Militar de 37 anos acredita que russos estão a ficar sem forças em Bakhmut e pede ao Ocidente que envie equipamento militar. "Quanto mais cedo nos for fornecido, mais cedo esta guerra terminará".
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O barulho da marcha sobre o solo lamacento, resultado da neve derretida sobre a terra, quebra o silêncio da manhã quieta. A cada passo dado até à trincheira, a pasta escura e pegajosa agarra-se às botas e exige habilidade para descer os escorregadios degraus que levam ao abrigo escavado abaixo do nível do solo. Nesta fase da guerra, os combates mais severos têm acontecido mais a sudeste, nas regiões de Donetsk e Lugansk, mas nem por isso os militares da região de Kharkiv, no norte da Ucrânia, baixam a guarda. Os bombardeamentos são quase diários. "O inimigo não dorme e está sempre a tentar atacar".
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À porta do abrigo subterrâneo sustentado por troncos de madeira, Kostiantyn admite que as últimas semanas têm sido mais calmas, mas a tensão está sempre no auge.
"Aqui não há férias. Nós trabalhamos, defendemos e estamos sempre prontos. Ainda assim, não é como na região de Donetsk". Tal como milhares de ucranianos, o empresário de 37 anos abandonou o emprego e a família para se juntar ao Exército. Já tinha feito um contrato de reserva há oito anos, quando rebentou o conflito na Crimeia, e sempre soube que a invasão russa em larga escala iria acontecer. Só não sabia quando.
"Estamos a treinar desde 2014 e percebemos que o inimigo viria até nós, mais cedo ou mais tarde. Assim, a 24 de fevereiro de 2022, já sabia para onde devia ir e o que devia fazer".
Russos "sem forças"
Quando o dia chegou, a brigada de Kostiantyn, formada por militares na reserva e por voluntários, entrou em ação. A primeira missão foi defender Kharkiv, uma das cidades mais fustigadas pelas tropas russas no início da ofensiva, e depois foi na região de Donetsk - perto de Bakhmut, Soledar e Krana Hora - que continuou a defender as cores da Ucrânia.
Conhecedor das dificuldades em Bakhmut, onde um intenso braço de ferro entre os dois países se desenrola desde agosto, o militar acredita que as tropas russas estão a ficar "sem forças" e a "morrer às centenas ou mesmo milhares", acusando o Kremlin de desperdiçar a vida dos militares. "Ao contrário deles, nós valorizamos cada vida, cada guerreiro porque para nós é um ser humano, uma pessoa em primeiro lugar, o pai ou o filho de alguém. Por agora, temos que recuar um pouco, mas estamos prontos e bem preparados para libertar a nossa terra".
Na defesa do solo ucraniano, Kostiantyn também está atento ao que se diz do outro lado da fronteira, em Moscovo, e critica o discurso de Vladimir Putin, proferido antes do primeiro aniversário da guerra. "Todas as suas ações são completamente imaginárias, não consigo compreender os seus interesses e pensamento. Não há nazis aqui, não estamos a comer bebés russos, apenas queremos paz e prosperidade para todos".
Cumprir o dever
A par das várias camadas de roupa estampada com camuflado militar, o militar ucraniano traz um gorro verde-tropa debaixo do capacete. O inverno trouxe à guerra mais um inimigo, o frio, que o obriga a proteger com luvas as mãos que seguram na Kalashnikov. Apesar de estar motivado, faz eco das palavras de Volodymyr Zelensky para se referir à urgência do equipamento. Há semanas que o presidente ucraniano faz apelos e entra em negociações com os parceiros ocidentais para a chegada de material mais sofisticado, como os tão badalados tanques Leopard 2. "Cada um desses equipamentos está a salvar diariamente a vida dos nossos soldados e civis. Quanto mais cedo nos for fornecido, mais cedo esta guerra terminará".
Há mais de 365 dias que Kostiantyn está na guerra e, longe de casa, vai sabendo dos dois filhos: o mais velho está na Holanda, com a mãe, e o mais novo, com três anos, permanece na Ucrânia, numa terra onde a Rússia ainda não chegou. Segundo a legislação ucraniana, a desmobilização das tropas só pode começar após indicação do presidente e, por isso, não tem data para regressar a casa.
É continuar. "Até que a guerra esteja em curso, ficaremos aqui. A cumprir o nosso dever até ao último momento: proteger a nossa terra e proteger as nossas famílias que são inacreditáveis, são as melhores".