A Polícia moçambicana lançou gás lacrimogéneo contra o local onde o candidato presidencial Venâncio Mondlane fazia declarações aos jornalistas, em Maputo, a apelar à calma no âmbito da marcha que convocou, obrigando o político a fugir. Manifestantes alvo de carga policial para dispersarem.
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Os manifestantes gritavam palavras de ordem como "Salvem Moçambique" e "Este país é nosso".
Cerca das 10 horas locais (9 horas em Portugal continental), a polícia itensificou o lançamento de granadas de gás lacrimogéneo e tiros para o ar enquanto carregava para dispersar os manifestantes, que responderam com o arremesso de pedras e com o lançamento de artefactos pirotécnicos.
A polícia está também a recorrer a elementos com cães e um helicóptero está a sobrevoar a baixa altitude a zona da saída da marcha, o local do duplo homicídio de sexta-feira.
Quando o candidato presidencial Venâncio Mondlane falava com os jornalistas junto à rotunda da Organização das Mulheres Moçambicanas, no início da Avenida Joaquim Chissano, no centro de Maputo, a polícia lançou gás lacrimogéneo na sua direção.
Os manifestantes que se encontravam no local estavam a tentar fazer um cordão humano, mas a polícia voltou a lançar gás lacrimogéneo.
Venâncio Mondlane foi obrigado a fugir.
Um jornalista ficou ferido nesta ação depois de outro ter também ficado ferido na carga policial que ocorreu ao início da manhã.
"É uma vergonha à escala mundial"
Os confrontos entre a polícia e os manifestantes começaram cerca das 7.30 horas, com a força policial a dispersar os grupos que se começavam a juntar para participarem na marcha.
Em declarações à Lusa no local, Armando Morona disse que foi atingido pelo gás lacrimogéneo e que as autoridades não disseram nada: "Só estão a disparar para um lado e para o outro".
"Mas eles que nos aguardem, estamos aqui, ninguém vai recuar", disse o manifestante, referindo que a situação em Moçambique é "uma vergonha à escala mundial, onde se mata um advogado".
"A polícia está a fazer esta pouca vergonha, isto é mais um repúdio aos resultados eleitorais", referiu.
Maputo acordou praticamente sem movimento. Numa ronda feita pela agência Lusa na capital moçambicana foi possível constatar uma cidade com trânsito anormalmente reduzido para o primeiro dia de semana de trabalho, poucos transportes a funcionarem, embora algum movimento pedonal e cafés a funcionar.
Também era visível algum reforço policial, sobretudo na zona prevista para a saída da marcha, o local do duplo homicídio de sexta-feira, e igualmente junto à sede do município.
"Vai ser a primeira etapa, pacífica, em que nós vamos paralisar toda a atividade pública e privada. Vamos para a rua com os nossos cartazes, vamos manifestar o nosso repúdio", anunciou Venâncio Mondlane, no sábado, em Maputo, no local em que dois apoiantes foram assassinados.
Garantiu que a greve, no setor público e privado, que tinha pedido para hoje, em contestação aos resultados preliminares das eleições de 9 de outubro, é para manter, passando agora para a rua, e responsabilizou as Forças de Defesa e Segurança (FDS) pelo duplo homicídio.
"Não se isentem. Foram as vossas forças (...) voltaram a cometer um grande crime", acusou Venâncio Mondlane, garantindo ter provas da acusação às FDS, que inclui a polícia.
A polícia moçambicana confirmou no sábado, à Lusa, que a viatura em que seguiam Elvino Dias, advogado de Venâncio Mondlane, e Paulo Guambe, mandatário do Podemos, partido que apoia Mondlane, mortos a tiro, foi "emboscada".
O crime aconteceu na avenida Joaquim Chissano, centro da capital, e segundo a polícia uma mulher que seguia nos bancos traseiros da viatura foi igualmente atingida a tiro, tendo sido transportada para o hospital.
Em Maputo, a marcha está convocada para sair às 10 horas do local do duplo homicídio.
A polícia moçambicana avisou que vai travar qualquer ato de violência e desordem pública.
"A Polícia da República de Moçambique [PRM] alerta que serão tomadas todas as medidas de polícia coercitivas, necessárias e justificáveis para rechaçar quaisquer atos de vandalismo, violência e desordem públicas generalizadas, greves e manifestações ilegais no país", disse Orlando Modumane, porta-voz da PRM, apelando para que os moçambicanos aguardem pelos resultados das eleições num ambiente de paz, tranquilidade e serenidade.
A Organização dos Trabalhadores de Moçambique - Central Sindical (OTM-CS) demarcou-se da paralisação, alertando para "prejuízos incalculáveis" e sanções aos funcionários.
"É uma agenda dele que não tem nada a ver connosco. Não coordenámos com ele. Nós, os sindicatos, convocamos greve de trabalhadores nos termos da lei do trabalho (...) Agora, os políticos, nós não sabemos qual é a lei que usam para convocarem uma greve geral", disse à Lusa Florêncio Quetane, chefe do gabinete do secretário-geral da OTM-CS.
Também Agostinho Vuma, presidente da Confederação das Associações Económicas (CTA), que congrega o setor privado moçambicano, criticou a paralisação: "Nós já estamos aflitos com a situação de divisas para fazer face às importações e, por várias vezes, temos alertado que a economia sofre muito com o excesso de feriados e tolerâncias de ponto. Este tipo de discurso político só complica mais as coisas".
As eleições gerais de 9 de outubro incluíram as sétimas presidenciais - às quais já não concorreu o atual chefe de Estado, Filipe Nyusi, que atingiu o limite de dois mandatos - em simultâneo com legislativas e para assembleias e governadores provinciais.
A CNE tem 15 dias para anunciar os resultados oficiais, data que se cumpre em 24 de outubro, cabendo depois ao Conselho Constitucional a proclamação dos resultados, após concluir a análise, também, de eventuais recursos, mas sem prazo definido para esse efeito.