A munição que matou, esta quarta-feira, a vereadora carioca de esquerda Marielle Franco, do PSOL, na zona norte do Rio de Janeiro, pertencia à Polícia Federal do Brasil.
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Segundo a "RJTV", da TV Globo, a munição fazia parte de lotes vendidos por uma empresa privada à Polícia Federal de Brasília em 2006. A perícia realizada pelos peritos da Divisão de Homicídios da Polícia Civil identificou a propriedade da bala com base nas pelo menos nove cápsulas de projéteis encontradas na cena do crime. Segundo a mesma televisão, a munição era original, nunca tendo sido recarregada.
A Polícia Federal - que já instaurou um inquérito ao caso - e a Polícia Civil do Rio vão agora continuar as investigações, tendo já divulgado uma nota conjunta em que asseguram que vão apurar a origem da bala.
Segundo a "Folha de S. Paulo", o lote UZZ-18, fabricado pela empresa CBC, foi o mesmo usado em agosto de 2015, nos municípios paulistas de Osasco e Barueri, numa chacina que culminou na morte de 17 pessoas e na qual estiveram envolvidos três polícias militares e um guarda civil, entretanto condenados pelo crime.
O jornal salvaguarda, no entanto, que desvios de munições compradas por órgãos oficiais não são incomuns, assim como o reaproveitamento das mesmas que, apuraram as autoridades, não aconteceu neste caso.
Marielle Franco, de 38 anos, morreu, na quarta-feira, com quatro tiros na cabeça, disparados com uma arma com 9 milímetros de calibre, a partir de uma viatura que se abeirou do carro em que a vereadora seguia. O motorista que conduzia a viatura, Anderson Pedro Gomes, também morreu baleado, e uma assessora ficou ferida.
Era mulher. Era negra. Era oriunda de uma favela. Era uma política sem papas na língua. Era socióloga. Era mãe. Era lésbica. Era defensora dos direitos humanos desde que perdera uma amiga apanhada num tiroteio na favela Complexo da Maré. E denunciava o racismo e os abusos da Polícia de uma das cidades mais violentas do Mundo. A dela, o Rio de Janeiro, onde era vereadora. Há dois dias, desabafava, via Twitter: "Mais um homicídio de um jovem que pode estar a entrar para a conta da Polícia Militar. Matheus Melo estava a sair da igreja. Quantos mais vão precisar de morrer para que esta guerra acabe?".
6731 pessoas morreram em 2017 vítimas da violência no Rio de Janeiro. 134 polícias eram militares, dez eram crianças. E 1124 vítimas de balas policiais.
O crime gerou uma onda de consternação nacional e a mobilização de vários protestos, até porque culmina uma escalada de violência no Rio de Janeiro, incontrolada apesar de o Governo Federal ter determinado há um mês que a segurança pública do Rio passava a estar nas mãos do Exército. Em janeiro, as estatísticas subiam às 21 mortes violentas diárias.
Aliás, Marielle, quinta vereadora mais votada da Autarquia, onde entrou pelas mãos do Partido Socialismo e Liberdade, tinha sido nomeada relatora da comissão autárquica responsável pelo acompanhamento da tutela federal sobre a segurança do Rio. E, recorda o jornal "Folha de S. Paulo", achava-a "uma farsa": "Tem a ver com a imagem da cúpula da segurança pública, com a salvação do PMDB (partido do presidente Michel Temer), tem relação com a indústria do armamento".
A isto, Marielle somava acusações à Polícia Militar. Mas o mentor dela no PSOL, o deputado estadual Marcelo Freixo, diz não querer acreditar que isso esteja ligado ao assassinato da vereadora. Um crime de "extrema cobardia", segundo Michel Temer.