Israel terá violado acordo de associação com União Europeia ao desrespeitar direitos humanos
Israel terá violado o acordo de associação com a União Europeia, especificamente o Artigo 2.º, sobre as obrigações de respeitar os direitos humanos, com a sua atuação na Faixa de Gaza, segundo um documento da diplomacia comunitária conhecido esta sexta-feira.
Corpo do artigo
“Com base nas avaliações feitas pelas organizações internacionais independentes, há indicações de que Israel está a violar as obrigações para com os direitos humanos ao abrigo do Artigo 2.º do Acordo de Associação entre a União Europeia (UE) e Israel”, disse à agência Lusa fonte europeia, citando um documento que o Serviço de Ação Externa da UE enviou para as representações dos 27 Estados-membros do bloco.
Ao abrigo deste artigo, consultado pela Lusa, os países do bloco comunitário e Israel comprometem-se a respeitar “os direitos humanos e princípios democráticos, que guiam as suas políticas e as políticas internacionais, e que são um elemento essencial” do acordo de associação.
Com base nesta avaliação feita pelo serviço diplomático da UE, os Estados-membros terão de avançar para uma discussão com vista à revisão e possível suspensão desde acordo com Telavive, por causa da ofensiva militar na Faixa de Gaza.
Mais de 100 ONG querem suspensão do acordo
Mais de cem organizações europeias exigem a suspensão do acordo de associação entre a União Europeia (UE) e Israel devido ao “reiterado incumprimento” por este Estado da “obrigação de respeitar os direitos humanos e os princípios democráticos”.
Em declaração conjunta, 114 organizações sindicais, de direitos humanos e humanitárias, entre as quais o português Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente (MPPM) querem que esta seja a decisão a tomar pelos ministros dos Negócios Estrangeiros da UE, que se vão reunir na segunda-feira.
Em particular, as organizações, entre as quais a Amnistia Internacional, a Human Rights Watch, a Federação Internacional dos Direitos Humanos e a Pax Christi International, pretendem que a revisão em curso do cumprimento por parte de Israel do artigo 2.º do Acordo de Associação seja “exaustiva, abrangente e credível”.
Este artigo, acentuam, estabelece que o respeito pelos direitos humanos e pelos princípios democráticos constitui um “elemento essencial” do acordo.
Ora, contrapõem, “perante as provas esmagadoras dos crimes atrozes e outras violações graves dos direitos humanos cometidos por Israel contra os palestinos em todo o Território Palestino Ocupado (TPO), uma revisão credível só pode chegar a uma conclusão: que Israel está em grave incumprimento do artigo 2.º”.
Desta forma, os subscritores, que incluem também as francesas Confederação Geral do Trabalho e União Sindical Solidaires e a União Geral dos Trabalhadores de Espanha, querem que a Comissão Europeia e os Estados-Membros apoiem “medidas significativas e concretas, incluindo a suspensão do Acordo de Associação UE-Israel”.
Os autores do texto, em que estão várias organizações judaicas, como Collectif Judéo-Arabe et Citoyen pour la Palestine (CJACP), European Jews for Palestine, Jewish Call for Peace e a Union Juive Française pour la Paix, declaram-se “chocados com o facto de a UE ter demorado tanto tempo a lançar esta revisão”.
É que, recordam, Espanha e Irlanda já a tinham solicitado em fevereiro de 2024, além da existência de "decisões dos tribunais internacionais, dos mandados de detenção emitidos pelo Tribunal Penal Internacional e dos inúmeros relatórios de organismos da ONU, especialistas independentes, ONG proeminentes e académicos que expõem as violações muito graves dos direitos humanos e do direito internacional humanitário por parte de Israel em todo o Território Palestiniano Ocupado, incluindo crimes de guerra, crimes contra a humanidade — incluindo deslocação forçada, apartheid e extermínio — e genocídio”.
Acresce, sublinham, que “o contexto em que esta revisão está a ser realizada é dramático e requer medidas urgentes e eficazes”, dado o “sofrimento indescritível” dos palestinianos, causado designadamente pelo bloqueio completo de Israel à entrada de ajuda na Faixa de Gaza e à expansão das suas operações militares.
Apontam ainda que, “como partes na Convenção sobre o Genocídio, todos os Estados-Membros da UE têm a obrigação de ‘empregar todos os meios razoavelmente ao seu alcance’ para impedir um genocídio”, a propósito do que entendem que “a ação da UE está muito atrasada”.
Por junto, consideram que uma “revisão fraca ou inconclusiva do cumprimento do artigo 2.º por parte de Israel e/ou a incapacidade da Comissão e do Conselho de suspender pelo menos parte do Acordo de Associação acabariam por destruir o que resta da credibilidade da UE”.
Mais importante ainda, comparam, este desempenho “encorajaria ainda mais as autoridades israelitas a continuar os seus crimes atrozes e outras violações graves contra os palestinos com total impunidade”.
A guerra eclodiu em Gaza após um ataque sem precedentes do grupo islamita palestiniano Hamas em solo israelita, em 7 de outubro de 2023, que causou cerca de 1200 mortos e mais de duas centenas de reféns.
Após o ataque do Hamas, Israel desencadeou uma ofensiva em grande escala na Faixa de Gaza, que provocou mais de 55 mil mortos, na maioria civis, e um desastre humanitário, desestabilizando toda a região do Médio Oriente.
A ofensiva israelita também destruiu grande parte das infraestruturas do território governado pelo Hamas desde 2007.
Israel justificou a ação militar com a necessidade de resgatar os reféns e eliminar totalmente as capacidades militares do Hamas, mas a intervenção israelita foi considerada desproporcionada, com o número de civis palestinianos mortos pelas forças israelitas a aumentar diariamente.
A situação da população do enclave devastado pelos bombardeamentos e ofensivas terrestres israelitas agravou-se mais ainda pelo facto de a partir de 2 de março, e durante quase três meses, Israel ter impedido a entrada em Gaza de alimentos, água, medicamentos e combustível.
A África do Sul levou Israel ao Tribunal Internacional de Justiça pelo crime de genocídio.