Detido em 2019 durante uma viagem de trabalho, Lee Meng-chu foi acusado de fotografar polícias chineses para enviar a grupos de Taiwan. Mesmo depois de ser libertado ficou retido no país.
Corpo do artigo
O empresário taiwanês Lee Meng-chu, retido na China há mais de 1400 dias depois de ter sido acusado de espionagem e roubo de segredos de Estado, saiu da China na passada segunda-feira.
"Voltei para o mundo livre", afirmou, dias depois, em declarações à BBC, recordando "o alívio" sentido ao passar a zona de controlo no aeroporto de Pequim. "Chorei um pouco", confessou o empresário, que foi detido e preso em 2019 por ter tirado fotografias a polícias em Shenzhen. Apesar de ter sido libertado em julho do ano seguinte, Lee ficou impedido de sair da China por ter perdido "direitos políticos", na sequência das acusações que sempre negou.
Uma decisão que gerou muitas críticas, uma vez que é raro Pequim impor sanções deste género a condenados não chineses. Para os ativistas, o facto de o empresário ser taiwanês terá motivado a atuação das autoridades, numa altura de crescente tensão. Apesar de Taiwan ter um governo independente desde 1949, a China considera que o território lhe pertence e que acabará por ser controlado por Pequim, recorrendo, se necessário, ao uso da força.
"Fui apenas um transeunte curioso"
Lee Meng-chu viajou para a China em trabalho em agosto de 2019, enquanto trabalhava numa empresa de tecnologia. No entanto, já tinha morado na cidade oriental de Suzhou e viajava até à China continental pelo menos duas vezes por ano.
Naquele verão, Hong Kong vivia uma onda de protestos pró-democracia, sendo palco de confrontos violentos entre a polícia e os manifestantes. Simpatizante da ideologia revolucionária, o empresário fez um desvio até lá para distribuir panfletos com mensagens de apoio. Depois, seguiu para a vizinha Shenzhen, onde iria encontrar-se com um colega.
Numa clara estratégia destinada a passar uma mensagem de força, centenas de polícias armados reuniram-se num estádio da cidade, com veículos blindados. Ao ver o aparato do quarto do hotel onde estava hospedado, Lee decidiu deslocar-se ao local e tirar algumas fotografias, sem ultrapassar qualquer cordão policial. "Fui apenas um transeunte curioso. Se realmente fosse algum segredo de Estado, como conseguiríamos ver tudo de um hotel", questionou, negando as acusações de espionagem.
Segundo relata a BBC, quando estava a sair de Shenzhen rumo a Taiwan, as dez câmaras de vídeo que transportava para o trabalho que estava a realizar para a empresa chamaram a atenção dos funcionários do aeroporto. Durante a revista ao material, as autoridades encontraram não só as fotos tiradas no estádio como alguns dos panfletos de apoio aos manifestantes e decidiram levá-lo para um hotel e mantê-lo em "vigilância". Durante 72 horas, Lee não saiu do quarto, sendo vigiado por três pessoas que não lhe deram autorização para abrir as cortinas, falar, ver televisão ou ler jornais.
"Todos os dias esperava ansiosamente pelo interrogatório", revelou, contando que não tinha absolutamente nada para fazer, a não ser limpar o chão do quarto. Entretanto, foi levado para um centro de detenção e, meses depois, surgiu numa emissora estatal a pedir desculpa se fez "algum mal à pátria". Mais tarde, explicou ao mesmo meio de comunicação social que o fez na esperança de ser libertado mais rápido. "Não nos podemos incomodar com coisas como a dignidade", explicou. No entanto, logo a seguir foi a julgamento e condenado a um ano e dez meses de prisão por "espionagem e envio ilegal de segredos de Estado". Segundo a comunicação social estatal, que publicou longas reportagens sobre o caso, Lee enviou fotos do estádio de Shenzhen a vários grupos taiwaneses.
O empresário cumpriu a pena numa prisão de Guangdong, onde partilhou cela com mais 15 pessoas. Passava o dia a enrolar cabos de computador e se a tarefa não fosse terminada a tempo era punido fisicamente.