O Papa Leão XIV afirmou em julho, numa entrevista para um livro publicado esta quinta-feira, que o Vaticano não podia pronunciar-se ainda sobre se a guerra conduzida por Israel em Gaza constituía um genocídio.
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"A palavra "genocídio" é cada vez mais utilizada. Oficialmente, a Santa Sé considera que não se pode pronunciar neste momento", afirmou então o Papa norte-americano.
As declarações constam de um livro publicado hoje no Peru em espanhol, intitulado "Leão XIV, cidadão do mundo, missionário do século XXI", da jornalista Elise Ann Allen, segundo a agência de notícias France-Presse (AFP).
Leão XIV concedeu duas entrevistas para o livro, a primeira em 10 de julho e a segunda em 30 de julho, de acordo com a publicação norte-americana Crux, de que a autora é correspondente sénior em Roma.
"Existe uma definição muito técnica do que pode ser um genocídio, mas cada vez mais pessoas levantam a questão, incluindo dois grupos de defesa dos direitos humanos em Israel", afirmou.
Em julho, as organizações israelitas B"Tselem e Physicians for Human Rights-Israel (PHRI) acusaram Israel de cometer genocídio em Gaza.
Uma comissão internacional mandatada pela ONU acusou Israel na terça-feira, pela primeira vez, de cometer um genocídio na Faixa de Gaza desde outubro de 2023, com a intenção de destruir os palestinianos.
Desde que foi eleito em 8 de maio, Leão XIV tem multiplicado os apelos para um cessar-fogo em Gaza e a libertação dos reféns detidos pelo grupo extremista palestiniano Hamas.
Leão XIV denunciou na quarta-feira o deslocamento forçado de palestinianos em Gaza, que "sobrevivem em condições inaceitáveis".
Fiel à posição de neutralidade, o Vaticano, que reconhece a Palestina, defende a solução de dois Estados e tem intensificado esforços para uma saída diplomática e pacífica para o conflito.
O Papa considerou ainda "muito preocupante" que "não tenha sido dada qualquer resposta clara para encontrar formas eficazes de atenuar o sofrimento dos habitantes inocentes de Gaza".
"Mesmo por parte dos Estados Unidos, que são obviamente o [país] terceiro mais importante para pressionar Israel", lamentou.
O papa Francisco, que morreu em abril, referiu-se às acusações de genocídio e apelou para que se determinasse se a situação correspondia "à definição técnica formulada por juristas e organismos internacionais".
Israel tem em curso uma ofensiva militar em Gaza desde que sofreu um ataque liderado pelo Hamas em 7 de outubro de 2023.
Na entrevista dada em julho, Leão XIV disse que era "horrível ver as imagens" de Gaza na televisão e expressou a esperança de que a situação se alterasse.
"Espero que não fiquemos insensíveis. É uma reação humana, porque só se aguenta certa quantidade de dor. A insensibilidade é uma forma de proteger os nervos e dizer: "não aguento mais"", afirmou.
"Mas, como resposta cristã, não podemos ficar insensíveis nem ignorar isto. Temos de continuar a insistir e a tentar mudar a situação", acrescentou, segundo a agência de notícias italiana ANSA.
O Papa admitiu também estar preocupado com "algumas coisas que estão a acontecer" nos Estados Unidos.
"Não tenciono envolver-me na política partidária. Não é isso que a Igreja faz. Mas não tenho receio de levantar questões que considero fazerem parte do Evangelho e que, espero, possam ser ouvidas por ambos os lados do espetro político", afirmou.
Disse ter discutido com o vice-presidente norte-americano, JD Vance, temas ligados à dignidade humana num encontro recente no Vaticano.
Referiu, nomeadamente, "a importância de respeitar todas as pessoas, independentemente do local onde nascem, e de refletir isso nas políticas e escolhas" que se fazem.
Leão XIV afirmou ainda que o ensino da Igreja Católica que considera os atos homossexuais como pecado mortal não vai mudar, sublinhando que esta também foi a posição de Francisco.
Acrescentou considerar "altamente improvável, certamente num futuro próximo", qualquer alteração na doutrina da Igreja sobre a sexualidade e o matrimónio.