A decisão do Tribunal de Comércio Internacional dos Estados Unidos, na quarta-feira, de suspender as taxas alfandegárias implementadas por Donald Trump é mais um episódio de uma polémica Administração cheia de batalhas judiciais.
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O tribunal, com sede em Nova Iorque, decidiu que o presidente norte-americano excedeu os poderes do cargo ao regular o Comércio com taxas alfandegárias. O uso das tarifas é “inadmissível não porque seja imprudente ou ineficaz, mas porque [a lei federal] não o permite”, decidiu o órgão judicial.
Tais tributações aduaneiras são normalmente aprovadas pelo Congresso. Donald Trump defendera a implementação destas tarifas devido ao crescente défice dos EUA, o que, na visão do magnata, seria uma emergência nacional – que dá mais poderes ao chefe de Estado.
A Casa Branca anunciou que recorreu da decisão de quarta-feira. O Governo voltou a usar uma retórica inflamatória contra a Justiça, afirmando que os magistrados não foram eleitos – ao contrário de Trump.
No início de maio, a Administração enfrentava 200 ordens de diversos juízes que bloqueavam medidas tomadas pelo Executivo federal, revelou o portal Bloomberg. O Departamento de Justiça sob Trump já tinha pedido 13 intervenções do Supremo Tribunal após decisões de instâncias inferiores – enquanto oito pedidos foram feitos entre 2001 e 2016, pelos Governos de George W. Bush e de Barack Obama, segundo o professor de Direito na Universidade Georgetown, Stephen Vladeck.
Ao mesmo tempo, as autoridades têm coagido empresas de advocacia que têm aberto processos contra as ordens de Trump. Tais sanções, como a suspensão de autorizações de segurança e a proibição de entrada em edifícios federais, têm o objetivo de impedir maiores contestações às medidas tomadas pelo líder da Casa Branca – e a oposição apresentada nos tribunais é grande.
Deportações bloqueadas
No dia 16 de maio, o Supremo Tribunal norte-americano bloqueou a tentativa de deportação para El Salvador de imigrantes venezuelanos, que o Governo dos Estados Unidos alega pertencerem ao gangue Tren de Aragua, através da Lei dos Inimigos dos Estrangeiros de 1798. “O aviso feito cerca de 24 horas antes da remoção, sem informação sobre como exercer os direitos do devido processo para contestar essa remoção, não é certamente aprovado”, afirmaram os juízes.
A decisão impediu a expulsão sem provas que a Administração Trump planeava, mas não analisou o mérito de o presidente invocar uma legislação criada para períodos de guerra ou invasão e utilizada pela última vez contra nipo-americanos, na Segunda Guerra Mundial. O Supremo invocou tribunais de instâncias inferiores para decidirem sobre a aplicação do diploma, com três juízes federais a declarar a lei como inconstitucional, enquanto um, nomeado por Trump, disse que o uso desta é permitido.
O Supremo referiu ainda o caso de Kilmar Abrego Garcia, salvadorenho que tinha uma proteção judicial e mesmo assim foi deportado, numa situação que o próprio Governo classificou como “erro”. Apesar das ordens para “facilitar” a volta do residente de Maryland, casado com uma cidadã dos EUA, o Executivo federal declarou-se “incapaz de providenciar o regresso de um indivíduo deportado por engano para uma prisão em El Salvador”.
Outra decisão, por um juiz federal de Massachusetts, impediu, no dia 7 de maio, o envio de imigrantes oriundos do Laos, das Filipinas e do Vietname para a Líbia – “um país notório pelas suas violações de Direitos Humanos”. Nenhum dos dois Governos que disputam o território da nação no Norte da África afirmaram ter acordos com Washington para receber imigrantes.
Direito à cidadania por nascimento
O Supremo ouviu argumentos, a 15 de maio, e deve decidir a extensão de poder que magistrados federais de instâncias menores têm sobre os decretos presidenciais. A audiência aconteceu no contexto da tentativa da Administração Trump em mudar a interpretação do direito à cidadania dos EUA por nascimento – algo bloqueado por tribunais em Maryland, Massachusetts e Washington.
A Casa Branca quer impedir a obtenção automática de cidadania para quem nascer nos EUA e os pais forem imigrantes em situação irregular ou imigrantes com vistos temporários. A 14.ª emenda da Constituição, alvo da investida do Governo norte-americano, diz que “todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos e sujeitas à sua jurisdição são cidadãs dos Estados Unidos”.
“Se tiver literalmente de abrir processos separados para cada parte queixosa, estará a limitar a capacidade dos tribunais de declarar qual é a lei e de proteger as pessoas”, afirmou Phil Weiser, procurador-geral do Colorado, citado pelo canal NBC News. Para o democrata, a Administração Trump quer “limitar a supervisão judicial sobre ações ilegais”.
Despedimento de funcionários federais
Desde que Trump regressou ao poder, o presidente norte-americano tem realizado uma purga no Executivo federal, tendo extinto diversas agências. Uma juíza federal em São Francisco, na Califórnia, bloqueou temporariamente, a 9 de maio, o despedimento coletivo em diversas entidades federais, sob o argumento de que tais alterações precisam de aprovação do Congresso.
Apesar disso, o Governo dos EUA tem conseguido vitórias no Supremo. O tribunal de maioria conservadora pausou, no dia 23, as ordens judiciais para que o Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), até então comandado por Elon Musk, fosse mais transparente sobre as suas operações. Além disso, o Supremo autorizou a demissão de duas chefes de agências independentes sem justa causa – mas salientou que, no caso do Banco Central dos EUA, o Fed, a decisão não se aplica.
Proibição de pessoas transgénero nas Forças Armadas
O Supremo permitiu temporariamente, no dia 6 de maio, a proibição de pessoas transgénero de servirem nas Forças Armadas dos Estados Unidos. A vitória de Trump veio após o magistrado Benjamin Settle, indicado por George W. Bush, ter bloqueado a medida, em março, argumentando haver falta de evidências para a mudança do julgamento militar em relação a tais indivíduos. Outra juíza federal também tinha impedido tal ação do presidente.
O Pentágono já tinha emitido, em fevereiro, um memorando em que afirma que removeria militares transgénero e rejeitar novos alistamentos. Segundo um oficial da Defesa norte-americana, citado pela agência France-Presse, 4240 pessoas com disforia de género estavam a servir nas Forças Armadas dos EUA no ano passado.