O partido socialista espanhol (PSOE) e os independentistas Juntos pela Catalunha (JxCat) assinaram esta quinta-feira um acordo para a viabilização de um novo Governo de esquerda em Espanha, confirmou o dirigente socialista Santos Cerdán numa conferência de imprensa.
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O acordo fechado pelo PSOE, liderado por Pedro Sánchez, e pelo partido do antigo presidente do governo regional da Catalunha Carles Puigdemont, foi assinado esta manhã em Bruxelas, onde vive e é eurodeputado o independentista catalão.
Do acordo faz parte a amnistia dos envolvidos na tentativa de autodeterminação da Catalunha que culminou com uma declaração unilateral de independência em 2017, protagonizada por Puigdemont, que vive desde esse ano na Bélgica para fugir à justiça espanhola.
Puigdemont, que negociou este acordo com o PSOE, é um dos potenciais beneficiários da amnistia.
Na sequência das eleições espanholas de 23 de julho, o PSOE negociou acordos com partidos nacionalistas e independentistas catalães, bascos e galegos para conseguir a recondução de Sánchez como primeiro-ministro no parlamento.
Após o acordo anunciado esta quinta-feira com o JxCat, só falta confirmar um apoio à recondução de Sánchez, o do Partido Nacionalista Basco (PNV, na sigla em castelhano).
A negociação com o partido de Puigdemont foi considerada a mais difícil do PSOE, uma vez que o JxCat votou contra a investidura de Sánchez na legislatura anterior, ao contrário das outras formações, que votaram a favor ou se abstiveram.
A amnistia é a exigência feita pelos partidos catalães para viabilizarem um novo Governo de esquerda em Espanha e também já tinha sido acordada, na semana passada, com a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC).
Se até 27 de novembro não houver novo primeiro-ministro investido pelo parlamento, Espanha terá de repetir as eleições.
Sánchez rejeitava amnistia até às eleições
Até às eleições de 23 de julho, Sánchez rejeitava a possibilidade da amnistia. "O que o independentismo pede é uma amnistia. Algo que, desde logo, este Governo não vai aceitar e que não entra na legislação nem na Constituição espanhola", disse Sánchez, em novembro de 2022, numa entrevista ao canal de televisão La Sexta.
Em 20 de julho deste ano, três dias antes das legislativas espanholas, disse ao mesmo canal que "o independentismo pedia uma amnistia e um referendo de autodeterminação", mas, segundo frisou, "não tiveram uma amnistia, não há um referendo de autodeterminação e não o haverá".
"Primeiro por convicção pessoal e política. Segundo, porque a Constituição, não só a espanhola, nenhuma Constituição no mundo reconhece o direito à segregação", disse, naquele dia.
Depois das eleições de 23 de julho, Sánchez deixou de negar a possibilidade da amnistia e recentemente, em 28 de outubro passado, numa intervenção perante o Comité Federal do partido socialista espanhol (PSOE) PSOE, defendeu-a e explicou por que é que tinha mudado de opinião.
"Em nome de Espanha, no interesse de Espanha, em defesa da coexistência entre os espanhóis, hoje defendo a amnistia na Catalunha", afirmou.
Sánchez justificou a amnistia como a necessidade de "fortalecer" o reencontro entre Espanha e a Catalunha, que considera ter iniciado quando chegou a primeiro-ministro, em 2018.
Desde então, Sánchez indultou dirigentes catalães que estavam presos e alterou o Código Penal em benefício de independentistas acusados pela justiça.
O líder socialista tem defendido que há agora "convivência" na Catalunha, e não "a confrontação" que havia em 2018, quando chegou ao Governo, e sublinha que não está em curso qualquer processo de autodeterminação unilateral.
Milhares de pessoas abrangidas por amnistia
Milhares de pessoas estão envolvidas em processos judiciais relacionados com a autodeterminação da Catalunha, podendo agora ser abrangidas pela amnistia acordada entre os socialistas espanhóis e os partidos catalães.
Não existe um levantamento oficial de quantas pessoas estão acusadas pela justiça ou envolvidas em investigações judiciais e policiais dentro do processo que culminou com uma declaração unilateral de independência da Catalunha em 2017. Os números conhecidos são da associação Òmnium Cultural, uma das entidades da sociedade civil catalã que defende a independência da região.
Segundo esta associação, há 1460 pessoas já julgadas ou ainda a braços com a justiça desde 2017 por causa da tentativa de autodeterminação da Catalunha.
Além de pessoas investigadas, acusadas ou já julgadas pelos acontecimentos de 2017, há outras na mesma situação por causa de manifestações e distúrbios nos anos seguintes.
Nesse grupo de 1460 pessoas há várias acusadas ou investigadas por terrorismo pela justiça espanhola, por causa de ações como o bloqueio do aeroporto de Barcelona ou a alegada organização de tentativas de assalto a instituições e outras infraestruturas.
Além de políticos então no governo e no parlamento regional, dirigentes de associações e manifestantes, entre as quase 1500 pessoas identificadas pela Òmnium Cultural estão dezenas de autarcas, funcionários públicos ou diretores de escolas que, por exemplo, organizaram espaços para as votações no referendo de 1 de outubro de 2017.
Entre os potenciais beneficiários da amnistia estão ainda os dirigentes catalães que nunca foram julgados por terem fugido de Espanha dias depois da declaração unilateral de independência de 2017, como o então presidente do governo catalão, Carles Puigdemont, que vive desde aquele ano na Bélgica e negociou agora a lei da amnistia com os socialistas.