Declarações do secretário-geral da ONU revoltam Governo israelita, que exige renúncia. Noite de bombardeamentos deixa mais de 700 mortos, segundo autoridades de Gaza.
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O secretário-geral das Nações Unidas afirmou esta terça-feira, durante uma reunião do Conselho de Segurança, que os ataques do Hamas, a 7 de outubro, não aconteceram num “vácuo”, referindo a ocupação israelita da Palestina. As declarações geraram protestos do Governo de Israel, com o ministro dos Negócios Estrangeiros judaico a questionar António Guterres e o embaixador do Estado hebraico a pedir a renúncia do diplomata luso.
Sem mencionar Israel, o secretário-geral da ONU disse estar “profundamente preocupado com as violações claras do direito humanitário internacional” em Gaza, apelando à proteção dos civis. “É importante reconhecer também que os ataques do Hamas não aconteceram num vácuo. O povo palestiniano foi submetido a 56 anos de ocupação sufocante”, expressou Guterres, citado pela agência Reuters. “Mas as queixas do povo palestiniano não podem justificar os terríveis ataques do Hamas. E esses terríveis ataques não podem justificar a punição coletiva do povo palestiniano”, completou.
O ministro dos Negócios Estrangeiros israelita rebateu o Guterres. “Senhor secretário-geral, em que Mundo vive? Definitivamente não neste”, indagou Eli Cohen, em declarações reproduzidas pelo diário israelita “The Times of Israel”. O embaixador do Estado judaico nas Nações Unidas, que pediu a renúncia do português, escreveu na rede social X que o secretário-geral “expressou uma compreensão pelo terrorismo e pelo assassinato” e “está completamente desconectado da realidade”. O embaixador israelita em Portugal, Dor Shapira, destacou que a ONU “perdeu a sua credibilidade ao trair o Mundo livre”.
Na mesma sessão do Conselho, os Estados Unidos exigiram que o “Hamas deve deixar de usar” os civis “como escudos humanos” e que “Israel deve tomar precauções”. Após Washington ter vetado uma resolução, na semana passada, o secretário de Estado mudou o tom e disse agora que “pausas humanitárias” devem ser consideradas para a proteção dos civis palestinianos. Antony Blinken, citado pela agência France-Presse, avisou ainda que, se o Irão ou grupos apoiados por Teerão atacarem os EUA de qualquer forma, os norte-americanos vão defender o seu povo e a sua segurança “de forma rápida e decisiva”.
Falta de combustível
A agência das Nações Unidas para os refugiados da Palestina, a UNWRA, alertou que, caso não receba combustível, as operações serão suspensas hoje à noite. Seis hospitais já tinham paralisado as atividades por falta de combustível, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. A possibilidade de ficar sem energia fez com que a UNRWA pedisse uma maior coordenação da ajuda humanitária, após o envio de três colunas. “Num dos carregamentos, recebemos caixas de arroz e lentilhas. Mas para as pessoas cozinharem lentilhas e arroz, elas precisam de água e gás”, salientou a porta-voz da agência, Tamara Alrifai.
Mais de 400 bombardeamentos israelitas a “alvos do Hamas” foram realizados durante a madrugada desta terça-feira, provocando 704 mortes, um recorde desde o início da retaliação de Israel. Segundo o Ministério da Saúde do exclave, controlado pelo grupo islamita, 5791 pessoas já morreram, incluindo 2360 crianças, e 16 297 ficaram feridas. As Forças de Defesa de Israel anunciaram que conseguiram abater três vice-comandantes do Hamas.
Mesquita de Al-Aqsa bloqueada por Israel
A agência de notícias palestiniana Wafa informou que polícias israelitas impediram a entrada de muçulmanos à mesquita de Al-Aqsa,o terceiro lugar mais sagrado no Islão, em Jerusalém. A Polícia permitiu, no entanto, judeus a caminharem pelo local e realizarem rituais, algo proibido pela tradição islâmica.
Presidente francês propõe coligação
Emmanuel Macron reuniu-se com o primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu e propôs uma “coligação regional e internacional” contra o Hamas. O chefe de Estado francês usou como exemplo o combate ao Estado Islâmico, em 2014, quando 86 membros, incluindo países e blocos – como a União Europeia e a Liga Árabe – juntaram-se.
“Passei pelo inferno”, relata refém de 85 anos libertada
“Passei pelo inferno”, disse esta terça-feira a refém do Hamas Yocheved Lifshitz, que viu a invasão do kibutz de Nir Oz e a agressão a moradores. A israelita de 85 anos foi libertada na segunda-feira junto de Nurit Yitzhak, de 79 anos.
No caminho a Gaza, foi agredida pelo condutor da mota e teve dificuldade em respirar. Ao chegar aos túneis do Hamas, ouviu a promessa de que o grupo não faria mal aos reféns. “Eles cuidaram bem dos feridos”, afirmou Lifshitz, que referiu a presença de um médico e a entrega de medicamentos aos sequestrados. Ao ser recebida pela Cruz Vermelha, a idosa chegou a despedir-se de um membro da organização islamita.