O gigante norte-americano já gastou milhões para acabar com o processo por abuso de posição dominante movido pela Europa e tentou, até, influenciar dois presidentes da Comissão. Sem sucesso. Em causa está o desmembramento da empresa e uma multa de 5,5 mil milhões de euros.
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Na reta final da presidência da Comissão Europeia, quando corria o processo por abuso de posição dominante movido por Bruxelas contra a Google, Durão Barroso visitou as instalações da empresa na Califórnia e reuniu com o seu líder. Uma investigação do jornal britânico "Guardian" revela que, antes do encontro, Larry Page, um dos fundadores da Google, foi avisado pela equipa de Durão Barroso de que seria inapropriado abordar o assunto. Apesar disso, diz o jornal, "durante uma hora, o presidente da comissão esteve sentado, a ouvir", enquanto Page explicava de que forma asseguraria a livre concorrência na Europa.
O objetivo era levar a Comissão Europeia a aceitar a sua terceira proposta de acordo e arquivar o processo por abuso de posição dominante que lhe tinha sido movido e que poderá levar ao desmembramento da empresa na Europa, bem como a uma multa de 5,5 mil milhões de dólares.
A data em que o encontro teve lugar foi mal recebida por alguns responsáveis europeus, mas um porta-voz da Comissão garante que a investigação decorreu de forma "aberta e transparente". A investigação do "Guardian" mostra que os esforços da Google junto de Durão Barroso não foram bem-sucedidos, apesar de ter feito um esforço final, um mês antes de acabar o mandato da Comissão.
O presidente executivo da Google, Eric Schmidt, pediu diretamente a Barroso que pressionasse os comissários para que aprovassem a proposta de acordo. Menos de uma semana depois, contudo, a Comissão reabriu as investigações, contrariando todos os esforços da empresa.
A investigação do "Guardian" mostra que a Google continuou os seus esforços de lóbi ao mais alto nível europeu após a saída de Durão Barroso. O jornal invoca documentos para dizer que tentou reunir várias vezes com responsáveis europeus, incluindo o novo presidente Jean-Claude Juncker, mas sem sucesso.
Comissão prossegue investigação
A investigação à atividade da Google acabou em abril de 2014, já no mandato de Juncker, e concluiu que a empresa abusava da sua posição dominante (tem 90% do mercado dos motores de busca), favorecendo o seu serviço de comparação de preços. A comissária europeia para a Concorrência, Margrethe Vestager, acusou formalmente a empresa de abuso de posição dominante. Decorre, ainda uma investigação ao sistema operativo móvel desenvolvido pela empresa, o Android.
Em resposta, conta o "Guardian", a Google abriu os cordões à bolsa. No ano passado, gastou em lóbi perto de 3,5 milhões de euros, mais do dobro do que a soma do gasto pela Apple, Facebook, Yahoo, Twitter e Uber, na Europa. Só a Microsoft, acusada de apoiar um lóbi contra a Google, gasta mais. Ainda, financiou várias universidades e centros de investigação, para que produzissem estudos a seu favor.
Apesar disso, em novembro do ano passado, o Parlamento Europeu aprovou uma medida para partir o grupo Google, separando o negócio do motor de busca da divisão de publicidade e outros serviços. E a comissária europeia para a Concorrência, Margrethe Vestager deu prioridade total às investigações e já disse que os reguladores comunitários vão investigar a nova empresa-mãe do grupo, a Alphabet, em múltiplas frentes.
Intervenção de senadores dos EUA
O esforço de influência da Google junto dos mais altos dirigentes da Comissão Europeia foi feito diretamente pelos responsáveis da multinacional, por empresas de lóbi contratadas para o efeito e também por vários membros do Senado e da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, cujas campanhas eleitorais também foram financiadas em centenas de milhar de euros pela Google.
Um dos exemplos referidos pelo "Guardian" é o de Bob Goodlatte, líder da comissão para assuntos jurídicos da Câmara dos Representantes dos EUA e cujas campanhas eleitorais são sistematicamente financiadas pela Google. Goodlatte escreveu a alguns eurodeputados dizendo estar "preocupado" com os esforços para montar uma acusação de abuso de posição dominante "que aparentam ter razões políticas".
Outros membros da comissão parlamentar receberam, em conjunto, mais de 200 mil dólares da empresa, em 2014. Nem a Google nem a comissão responderam às perguntas do Guardian.