O presidente interino da Síria, Ahmad al-Sharaa, pediu na ONU o fim da agressão israelita ao país e a Gaza, e saudou a vitória do povo sírio sobre o regime deposto.
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Durante a sua intervenção no debate geral da 80.ª sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas, que esta quarta-feira prossegue em Nova Iorque, Al-Sharaa sublinhou o papel dos sírios no momento atual do país, uma vez que "não tiveram alternativa a não ser organizar-se e organizar-se a nível militar para derrubar um regime criminoso" que esteve "no poder mais de 60 anos", numa referência à deposição do presidente Bashar al-Assad em dezembro de 2024.
Al-Sharaa enumerou os vários esforços do novo Governo em busca de uma nova normalidade num país que foi assolado por uma guerra civil que durou mais de uma década, esforços esses que passam por levar a tribunal todos os "envolvidos no derramamento de sangue" que a Síria ainda está a sofrer.
"Formámos comissões para apurar os factos e concedemos acesso às missões de investigação da ONU", afirmou o líder interino sobre os massacres interreligiosos, prometendo "erradicar o sectarismo" no país.
Apesar destes esforços para acabar com os conflitos no país, Al-Sharaa acusa Israel de continuar a atacar a Síria, sob o pretexto de questões territoriais e em defesa da minoria drusa (minoria religiosa que provém do islamismo xiita), com o líder sírio a frisar que esta ameaça de Telavive abre a porta a "novas crises e lutas na região".
"As políticas israelitas contradizem a posição internacional de apoio à Síria", afirmou.
As tensões com Israel aparentam ter melhorado após as declarações do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, que afirmou no domingo passado que a recente guerra entre Israel e o movimento libanês Hezbollah criou a possibilidade de paz com o Líbano e a Síria.
No entanto, ainda em julho, na sequência dos episódios sangrentos de violência sectária no sul da Síria, na província de Sweida, Israel atacou militares sírios enviados para restabelecer a paz na região. Pelo menos 15 soldados das forças governamentais foram mortos pelos ataques israelitas.
Telavive atacou inclusive edifícios governamentais no centro de Damasco, alegadamente em defesa da minoria drusa que estava em conflito com beduínos sunitas.
Na ONU, Ahmad al-Sharaa, um antigo guerrilheiro rebelde, pediu à comunidade internacional para que apoie Damasco "face a estes perigos" e assegurou que o país compromete-se a fazer cumprir o acordo de não-agressão entre a Síria e Israel celebrado em 1974, após a guerra do Yom Kippur de 1973.
"O sofrimento que passámos não desejamos a ninguém"
Pediu igualmente o fim do conflito em Gaza, onde já mais de 65 mil palestinianos foram mortos por ataques israelitas.
"O sofrimento que passámos não desejamos a ninguém, sabemos muito bem os horrores da guerra e por isso estamos firmemente ao lado das pessoas de Gaza. Pedimos o fim da guerra", acrescentou.
O presidente interino pediu ainda que fossem levantadas as sanções que ainda atingem a Síria, um país que se esforçou e trabalhou nos últimos meses "para fazer regressar os refugiados, para parar o tráfico de droga" e que "passou de exportar crise para exportar uma oportunidade de paz".
Também relembrou o fim do conflito que juntou uma série de guerrilheiros de várias fações contra as forças de Bashar al-Assad.
"Foi uma operação militar de misericórdia e bondade, que priorizava a tolerância e não atacava civis", sublinhou Al-Sharaa, que durante a guerra civil era líder do grupo islamita sírio Organização de Libertação do Levante (Hayat Tahrir al-Sham ou HTS, em árabe).
Uma operação que contrastou com "o regime anterior, que usou o pior tipo de tortura contra o povo", prosseguiu, vincando que "mulheres e crianças foram bombardeadas por armas químicas, tudo para silenciar a verdade".
"Fomos vitoriosos apesar das injustiças, em nome das mães mártires e por todas as pessoas do mundo, pelo futuro das nossas crianças e das vossas", acrescentou o líder sírio.
Esta é a primeira intervenção de um líder sírio na Assembleia-Geral das Nações Unidas, durante o Debate Geral, em 58 anos.
O último presidente a discursar na Assembleia-Geral foi Nureddin al-Atassi, que governou antes da família Al-Assad tomar o poder em 1971.