Várias cidades do Irão têm sido palco de violentos confrontos entre manifestantes e a polícia. As mulheres estão a tirar o hijab, a queimá-lo na rua e a cortar o cabelo depois de Mahsa Amini ter morrido às mãos do regime ultraconservador por, alegadamente, usar o véu islâmico de forma incorreta. Pelo menos oito pessoas morreram nos protestos e 250 foram detidas.
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A morte inesperada e, para muitos, inexplicável de Mahsa Amini depois de ter sido detida pela "polícia da moralidade" pelo uso incorreto do hijab, na semana passada, está a gerar uma onda de contestação e protestos no Irão. Pela quinta noite consecutiva, milhares de iranianos, mulheres e homens, encheram as ruas das 15 principais cidades do país do Médio Oriente para protestarem contra a opressão, a violência e o Líder Supremo, Ali Khamenei.
Iran has yearned for this glorious dance for over 40 years.
- Mariam Memarsadeghi (@memarsadeghi) September 20, 2022
Evil is burning - Woman is rising pic.twitter.com/CjGFNESH91
Os manifestantes estão a bloquear as ruas, atirar pedras às forças de segurança, incendiar veículos da polícia e caixotes do lixo. Já as autoridades combatem os protestos com cassetetes, balas de borracha e granadas de gás lacrimogéneo para dispersar as multidões e ainda com "várias detenções", segundo a agência de notícias oficial IRNA. No entanto, e de acordo com diferentes organizações dos direitos humanos, a polícia tem recorrido a munições reais contra a população. Segundo o Hengaw, um grupo curdo de direitos humanos, pelo menos oito pessoas morreram desde o início dos protestos na sexta-feira, mais de 220 ficaram feridas e 250 foram detidas.
Women of Iran-Saghez removed their headscarves in protest against the murder of Mahsa Amini 22 Yr old woman by hijab police and chanting:
- Masih Alinejad ️ (@AlinejadMasih) September 17, 2022
death to dictator!
Removing hijab is a punishable crime in Iran. We call on women and men around the world to show solidarity. #مهسا_امینی pic.twitter.com/ActEYqOr1Q
Unprecedented scenes in Iran: woman sits on top of utility box and cuts her hair in main square in Kerman to protest death of Mahsa Amini after her arrest by the morality police. People clap their hands and chant "Death to the dictator." #مهسا_امینی pic.twitter.com/2oyuKV80Ac
- Golnaz Esfandiari (@GEsfandiari) September 20, 2022
Os protestos eclodiram pela primeira vez na região do Curdistão, no norte do Irão, de onde Amini era natural. Mas agora acontecem um pouco por todo o país, incluindo na capital Teerão, Mashhad (nordeste), Tabriz (noroeste), Rasht (norte), Ispahan (centro) e Kish, no sul do Irão.
Obrigadas a usar o hijab para tapar o cabelo desde a Revolução Islâmica de 1979, as iranianas estão a desafiar as autoridades ao retirarem o véu e ao queimá-lo, enquanto gritam "morte ao ditador" - referência ao Líder Supremo religioso - e "justiça, liberdade, não ao hijab obrigatório". Há até vídeos a circular nas redes sociais onde é possível ver homens a ajudar as mulheres, demonstrando que esta não é uma luta de géneros, mas antes uma luta de todos pela segurança e liberdade no país. Há também quem tenha optado por cortar o cabelo como sinal de revolta contra a morte da jovem de 22 anos.
Iranian women show their anger by cutting their hair and burning their hijab to protest against the killing of Mahsa Amini by "morality police" over hijab. #OpenYourEyes pic.twitter.com/Q3pdL0oRvd
- Anjana Om Kashyap (@anjanaomkashyap) September 18, 2022
Três dias em coma
Mahsa Amini, natural da província ocidental Curdistão, foi espancada dentro da carrinha da "polícia da moralidade", em Teerão, depois de ter sido detida por alegadamente não cumprir corretamente as regras do uso do hijab do país, na terça-feira passada.
