O rei dos Países Baixos, Willem-Alexander, pediu desculpa, este sábado, pela escravidão em vigor no país durante a época colonial, afirmando que se sentia "pessoal e intensamente" afetado.
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"Hoje estou aqui diante de vocês, como vosso rei e como parte do Governo. Hoje peço desculpa", declarou Willem-Alexander durante um ato comemorativo pelo 150.º aniversário da libertação dos escravizados nas colónias holandesas.
Milhares de descendentes de escravizados do Suriname e das ilhas de Aruba, Bonaire e Curaçao assistiram à tradicional cerimónia anual do "Keti Koti", ou "romper das correntes" em sranan tongo, uma das línguas do Suriname (ex-Guiana Holandesa).
O primeiro-ministro dos Países Baixos, Mark Rutte, já havia apresentado, em dezembro, o pedido de desculpas do Governo pelo papel do país em práticas que qualificou como crime contra a humanidade. Surgiram dúvidas, porém, sobre se o monarca assumiria a mesma posição sobre o tráfico colonial de escravizados que, segundo um relatório, contribuiu amplamente para acumular fortunas na Casa de Orange-Nassau, da qual descende.
O rei deu esse passo na data reivindicada pelas organizações de comemoração da luta contra a escravidão. "O tráfico de escravos e a escravidão são reconhecidos como crimes de lesa-humanidade", declarou Willem-Alexander, de 56 anos. "Os monarcas e governantes da Casa de Orange não tomaram nenhuma atitude contra isso".
Reparação
Os participantes receberam com bons olhos pedido de desculpa do rei. "Ele pediu perdão ao povo do Suriname", celebrou Abnema Ryssan, presente na cerimónia. "Talvez, agora possa fazer algo pelas pessoas negras", acrescentou o homem, de 67 anos, vestido com um manto colorido e um cocar tradicional enfeitado com a bandeira do Suriname.
"Ele assumiu a responsabilidade, por isso perdoo-o", considerou Arnolda Vaal, de 50 anos, vestida com um traje tradicional dos escravizados.
Para Lulu Helder, professora e descendente de escravizados, que viu o discurso do rei ao vivo na televisão pública, as suas palavras são "um começo", mas agora "necessitamos de reparação", disse à AFP.
"É um sinal de boa vontade reconhecer a magnitude do nosso sofrimento", disse o presidente do Suriname, Chan Santokhi, acrescentando que "as feridas de 300 anos de escravidão não se curam facilmente".
600 mil africanos escravizados
Segundo um relatório solicitado pelo Ministério holandês do Interior, publicado em junho, as colónias deram à família real, entre 1675 e 1770, o equivalente a cerca de 545 milhões de euros. Os reis Willem III, Willem IV e Willem de Orange-Nassau, antepassados do atual monarca, estão entre os principais beneficiários do que o relatório define como um "envolvimento deliberado, estrutural e de longo prazo" da coroa holandesa na escravidão.
O comércio de escravizados contribuiu, em particular, para financiar a era de ouro holandesa, um período de prosperidade erguido com base no comércio ultramarino nos séculos XVI e XVII. Estima-se que o tráfico holandês levou cerca de 600 mil africanos para as colónias holandesas na América do Sul e nas Caraíbas.
A abolição oficial da escravatura remonta a 160 anos, mas a aplicação efetiva dessa medida concretizou-se apenas dez anos depois.
Willem-Alexander assumiu o trono em 2013, após a abdicação da mãe, a rainha Beatrix. É casado desde 2002 com a argentina Máxima Zorreguieta, com quem tem três filhas: as princesas Catharina-Amalia, Alexia e Ariane de Orange-Nassau.