"Yurt" tradicional usado por nómadas na Ásia foi erguido há uma semana em Odessa. Visitantes podem aquecer-se, beber chá e carregar aparelhos durante os apagões
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Cravada numa alta coluna de granito, a estátua de Taras Shevchenko saúda quem chega ao extenso parque batizado com o nome do génio ucraniano, considerado o mais importante poeta de todos os tempos no país. A ilustre figura do século XIX, que também foi pintor e humanista, perdura como uma das vozes mais sonantes da defesa pela liberdade e dá nome a monumentos, praças e universidades por toda a Ucrânia. Por ter estado exilado durante uma década no Cazaquistão, Shevchenko é também recordado no "Yurt da Invencibilidade" montado há uma semana em Odessa.
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Erguido no centro do parque, junto ao estádio do Chornomorets, o "yurt" - nome dado às tendas tradicionais usadas pelos povos nómadas da Ásia Central - recria a atmosfera dos cazaques e oferece conforto aos visitantes. Uma viagem cultural em tempos de guerra. Curiosa com a recriação de uma realidade que tão bem conhece, Krystyna abre a porta de madeira trabalhada e mergulha no interior. "Este local assemelha-se muito ao que temos no Cazaquistão. A minha mãe é cazaque e o meu pai é da Ucrânia, é judeu. Há muitos anos que vivemos em Odessa, mas temos família lá. Ouvimos falar deste sítio e queríamos ver o que estava aqui".
"A atmosfera é mesmo igual à do Cazaquistão"
Com o pequeno Arnaldo preso pela trela violeta, a professora de yoga acomoda-se numa cadeira e aproveita para se aquecer durante uns minutos. Olha em redor. Presas no teto, as ripas de salgueiro fletidas moldam a cúpula que é aberta quando se cozinha. As paredes são forradas de feltro natural, feito de pêlo de camelo aparado, com vistosas tapeçarias azuis, cor de vinho e bege. Ao fundo, as bandeiras da Ucrânia e do Cazaquistão repousam junto ao retrato de Shevchenko e ao painel com algumas obras do visionário ucraniano. "A atmosfera é mesmo igual à do Cazaquistão", aponta Krystyna.
Há ainda aquecedores, tomadas e muitas cadeiras. Uma cabana "invencível" que também serve para enfrentar os cortes de energia que continuam a acontecer em Odessa, onde a vida já não se faz sem geradores. "As pessoas podem vir carregar os seus aparelhos eletrónicos, beber chá com bolachas ou apenas aquecerem-se. Agora o tempo está mais ameno, mas quanto estava mais frio havia muita gente", explica Anastasia Altshuler.
De acordo com a voluntária, o "Yurt da Invencibilidade", como é apelidado, chegou à Ucrânia após ter saído do Cazaquistão, atravessado o Azerbaijão e a Turquia. O projeto conta com o apoio do Grupo Interparlamentar de Amizade Ucrânia-Cazaquistão e de vários representantes e empresários cazaques do país. "As pessoas estão curiosas porque é uma cultura diferente, muitos não sabem nada sobre o Cazaquistão. Por isso é interessante e útil para todos", considera Anastasia.
Ao todo, a Ucrânia conta com cinco tendas cazaques. Quando a primeira foi instalada, na cidade-mártir de Bucha, no início de janeiro, o gesto de solidariedade não agradou Moscovo, que exigiu explicações a Astana. Desde o início da guerra, a antiga república soviética tem-se mantido cautelosa com as demonstrações de apoio à Ucrânia devido à relação secular que mantém com a Rússia, com quem partilha uma fronteira de sete mil quilómetros.