Uma faixa de terreno entre o México e o Canadá, atravessando os EUA. vai ficar às escuras durante quatro minutos na segunda-feira. Cientistas preparam-se para aproveitar o eclipse total do sol para recolher dados sobre comportamento animal, perturbações nas comunicações e efeitos para o Homem.
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Cidades norte-americanas como San Antonio, Dallas, Indianapolis ou Buffalo, para falar nas mais conhecidas, estão na linha que vai ser mais afetada pelo eclipse total do sol, segunda-feira, que só vai ser possível ver na América do Norte, numa faixa que vai do México ao Canadá.
Em Portugal, o eclipse vai notar-se nos Açores, onde a passagem da lua vai encobrir quase 62% da superfície do sol, às 19.05 horas de Ponta Delgada (20.05 em Lisboa). No território continental, o fenómeno vai ser quase impercetível.
Uma faixa do continente norte-americano designada como “caminho total” vai ter quatro minutos de escuridão total. Um eclipse total do sol que os cientistas pretendem aproveitar para ver melhor os segredos do sol, aguçar os olhos para comportamentos animais estranhos e tentar perceber os efeitos das explosões da crosta solar nas comunicações dos seres humanos, nomeadamente nas ondas de rádio e no GPS, de que hoje dependem, a cada segundo, tantos milhões de pessoas na Terra.
O raro espetáculo celestial, que se repetirá apenas daqui a 20 anos na América do Norte, vai ser visível em todo o território dos EUA, com particular incidência naquela corda, do México ao Canadá. Será uma oportunidade para os cientistas analisarem o brilho particularmente intenso da coroa do sol e tentarem perceber porque é mais quente que o núcleo - um fenómeno contraintuitivo que intriga os cientistas.
"Acontecem coisas com a coroa que ainda não compreendemos completamente", disse a vice-administradora da NASA, Pam Melroy. A coroa do sol é composta de plasma magnetizado e pode ascender a temperaturas superiores a um milhão de graus centígrados.
Normalmente, o brilho do sol impede que se olhe diretamente para a coroa, mas, na segunda-feira, cientistas de Dallas, Texas, vão poder apontar instrumentos específicos e tirar imagens. Uma oportunidade de ouro para os cientistas, disse Shannon Schmoll, diretor do Planetário Abrams da Universidade do Estado do Michigan, citado pela AFP.
Quando a Lua bloquear o Sol, a extremidade mais exterior da atmosfera do astro-rei, ou coroa, será visível "de uma forma muito especial", disse Pam Melroy, durante uma conferência de imprensa, esta semana. "Há grandes hipóteses de vermos coisas extraordinárias", acrescentou.
A agência espacial norte-americana Nasa fará voar jatos WB-57 ao longo da trajetória do eclipse para tirar fotografias a 15.240 metros de altitude. Voar acima das nuvens significa que não há hipótese de perder o eclipse. E as câmaras dos jatos deverão tirar fotografias mais nítidas porque captarão comprimentos de onda que normalmente não chegam à Terra.
Para além de detetar novos pormenores na coroa, a Nasa poderá estudar um anel de poeira em torno do Sol e procurar asteroides que possam estar a orbitar nas proximidades. Cientistas da Universidade de Aberystwyth, no País de Gales, e da NASA esperam poder ter um vislumbre dos fenómeno dos ventos solares, que dispara plasma para fora da superfície solar ou até presenciar o que se designa como uma massiva ejeção de massa coronal, quando gigantescas nuvens de plasma são lançadas para o espaço.
Estas explosões podem causar problemas aos satélites de comunicações. A atividade solar pode causar distúrbios em todas as comunicações inventadas pelo Homem, dado que afeta a ionosfera, a zona onde a atmosfera terrestre se encontra com o espaço.
Quando a lua tapa o sol, a ionosfera é afetada. "Perturbações nesta camada podem causar problemas com o GPS e as comunicações", disse Kelly Korreck, gestora do programa do eclipse na NASA. A Agência espacial norte-americana vai lançar três foguetões sonoros, antes, durante e após o eclipse, a partir da Virginia, para medir as alterações que este fenómeno provoca nesta zona sensível para as comunicações na terra.
As alterações na ionosfera afetam também as ondas de rádio. Para perceber até que ponto este tipo de comunicação, tão antiga quanto fiável, pode ser afetada pelo eclipse, centenas de rádio amadores vão participar numa maratona de audição, enviando sinais uns aos outros por todo o mundo, competindo para ver quem consegue estabelecer mais comunicações.
Os resultados desta iniciativa podem ajudar os cientistas a perceber melhor as comunicações rádio usadas pelos serviços de socorro, aviões e navios, assim como o GPS, de acordo com Nathaniel Frissell, da Universidade de Scranton, na Pensilvânia, que organiza o evento.
Esta é um das cerca de 40 projetos científicos abertos à participação e colaboração de cidadãos, que vão desde usar uma app no telefone para registar a temperatura à gravação de sons ambiente durante o eclipse. "Encorajamos as pessoas a ajudar a NASA a observar e a registar os sons à sua volta", disse Bill Nelson, administrador da NASA.
Estudos conduzidos durante um eclipse similar em 2017 mostraram alguns comportamentos curiosos nos seres humanos. Usando dados recolhidos no Twitter (agora X), os investigadores observaram que as pessoas que ficaram na parte da terra totalmente às escuras com o eclipse tenderam a usar o pronome "nós" em vez do "eu" e a mostrar preocupação com os outros, de acordo com Paul Piff, professor de psicologia na Universidade da Califórnia, em Irvine.
"O que estamos a descobrir é que as experiências que provocam admiração... parecem sintonizar as pessoas e ligar-nos uns aos outros, ligar-nos a entidades que são maiores do que nós", disse Piff. Este ano pretende estudar se esta experiência tem efeitos nas divisões políticas na sociedade.
"Os eclipses têm um poder especial. Levam as pessoas a sentir uma espécie de reverência pela beleza do nosso universo", disse Bill Nelson. E mexem também com os animais. Segundo a BBC, em 2017, as tartarugas do jardim zoológico de Fort Worth, Texas, começaram a acasalar durante o eclipse e os gorilas iniciaram as rotinas para dormir.
Muitos animais pareceram ter ficado ansiosos com a escuridão repentina. "Da última vez, os flamingos fizeram uma coisa linda", disse Adam Hartstone-Rose da Universidade Estatal da Carolina do Norte. "Quando o eclipse se estava a formar, os adultos juntaram as crias no meio do bando e olharam para o céu como se estivessem preocupados com a queda de um predador aéreo", recordou.