Uma reportagem da Caixin, uma revista de investigação jornalística chinesa, revela como as autoridades chinesas ocultaram os primeiros casos de Covid-19, em Wuhan.
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A Caixin, uma das raras publicações independentes na China, revelou como "informações falsas divulgadas por departamentos relevantes deixaram no escuro médicos e enfermeiros" do hospital de Wuhan, no início de janeiro, quando havia perto de 50 doentes internados com uma doença misteriosa.
O chefe do Partido Comunista no hospital não tinha conhecimentos sobre doenças infecciosas e proibiu os médicos de divulgarem informações críticas para a saúde pública, apurou aquela revista de investigação, que fez o filme, de terror, de uma semana crítica para a propagação do Covid-19, no início do ano.
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Segundo apurou a Caixin, um funcionário do ministério de Segurança Pública visitou o hospital de Wuhan no dia 12 de janeiro, e ordenou que os formulários sobre doenças infecciosas só pudessem ser preenchidos e relatados após consultas com especialistas a nível municipal e provincial, atrasando o processo.
Em 13 de janeiro, Wang Wenyong, chefe do gabinete de controlo de doenças infecciosas do distrito de Jianghan, em Wuhan, ligou para o hospital e pediu que fossem alterados relatórios suspeitos de infeção pelo novo coronavírus, arquivados em 10 de janeiro, para que constassem outras doenças nos ficheiros.
Em resposta, o hospital pediu às autoridades de saúde do distrito que recolhessem amostras, mas foram informados que deviam aguardar. A espera durou três dias.
Em 16 de janeiro, após terminarem as reuniões do órgão legislativo local, o centro de controlo de doenças da cidade de Wuhan finalmente foi recolher amostras. Na altura, o hospital tinha 48 casos suspeitos.
Apenas a 20 de janeiro a China declarou emergência para o surto viral, após semanas a garantir que o vírus não se transmitia entre humanos e que só as pessoas que tivessem estado em contacto com animais vivos infetados corriam riscos.
São novos dados, elencados de forma cronológica, que ilustram como as autoridades de Wuhan agiram para suprimir informações sobre a doença, que já causou 4500 mortos e infetou mais de 124 mil pessoas numa centena de países e territórios.
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As novas revelações mostram como as autoridades chineses tentaram encobrir informações sobre o eclodir no Covid-19. A 16 de fevereiro, a própria imprensa estatal chinesa revelou um discurso proferido pelo Presidente chinês, Xi Jinping, em 3 de fevereiro, em que este afirma ter dado instruções sobre como combater o vírus em 7 de janeiro, numa altura em que o coronavírus nem sequer havia sido identificado publicamente como tal.
A divulgação deste discurso indica que os líderes do país sabiam sobre a possível gravidade do surto semanas antes de os perigos terem sido divulgados ao público.
Apenas no final de janeiro as autoridades revelaram que o vírus podia ser transmitido entre seres humanos, um mês depois dos primeiros alertas, feitos por um médico do hospital de Whuan, Li Wenliang, que foi repreendido publicamente pela polícia por tentar alertar os colegas de trabalha para o surto de um vírus desconhecido e fatal.
No dia 30 de dezembro, Li Wenliang enviou uma mensagem aos colegas de trabalho no hospital, através de um grupo de conversação, a alertar sobre o surto e a aconselhar o uso de roupa de proteção para se evitarem uma eventual infeção.
Quatro dias depois (3 de janeiro), foi convocado a comparecer no Gabinete de Segurança Pública e obrigado a assinar uma carta na qual era acusado de "fazer falsas declarações" que "afetaram gravemente a ordem pública".
Li Wenliang foi uma das oito pessoas que a polícia chinesa investigou por "espalharem rumores". Foi autorizado a voltar ao trabalho no hospital de Wuhan e morreu no início de fevereiro, cerca de um mês depois de regressar ao hospital de Wuhan. É um dos 230 funcionários daquele hospital que morreram devido ao Covid-19.
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