Bagdade, Santiago do Chile, Beirute, Paris, Cartum, Quito. Cidades que vivem ou viveram recentemente dias conturbados. Em rigor, à imagem de outras. As ruas estão, de facto, pejadas de protestos.
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No entanto, no Iraque, na capital chilena, no Líbano, em França, no Sudão e Equador, a contestação foi desencadeada por fatores essencialmente económicos e, nalguns casos, aparentemente risíveis, como, por exemplo, o aumento do preço do bilhete de metro. A política veio depois. E a morte também.
Líbano
Taxa no WhatsApp, cólera popular
O ministro das Telecomunicações libanês, Mohamed Choucair, vai ficar na história do país como o homem que espoletou a "revolta de outubro" - que, entretanto, já ganhou extensão a este mês. O gesto foi simples, o resultado nem tanto. Impôs uma taxa de 5,40 euros mensais sobre chamadas do serviço de mensagens WhatsApp. Cólera popular. Que cresceu para a exigência da saída do conjunto da classe política, praticamente inalterada há décadas e considerada corrupta e incapaz de acabar com a profunda crise económica. Dois contestatários morreram, um deles baleado. Estradas foram bloqueadas, escolas e bancos encerrados. A capital - Beirute - e Tripoli, bem como outras cidades, já não passam sem manifestações. O primeiro-ministro, Saad Hariri, caiu. Michel Aoun, o presidente, sugeriu aos descontentes que emigrem. Não foi bonito. Nem os tumultos que se seguiram.
Iraque
Do desemprego à "limpeza" total
Em Bagdade e em todas as cidades do Sul xiita do Iraque, foi o brutal desemprego - estimado em 36% - entre a população com menos de 30 anos o rastilho para demonstrações de insatisfação. O balanço é duríssimo: desde o início do mês passado, cerca de 330 pessoas perderam a hipótese de lutar por um horizonte melhor após confrontos com a autoridade. A refrega ideológica endureceu. Enquanto as Nações Unidas sugerem a revisão do sistema eleitoral e da Constituição como saídas para o impasse, os manifestantes exigem, também, a transformação plena de um "status quo" político que se mantém desde a queda de Saddam Hussein, em 2003.
Sudão
Como pão para a boca
O aumento do preço do pão foi o ponto de partida. Posteriormente, viria a radicalização. Os sudaneses saíram de casa e enfrentaram a violência do aparelho securitário que colocou no poder o regime de Omar Al-Bachir e se substituiu a ele na sua queda, em abril. No processo, morreram 246 pessoas. Para já, em vão, porquanto a hierarquia continua inamovível.
Equador
Ruralidade vence presidente
O preço foi alto, mas a vontade dos equatorianos prevaleceu. O presidente, Lenin Moreno, aceitou retirar o decreto 883, que eliminava os apoios públicos à compra de combustível, penalizando sobremaneira os índios do meio rural, complicando-lhes o transporte coletivo e de mercadorias, devido ao aumento, de 100%, do gasóleo. Mas apenas após manifestações marcadas por atos de vandalismo inéditos e oito mortes. E depois da intermediação de grupos indígenas. O custo económico para o patronato foi estimado em mil milhões de euros.
Chile
Medida "pequena", estragos grandes
Desde meados de outubro, o Chile - especialmente, Santiago, a capital - não dorme sossegado. Porque o Governo do chefe de Estado, Sebastian Piñera, achou que era boa ideia aumentar o preço do bilhete de metro na principal cidade do país. Já terá percebido a dimensão negativa da medida, entretanto anulada. As reivindicações foram crescendo de abrangência e já incluem a demissão do presidente e a reforma constitucional (atendida, esta), cruciais, segundo os manifestantes, para que as desigualdades sociais sejam atenuadas. Os maiores protestos desde o fim da ditadura, em 1990, fizeram 20 vítimas mortais. Piñera aguenta-se, após várias cedências. E, suspeita-se, à custa da violação de direitos humanos durante a repressão das manifestações, que continuam.
França
Combustível para a revolta total
Há um ano, as ruas de França - em particular, as de Paris - escolheram o amarelo para contestar o aumento de imposto sobre os carburantes, que levaram o preço do gasóleo para as alturas do da gasolina. Os "coletes amarelos" não se ficaram por ali. Exigem reformas sociais profundas e a demissão do presidente, Emmanuel Macron. A luta continua, sempre aos sábados.
Agora, o Irão
De novo a gasolina
Num dos maiores produtores de petróleo do Mundo, o rastilho acendeu com o aumento do preço da gasolina em 50%. Várias cidades encheram-se de manifestantes, anteontem à noite, e um deles acabou por morrer em Sirjan, no centro do país, onde um depósito de gás quase foi incendiado.
Aumento de 50%
O objetivo do aumento, num Irão devastado pela crise por força das sanções norte-americanas, é reformar o sistema de subvenção dos combustíveis e lutar contra o contrabando. O litro custava menos de oito cêntimos, num país com a inflação nos 40%.