Perto de 92% das mortes maternas em 2023 ocorreram em países de baixo e médio rendimento
Perto de 92% das cerca de 260 mil mortes de mulheres devido à gravidez e ao parto em 2023 ocorreram em países de baixo e médio rendimento, indica um relatório das Nações Unidas divulgado este domingo.
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O relatório Tendências na Mortalidade Materna, da Organização Mundial da Saúde (OMS), assinala que a maioria daquelas mortes poderia ter sido evitada ao destacar as desigualdades persistentes entre regiões e países.
O documento considera que o mundo não está no caminho certo para cumprir a meta estabelecida pela ONU para a sobrevivência materna ao nível dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
A meta é reduzir a taxa de mortalidade materna (TMM, número de mortes maternas por 100 mil nados vivos) para menos de 70 até 2030, mas tendo em conta que a TMM global foi de 197 em 2023, será necessária uma diminuição anual de quase 15%, quando o nível atual é de cerca de 1,5%.
Divulgado no Dia Mundial da Saúde, o estudo refere que 87% das mortes maternas (225 mil) foram registadas na África Subsariana e no Sul da Ásia, cerca de 70% (182 mil) na primeira região e à volta de 17% (43 mil) na segunda.
No entanto, aponta também que a mortalidade materna diminuiu a nível global cerca de 40% entre 2000 e 2023 e que a África Subsariana foi uma das três regiões definidas pela ONU, juntamente com a Austrália e a Nova Zelândia e a Ásia Central e Meridional, onde se verificaram quedas significativas depois de 2015.
“O acesso a serviços de saúde materna de qualidade é um direito, não um privilégio, e todos partilhamos a responsabilidade de construir sistemas de saúde dotados de recursos que salvaguardem a vida de todas as mulheres grávidas e recém-nascidos”, afirma a diretora executiva do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), Natalia Kanem, citada num comunicado da OMS de divulgação do estudo.
Além dos serviços essenciais durante a gravidez, o parto e o período pós-natal, o relatório assinala a importância de melhorar o acesso ao planeamento familiar e considera “fundamental garantir que as raparigas permanecem na escola e que as mulheres e as raparigas têm o conhecimento e os recursos para proteger a sua saúde”.
Cerca de 75% das mortes maternas devem-se a hemorragia intensa (principalmente após o parto), infeções (geralmente pós-parto), hipertensão arterial durante a gravidez (pré-eclâmpsia e eclâmpsia), complicações do parto e aborto inseguro.
A maioria daquelas causas “é prevenível ou tratável”, nota a OMS.
As mulheres que vivem em países frágeis ou com conflitos são as que enfrentam os maiores riscos de morte materna, que é de 1 em 51 para uma rapariga de 15 anos, enquanto nos que têm condições mais estáveis o risco é de 1 em 593.
Nigéria com maior número de mortes maternas
A Nigéria foi o país com o maior número de mortes maternas em 2023, de acordo com um relatório sobre o tema hoje publicado, e a Guiné-Bissau está entre as nações com a taxa mais elevada.
De acordo com o estudo "Tendências das estimativas da mortalidade materna de 2000 a 2023", do Grupo Interagências das Nações Unidas para a Estimativa da Mortalidade Materna (MMEIG), que analisou 195 nações e territórios, "a Nigéria registou o maior número de mortes maternas" em 2023, com aproximadamente 75 mil óbitos, e representa 28,7% das mortes maternas mundiais desse ano.
A Nigéria, a Índia (com 19 mil mortes), a República Democrática do Congo (19 mil mortes) e o Paquistão (11 mil mortes) - que representam 7,2%, 7,2% e 4,1% das mortes maternas globais, respetivamente, em 2023 - foram responsáveis por quase metade das mortes maternas mundiais, segundo a informação do relatório.
Entre 2000 e 2023 as taxas de mortalidade materna diminuíram em todo o mundo, continuando a hemorragia a ser a principal causa.
O Vírus da Imunodeficiência Humana é referido no relatório como sendo uma das causas indiretas da morte materna. Os três países com maior percentagem em 2023 foram o Essuatíni (16,9%), Moçambique (14,7%) e a Bielorrússia (10,4%).
Em 2023 nenhum país registou uma mortalidade "extremamente elevada", mas, de acordo com a análise apresentada, nove países tiveram uma taxa de mortalidade materna "muito alta", sendo oito nações da África Subsariana: Nigéria, Chade, República Centro-Africana, Sudão do Sul, Libéria, Somália, Afeganistão, Benim e a lusófona Guiné-Bissau.
Segundo o relatório, a "África Subsariana foi responsável por aproximadamente 70% das mortes maternas globais" em 2023.
De forma global, 14 países tiveram uma taxa "elevada", 43 países uma taxa "moderada" e 130 uma taxa "baixa".
O combate à mortalidade materna insere-se nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que entraram em vigor em 1 de janeiro de 2016 para o período de 15 anos que termina em 31 de dezembro de 2030, salientou o MMEIG.
Todavia, alertou, "os contextos humanitários emergentes e as situações de conflito, pós-conflito e catástrofe dificultam significativamente os progressos no sentido de alcançar os objetivos globais em matéria de saúde e bem-estar, incluindo as metas de redução da mortalidade materna".
Em 2023, o Banco Mundial identificou 17 países e territórios afetados por conflitos violentos e 20 outros países e territórios com elevados níveis de fragilidade institucional e social. Coletivamente, "estes 37 países e territórios foram responsáveis por 61,4% de todas as mortes maternas em 2023", citou o MMEIG.
Relativamente ao risco estimado de mortalidade materna ao longo da vida, em 2023 os países com o maior risco estimado foram o Chade e a República Centro-Africana.
Para o MMEIG, "o sistema de saúde tem um papel central" a desempenhar "durante a gravidez, o parto e o período pós-parto (...) e deve ser capaz de responder às necessidades locais e enfrentar os desafios emergentes". "Quase todas as mortes maternas são evitáveis", lamentou.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), na 10.ª revisão da Classificação Internacional de Doenças, definiu como mortalidade materna “a morte de uma mulher durante a gestação ou até 42 dias após o término da gestação, independente da duração ou localização da gravidez, devida a qualquer causa relacionada com ou agravada pela gravidez ou por medidas em relação a ela, porém não devida a causas acidentais ou incidentais”.
O Grupo Interagências das Nações Unidas para a Estimativa da Mortalidade Materna (MMEIG) - que inclui a Organização Mundial da Saúde, a Agência das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), o Grupo do Banco Mundial e o Departamento dos Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas, Divisão da População (UNDESA/Divisão da População) - foi criado em 2006.
O relatório Tendências na Mortalidade Materna foi elaborado pela OMS em nome do grupo interagências de Estimativa da Mortalidade Materna das Nações Unidas, que integra ainda o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o FNUAP, o Grupo Banco Mundial e a Divisão de População do Departamento de Assuntos Económicos e Sociais da organização.