Subida dos preços da energia e da comida devido à guerra na Ucrânia podem alterar cenário da Europa. E o futuro dos EUA não parece ser promissor.
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O mais do que provável regresso de Donald Trump à política ativa - as presidenciais nos EUA são já em 2024 - deve ser visto como um movimento de pinça, um ataque à ordem internacional por dois lados, argumenta Thomas Wright, do "think tank" Brookings Institution, num artigo na revista "Atlantic". Diz: "Trump consolidaria o seu controlo sobre as instituições do Governo, dobrando-as à sua vontade (...). E, confirmando que os EUA rejeitariam o seu papel de liderança tradicional, causaria um impacto duradouro no Mundo, exatamente quando ele está num momento particularmente vulnerável". O farol da democracia mundial, que derramou sempre a sua luz sobre a Europa, passaria a emitir outro tipo de luminescência, uma luz demasiado negra, eventualmente.
Mas no Velho Continente, há muito que os sinais de preocupação são visíveis. E Marine Le Pen, a francesa de 53 anos que herdou do pai a Frente Nacional, limpou-lhe as arestas xenófobas e antieuropeístas, mas manteve os traços da extrema-direita, é a primeira cabeça no horizonte de prosperidade eleitoral que se desenha para os populistas europeus. Três vezes candidata presidencial, perdeu sempre, mas a sua votação não parou de subir: 18% em 2012, 34% em 2017 e 41% em 2022, quando perdeu de novo para Emmanuel Macron (58%). Daqui a cinco anos, à quarta tentativa, será definitivamente a sua vez?
Hungria, Itália, Polónia, suécia...
Com a erosão do eixo franco-alemão como cerebelo da Europa, a guerra da Rússia à Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro e sem fim à vista, está a fazer o resto: uma enxurrada de mais de 6 milhões de ucranianos já desaguou na Europa; a gasolina já está acima dos 2 euros/litro; os preços da luz, gás e pão não param de subir. Somando-se o custo da transição para a "energia verde", que já sai do bolso dos europeus, a democracia ganha sombras.
Mas, quem são e onde estão os outros estandartes da extrema-direita?
Na Hungria manda Viktor Orbán, confesso "iliberal" no poder desde 2010 e que venceu as eleições de abril com 53%. Orbán tem histórico: desrespeita a democracia, aperta cercos à Imprensa e aos intelectuais, restringe liberdades de migrantes e gays, alimenta a teia da corrupção. Mas mantém a sua popularidade intacta - mesmo se é louvado pelo russo Putin.
Na Polónia, Jaroslaw Kaczyski, um nacionalista conservador que aprecia Le Pen e o italiano Matteo Salvini, vê o seu partido Lei e Justiça (PiS) popularizar-se com a guerra. Quanto tempo faltará para que os seus acólitos comecem a bradar contra a torrente de ucranianos que entram no país?
Em Itália, além de Salvini e do seu partido populista La Liga, emerge uma nacionalista também da direita extrema: Giorgia Meloni, do partido Irmãos da Itália. As eleições são na primavera de 2023.
Na Suécia, o nome é Jimmie Akesson: o seu Partido Democrata Sueco, sempre na casa dos 20%, é de linha dura no crime e na imigração. Nas eleições de setembro pode coligar-se com o partido Moderados, que também é de extrema-direita.
Em Espanha, que tem eleições no final de 2023, a figura é Santiago Abascal. O seu Vox, 3.ª força política, já é uma bandeira da guerra cultural e do politicamente incorreto. Parece só estar cá para dividir e depois reinar.
O CASO DOS EUA
Sismo à vista nas eleições de 2024?
E se, ao contrário do que pensou o racional Ocidente em 2020, a eleição presidencial do democrata Joe Biden não foi o ansiado retorno dos EUA à normalidade democrática, mas antes um intervalo na deriva populista de extrema-direita de Donald Trump? O ex-presidente (2016-2020) está claramente a preparar o seu regresso para 2024, ano de novas presidenciais nos EUA. Joe Biden, que fará em novembro 80 anos, tem a popularidade em níveis subterrâneos: menos de 40% de americanos aprovam hoje o seu desempenho presidencial, um mínimo histórico. Sem outro candidato democrata à vista (a vice-presidente Kamala Harris eclipsou-se), Trump parece ter as portas da Casa Branca escancaradas. Uma sondagem de março do site "Politico" dizia que 56% dos republicanos votaria nele. É o número mais alto de apoio a Trump em sete sondagens desde novembro de 2020. Prognósticos? À distância de mais de dois anos, o abalo sísmico é o cenário mais provável na América de 2024.