Programa israelita tem causado polémica em todo o Mundo por estar a ser usado indiscriminadamente. Pedro Sánchez e Margarita Robles foram os alvos mais recentes.
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Vários políticos, jornalistas e ativistas têm sido alvos de escutas ilícitas, através do uso do programa Pegasus que, segundo os seus criadores, tem como objetivo ajudar os governos a combater o terrorismo, mas que facilmente tem caído em mãos pouco recomendáveis.
Os casos de espionagem têm sido recorrentes em países da União Europeia (UE), o que tem aumentado as preocupações de segurança. Agora, uma investigação liderada pelo Parlamento Europeu está a analisar os perigos da utilização do sistema, que recentemente causou polémica em Espanha, já conhecida como Catalangate.
A Comissão de Inquérito liderada pelo Parlamento Europeu foi solicitada depois de os executivos da Polónia e da Hungria admitirem usar o programa, sendo que o início da investigação acabou por coincidir com o escândalo que explodiu em Espanha. Porém, o trabalho do grupo de investigação não conta com o apoio da Comissão Europeia.
A instituição liderada por Ursula von der Leyen reitera que não tem competência para lidar com atividades de inteligência, empurrando a responsabilidade para a segurança de cada país, argumento refutado pelo Parlamento Europeu.
Legislar a utilização
Se as conclusões da comissão confirmarem que existe um perigo iminente, "o Parlamento Europeu irá pedir à Comissão Europeia que legisle a sua utilização", referiu Juan Aguilar, membro da equipa de investigação, ao "El País".
O programa israelita foi desenvolvido pelo NSO Group e, de acordo com a empresa, só deverá ser vendido a governos, tendo elevada eficácia tanto na prevenção de ataques como no desmantelamento de grupos de crime. Mas para a Amnistia Internacional (AI), esta premissa não é justificável, já que relata ter observado registos pouco recomendáveis do uso do sistema. "A utilização e venda desta tecnologia deve ser suspensa", destacou Likhita Banerji, investigadora em Tecnologia e Direitos Humanos na AI.
Já a Autoridade Europeia para a Proteção de Dados (AEPD) defende a proibição do desenvolvimento e implantação de programas como o Pegasus, "a fim de proteger liberdades fundamentais", pode ler-se num relatório.
A polémica em torno do sistema ganhou novos contornos após um relatório do grupo Citizen Lab ter revelado que 63 ativistas catalães foram espiados entre 2017 e 2020, entre os quais o atual presidente regional catalão, Pere Aragonès. O caso estendeu-se ao Governo que, poucos dias depois, denunciou a alegada espionagem dos telemóveis do primeiro-ministro, Pedro Sánchez, e da ministra da Defesa, Margarita Robles, embora os factos tenham ocorrido em 2021.
Portugal não usará sistema
O escândalo levou ao afastamento da diretora do Centro Nacional de Inteligência espanhol (CNI, sigla em espanhol), Paz Esteban, após ter confirmado que pelo menos 20 separatistas foram alvos de escutas com autorização judicial. No entanto, não foi detalhado quem terá espiado os governantes.
Alguns partidos da oposição acusam o Executivo de só ter revelado a espionagem aos membros do Governo para serenar o caso. Já a Imprensa especula que Marrocos, com quem Madrid acabou de encerrar uma crise diplomática, pode estar por trás da ofensiva.
Em Portugal, não há registos do uso do programa e, segundo o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, também não vai haver, já que o sistema "não será usado pelos serviços de segurança".
Entrevista a Nuno Sousa e Silva, professor da Universidade Católica
Podemos estar a ser vigiados
De que forma a União Europeia pode evitar as violações cometidas com o sistema Pegasus?
Através do já existente enquadramento constitucional (de direitos fundamentais e direitos humanos) contraordenacional e mesmo penal para grande parte das utilizações deste sistema (ou sistemas equivalentes). Também é possível colocar um ónus agravado nos fabricantes de telefones, software e outros componentes. No entanto, esta última opção não parece razoável.
Como é que se podem provar os ataques?
Hoje em dia já existem instituições que se especializam nisso, como o Citizen Lab no Canadá, mas é sempre um trabalho difícil, visto que o programa é considerado um dos mais sofisticados no Mundo da ciberespionagem.
Como cidadãos devemos preocupar-nos com o facto de podermos estar a ser vigiados? Como é que sabemos isso?
Creio que se utilizamos um smartphone temos de assumir que poderemos estar a ser vigiados e que não há verdadeiramente forma de o impedir ou de o saber. Dito isto, há boas práticas e soluções tecnológicas que permitem tornar essa eventual vigilância mais difícil ou menos provável.