Irmãos que mataram mãe adotiva alegam maus-tratos. Amigas da vítima não acreditam
As autoridades espanholas estão a tentar perceber os motivos que levaram dois adolescentes a matar a mãe à facada, na Cantábria. Uma discussão por causa das notas escolares poderá estar na origem do crime que chocou Espanha, mas os testemunhos são contraditórios.
Corpo do artigo
Dois jovens, de 13 e 15 anos, estão detidos por suspeita de assassinar a mãe adoptiva. Silvia López, de 48 anos, foi encontrada sem vida, com sinais de agressão de arma branca, na quarta-feira à noite. Estava despida, com sacos de lixo a cobrir algumas partes do corpo, como a cabeça, no banco de trás do próprio carro. As perícias confirmaram que foi esfaqueada cerca de 20 vezes, mas um golpe, no pescoço terá sido fatal.
Segundo a investigação policial, Silvia terá sido esfaqueada pelo mais velho dos irmãos, J. de 15 anos, na cozinha da casa em que viviam desde que foram adotados, provenientes da Rússia, há 11 anos. Uma discussão sobre uma nota escolar terá precipitado a discussão, que terminou com a morte da mãe adotiva.
Após a detenção, os irmãos indicaram que o crime foi motivado pela exaustão e frustração acumuladas devido às constantes repreensões por causa do desempenho escolar. O diário espanhol "La Razón" adianta, no entanto, que não existem queixas apresentadas por qualquer familiar antes do incidente que pudessem indiciar mau comportamento dos jovens ou um ambiente agressivo do lado dos pais.
Segundo o jornal "El País", o mais velho dos irmãos, que assumiu ter desferido os golpes, disse que eram vítimas de maus-tratos e que no dia do crime estalou uma discussão sobre uma nota escolar. Fontes próximas do processo, adianta aquele jornal, procuram perceber o nível de verdade nas palavras do adolescente que matou a mãe.
Pinceladas num quadro de normalidade familiar
Os investigadores começaram a ouvir familiares e amigos da vítima, incluindo colegas de trabalho no Hospital Cruces, em Bilbao, onde Silvia trabalhava como técnica de riscos ocupacionais. Os primeiros relatos são pinceladas num quadro de normalidade familiar. "Silvia era uma mulher maravilhosa, que se importava muito com os filhos", diz, ao "El País", uma amiga da vítima que prefere não se identificar. "Nunca ouvimos nada ou vimos problemas na família, ela era a mais extrovertida, a mais aberta", diz M., uma vizinha, citada pelo mesmo jornal.
"Estava ótima, sempre sorridente, sempre pronta para ajudar, não entendo como pode ter acontecido algo assim", disse, ao mesmo periódico, Marian, uma das colegas na Paróquia Sagrado Coração, onde a vítima dava aulas de catequese. Católica praticante, Silvia era conhecida do pároco da igreja, António Arribas. "Era alegre, envolvida na paróquia, crente, uma mulher muito dedicada, com um casamento muito unido, a família sempre unida", disse, em declarações à Rádio Castro.
O pároco mencionou ainda "o gesto de altruísmo e caridade" do casal a adotar os rapazes, quando tinham dois e quatro anos. Fontes que conhecem pessoalmente E. e J. disseram ao “La Razón” que os jovens estavam "no caminho errado" e já haviam manifestado comportamentos problemáticos no passado. Um discurso contrariado pela presidente da autarquia de Castro Urdiales, Susana Herrán. Em declarações ao jornal "La Razón", considerou que os jovens tinham "uma personalidade normal para a idade", que os "rapazes não eram conflituosos" e que tinham um registo académico "excelente".
Os rapazes aguardam julgamento detidos. Determinar se o relato de J. corresponde à realidade será fundamental para a pena, porque os alegados maus-tratos podem servir como circunstância atenuante e até como desculpa num julgamento futuro. A lei juvenil espanhola estabelece que o mais velho, de 15 anos, pode enfrentar uma pena de oito anos de cadeia, cinco em regime fechado e três em liberdade condicional.
Ministério Público pediu o internamento do irmão mais velho
O Ministério Público pediu o internamento do mais velho num centro educativo durante seis meses, com a possibilidade de alargar esta medida a mais três, decisão confirmada pelo juiz de instrução, até ao tempo máximo que um menor pode ficar em prisão temporária - nove meses. O irmão mais novo é considerado inimputável pela lei espanhola porque tem menos de 14 anos.
Nas investigações criminais envolvendo menores, os relatórios psicossociais elaborados pelos psicólogos nomeados pelo tribunal são essenciais para validar os depoimentos e definir o ambiente social, educacional e familiar das crianças.
O “onde”, o “quando”, o “quem” e o “como” desta história estão definidos. Mas, em face dos relatos divergentes, as autoridades estão com dificuldades em perceber o "porquê" deste crime que chocou Castro Urdiales, na noite de quinta-feira; dois irmãos mataram a mãe com cerca de 20 facadas e tentaram encobrir o crime, simulando um sequestro.
Despiram a progenitora e tentaram escondê-la na mala do próprio carro. Como não conseguiram, acabaram por colocar o cadáver no banco de trás do carro, levando a viatura a embater num muro. Quando a avó, após vários telefonemas, conseguiu falar com os rapazes, inventaram a história do sequestro, que caiu por terra rapidamente. Seriam detidos pouco depois, escondidos no frio da noite num recanto junto ao mar, na madrugada de quinta-feira.