Pix, o sistema de pagamentos brasileiro que está a incomodar Donald Trump e os EUA
Os EUA abriram uma investigação comercial ao Brasil, na última semana, acusando o país de "práticas comerciais injustas" e de "favorecer" o Pix, um sistema de pagamentos digitais criado pelo Estado em 2020, semelhante ao MB Way português.
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O Pix, a forma de pagamento mais usada no Brasil, chegando a superar o dinheiro, encontra-se sob escrutínio das autoridades norte-americanas, de acordo com o jornal brasileiro "Diário do Comércio", desde 2022. A investigação anunciada agora pelo Gabinete do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR) não é inesperada, dado que o presidente dos EUA, Donald Trump, já tinha ameaçado, na semana passada, impor tarifas de 50% sobre produtos brasileiros por alegados problemas de concorrência desleal e de desequilíbrio na balança comercial.
O líder do USTR, Jamieson Greer, relata que a investigação foi solicitada pelo presidente norte-americano, Donald Trump, para apurar "práticas comerciais desleais" do Brasil "que prejudicam empresas, trabalhadores, agricultores e inovações tecnológicas" dos EUA. Os Estados Unidos abriram a investigação por considerarem que o Brasil concede preferências tarifárias a outros países e, em parte, pelo que Trump considera uma "caça às bruxas" contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, julgado no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado.
Em relação à ameaça de imposição das tarifas, o Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, através de uma carta, expressou a sua "indignação" e alertou sobre os efeitos na Economia. Também o vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, deixou claro que o governo brasileiro não vê "nenhum problema" na investigação dos EUA ao Pix e que o que é preciso "resolver" é "a questão tarifária".
Trump "está preocupado com o meio de pagamento que um país adota, que é abraçado por todos, pela população, pelas empresas, pelo sistema financeiro, que é o Pix. É inacreditável algo dessa natureza", sublinhou Rui Costa, ministro da Casa Civil de Lula da Silva.
O Pix, sistema criado pelo Branco Central do Brasil, é usado por 175 milhões de pessoas e "é um modelo, é um sucesso", garantiu Alckmin, em declarações aos jornalistas, segundo a AFP. O Governo de Lula desafiou mesmo os EUA com uma campanha publicada nas redes sociais com o lema "O PIX é nosso, my friend".
Sem referir o sistema Pix, no documento divulgado pelo USTR refere-se que "o Brasil parece envolver-se numa série de práticas desleais em relação aos serviços de pagamento eletrónico, incluindo, mas não se limitando a promover o seu serviço de pagamento eletrónico desenvolvido pelo Governo". E será esta questão concorrencial com serviços norte-americanos que incomoda os EUA.
Um dos possíveis motivos para a abertura da investigação por parte de Trump é o impacto que o sistema de pagamentos pode ter tido na Meta, do empresário Mark Zuckerberg, aliado de Trump. A empresa anunciou, em junho de 2020, no mesmo ano em que foi lançado o Pix, a funcionalidade Whatsapp Pay no Brasil. Uma semana depois, o Banco Central do Brasil e o Conselho Administrativo de Defesa Económica suspenderam a função, justificando que seria necessário avaliar os riscos da operação e potenciais riscos para a concorrência, para garantir o funcionamento adequado do Sistema de Pagamento Brasileiro (SPB).
"O WhatsApp criou uma forma de transferência de dinheiro de pessoas para pessoas, mas estava a fazer isso fora do sistema financeiro legal. Não estava a fazê-lo com integração do nosso sistema financeiro. Portanto, não cumpria a regulação do Banco Central, nem respeitava as regras brasileiras de acompanhamento de transações monetárias”, justificou o Banco Central na altura.
Para a economista Cristina Helena Mello, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), em declarações à Agência Brasil, as operadoras de cartão de crédito norte-americanas também se podem sentir ameaçadas com a nova funcionalidade do “Pix Parcelado”, previsto para começar a funcionar em setembro de 2025, que permitirá aos brasileiros fazer pagamentos a prestações de maneira semelhante ao cartão de crédito, enquanto o destinatário do dinheiro continua a receber o valor total instantaneamente.
Cristina Helena Mello também entende que o Pix incomoda o governo norte-americano por se ter tornado uma alternativa ao dólar em algumas transações internacionais que envolvem brasileiros.
A inesperada crise com os Estados Unidos elevou a popularidade de Lula da Silva, que tem invocado uma mensagem de unidade nacional diante da "interferência" americana. A aprovação do "petista" subiu três pontos percentuais para 43%, enquanto a sua desaprovação caiu de 57% para 53%, entre maio e julho, segundo uma pesquisa da Quaest.