o sexo está ligado à concorrência de uma série de características físicas objetivamente identificáveis ou mensuráveis" e as características associadas ao género "são relativas e circunstanciais e podem variar de uma sociedade para outra e de uma época histórica para outra".