"O coração de mãe sentiu que algo estava errado": pediatra recebe os filhos mortos no hospital
A pediatra Alaa Al-Najjar despediu-se da família na manhã de sexta-feira, como habitual, longe de imaginar que aquele se transformaria no pior dia da sua vida. Poucas horas depois, iria ver entrar no hospital em que trabalha em Gaza os corpos dos filhos mortos. Dos 10, só um sobreviveu a um ataque israelita.
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79 pessoas morreram nos bombardeamentos israelitas em Gaza da última sexta-feira, incluindo num ataque ao bairro de Qizan al Naijar, em Khan Younis, a sul da Faixa de Gaza. Entre as vítimas estavam Yahya, Rakan, Raslan, Jibran, Eve, Rivan, Luqman, Sadeen e Sidra, nove dos dez filhos de Alaa Al-Najjar. E foi a própria a perceber o drama no hospital onde trabalha, um pesadelo que já tinha imaginado poder acontecer um dia.
“Estava constantemente preocupada com os filhos quando estava no hospital. Quando soube que uma casa tinha sido bombardeada no bairro, o seu coração de mãe sentiu que algo estava errado”, contou Ahmed al-Farra, diretor do hospital. A médica de 35 anos estava de serviço no hospital Nasser, a tratar das vítimas que lhe iam chegando, quando recebeu sete dos seus filhos completamente carbonizados. Dois deles, Yahya, de 12 anos, e Sadeen, de seis meses, permaneciam sob os escombros e foram encontrados mortos pouco depois. Adam, de 11 anos, e o marido de Alaa, Hamdi al-Naijar, foram os únicos sobreviventes do ataque, embora continuem hospitalizados. Hamdi al-Naijar, de 40 anos, era também médico no hospital e continua em estado crítico com uma grave lesão na cabeça e no peito.
“É uma das tragédias mais desoladoras desde o início do conflito e aconteceu a uma pediatra que dedicou a vida a salvar crianças”, partilhou o chefe de enfermagem do hospital, Mohammed Saqer. Quando soube da tragédia, um tio das crianças dirigiu-se de imediato à habitação, na esperança de resgatar os sobrinhos. “Comecei a procurar pela casa na esperança de encontrar alguma das crianças. Infelizmente, apareceu o primeiro corpo queimado. Depois de apagar completamente o fogo, encontrámos os restantes, alguns estavam mutilados e todos estavam queimados”, contou Ali al-Naijar, irmão de Hamdi.
“Ela deixou-os para cumprir o seu dever e a sua missão para com todas as crianças que não encontram outro lugar no Hospital Nasser, que está cheio de gritos inocentes e enfraquecido pela doença, pela fome e pelo cansaço”, escreveu o médico, Youssef Abu Al Rish, numa nota divulgada este sábado pelos serviços de saúde.
As imagens divulgadas após o ataque pela Quds News Network mostram Hamdi na maca com queimaduras graves. A mais velha das crianças falecidas tinha 12 anos, de acordo com o diretor-geral do Ministério da Saúde de Gaza, Munir al-Bursh. O vídeo do resgate dos corpos mostra os agentes da Defesa Civil de Gaza e do Crescente Vermelho Palestiniano a retirarem da casa os corpos carbonizados das crianças, um após outro.
“Um avião das FDI atingiu uma série de suspeitos que foram identificados a operar na zona de Khan Younis, uma zona de guerra perigosa”, relataram as Forças de Defesa de Israel, que aconselharam os civis a evacuar a região para a própria segurança.