A jovem de 22 anos foi abordada pelas autoridades por, alegadamente, não estar a respeitar as rigorosas regras de vestuário impostas às mulheres no país. Mahsa foi detida para uma "sessão de reeducação", mas acabaria por ser internada em estado grave, depois de sofrer um ataque cardíaco, de acordo com a polícia.
A polícia iraniana divulgou imagens de videovigilância que mostram, supostamente, o momento em que Amini desmaiou, mas a família da vítima garante que a mulher não tinha qualquer historial de problemas cardíacos. Testemunhas no local garantem que a "polícia da moralidade" agrediu violentamente a jovem, sem qualquer motivo.
Depois de três dias em coma, Mahsa acabaria por morrer no hospital, na sexta-feira. O incidente está a ser investigado a pedido do chefe de Estado iraniano.
"Símbolo de opressão" domina iranianas há 43 anos
Depois da Revolução Islâmica de 1979, as autoridades iranianas impuseram um código de vestuário obrigatório no país para as mulheres, exigindo que todas usassem um lenço de cabeça e roupa solta para disfarçar "as curvas" em público.
É neste contexto que surge a "polícia da moralidade" - conhecida formalmente como "Gasht-e Ershad" (Patrulhas de Orientação) - com o objetivo de assegurar que as mulheres estão em conformidade com a interpretação das autoridades de vestuário "próprio". É obrigatório cobrir o cabelo em público e a polícia proíbe o uso de saias curtas, calças justas, "jeans" ou roupa de cores vivas, entre outras restrições. Os agentes têm o poder de parar as mulheres e avaliar se estão a mostrar demasiado cabelo, se as calças e sobretudos são demasiado curtos ou apertados, ou se estão a usar demasiada maquilhagem.
As punições por violação das regras podem incluir multas, prisão ou flagelação.
Comunidade internacional de olhos postos no Irão
"A alta-comissária interina das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Nada Al-Nashif, manifestou esta segunda-feira preocupação pela morte de Mahsa Amini - detida pela "polícia de costumes" do Irão, que impõe regras restritas sobre o uso do hijab - e com a reação violenta das forças de segurança às manifestações que se seguiram", sublinhou o Alto Comissariado em comunicado.
Al-Nashif também referiu que as leis de uso obrigatório do véu continuam a ser uma preocupação no Irão, onde aparecer em público sem o hijab é punível com prisão. Os Estados Unidos da América, que estão a tentar reativar o acordo nuclear de 2015 com o Irão, pediram à República Islâmica para que cesse a sua "perseguição sistémica" às mulheres e França mostrou-se preocupada pela forma violenta como as autoridades estão a tratar os manifestantes. A Itália também condenou o incidente, mas o Irão rejeita as críticas que considera serem motivadas politicamente.
O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros iraniano classificou os protestos como "posições intervencionistas estrangeiras". "É lamentável que alguns países estejam a aproveitar um incidente para se colocarem contra o governo e o povo iranianos", afirmou.
O governador de Teerão, Mohsen Mansouri, escreveu no Twitter, na terça-feira, que os protestos foram "organizados para criar agitação", enquanto a televisão estatal alegava que a morte de Amini estava a ser usada como uma "desculpa" por separatistas curdos e críticos do regime.
As redes sociais têm tido um papel crucial nesta onda de contestação, uma vez que mostram a cru a realidade violenta e repressiva vivida no país. Por isso, o Ministério das Comunicações do Irão afirmou esta quarta-feira que o acesso à Internet vai ser interrompido por "razões de segurança", avançou o canal "24NEWS English".
O grupo de piratas informáticos Anonymous hackearam, esta quarta-feira, o Banco Central do Irão, o site do governo e ainda a agência noticiosa estatal Fars, como demonstração de apoio ao povo iraniano.
Fars News Agency Hacked!
- Spid3r ️ ☠️ (@YourAnonSpider) September 21, 2022
Here is 30K record from Database.
- https://t.co/C9WQYXhsHr
Also we leave a message for people of #Iran.
We will win this revolution. With love from #Anonymous #OpIran pic.twitter.com/tP7yMWkEhj