UE e governos têm proibido funcionários de instalar a aplicação por receio de espionagem. Especialista em sistemas de informação alerta que Mundo vive "guerra de informação".
Corpo do artigo
Lançada em 2016, a rede social, detida pela empresa chinesa ByteDance, tornou-se num fenómeno ao ser instalada por milhões de utilizadores em todo o Mundo. No entanto, a aplicação tem sido, recentemente, alvo de uma enorme desconfiança por parte do Ocidente, devido aos temores de que possa existir uma partilha de dados com o regime chinês, uma vez que uma lei em vigor desde 2017 permite que o Executivo asiático possa obrigar as firmas sediadas no país a fornecer este tipo de informações.
Numa altura em que a tensão com Pequim tem vindo a escalar, tanto os órgãos da União Europeia como vários Governos optaram por proibir os funcionários de fazerem uso do TikTok, em resposta aos crescentes temores de que a app possa ser usada como forma de espiar quem a instalou.
A Comissão Europeia foi a primeira entidade a decidir proibir os funcionários de utilizarem o TikTok em todos os dispositivos de trabalho, defendendo que a medida tem como objetivo proteger a instituição "contra ameaças à cibersegurança e ações que podem ser exploradas para ataques contra o ambiente empresarial".
Uma semana depois, seguiu-se o Parlamento Europeu, citando as mesmas preocupações. Os temores, que não são de agora, disseminaram-se e, rapidamente, Governos de todo o Mundo envergaram pelo mesmo caminho, desde os EUA, à Bélgica, até ao Reino Unido e, mais recentemente, à Nova Zelândia.
Para já, as proibições dos governos aplicam-se aos trabalhadores, mas há quem já tenha pensado em banir a aplicação de vez. Donald Trump, antigo presidente dos EUA, expressou preocupações de segurança quando estava no poder, depois de acusar o TikTok de estar a recolher informações sobre os utilizadores norte-americanos, com o intuito de as entregar ao regime chinês.
As declarações do então líder da Casa Branca foram desvalorizadas pela Justiça nacional e pela maior parte dos países ocidentais, sendo que só agora é que os Estados estão a acordar para a realidade dos perigos da rede social.
Espionagem a jornalistas
Os temores começaram a escalar em dezembro do ano passado, altura em que a ByteDance admitiu ter demitido quatro funcionários que tiveram acesso a dados de quatro jornalistas do "BuzzFeed News" e do "Financial Times", enquanto tentavam localizar a fonte de uma reportagem sobre a empresa.
O caso motivou uma investigação e, na semana passada, o diretor do FBI, Christopher Wray, alertou o Senado que a rede social "grita" por questões de segurança nacional, e que a China poderá estar a manipular o algoritmo para espalhar desinformação.
Questionado pelo JN sobre se as questões de segurança são fundamentadas, Henrique Santos, presidente da Comissão Técnica 163 Segurança em Sistemas de Informação do Instituto Português da Qualidade, respondeu perentoriamente: "Claro que sim".
O também professor da Universidade do Minho realçou ainda que "neste momento, em que há uma maior tensão entre a China e o resto do Mundo, tudo o que é controlado por Pequim merece uma atenção superior".
O regime chinês discorda. Após a onda de proibições no seio de diversos Executivos, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Wang Wenbin, reagiu, direcionando a mensagem para a Washington.
"Os EUA não apresentaram provas de que o TikTok é uma ameaça à segurança nacional e está a usar a desculpa da segurança de dados para abusar do seu poder para reprimir empresas estrangeiras", disse Wenbin, sem negar a eventual partilha de dados entre a empresa que possui a aplicação e o regime de Xi Jinping.
Guerra de informação
Apesar de as alegações de que a aplicação é segura, na semana passada, o TikTok anunciou que vai abrir dois centros de dados europeus na Irlanda e na Noruega, de modo a reforçar a proteção de dados dos utilizadores do Reino Unido e do Espaço Económico Europeu.
Com o Projeto Clover, a rede social "irá garantir a proteção e segurança de dados na indústria da nossa comunidade europeia, que conta com 150 milhões de habitantes", assegurou Theo Bertram, responsável pelas Relações Governamentais do TikTok, em comunicado.
Mesmo que o nível de segurança aumente, Henrique Santos alerta que o Mundo vive, nos dias que correm, uma "guerra de informação", como tal, "as pessoas podem considerar que não há nenhum perigo em usar o TikTok, mas têm que ter consciência de que fazem parte de um Estado, e se esse Estado está numa guerra de informação não podem ter atitudes que possam colocar em perigo a estabilidade nacional", apelando que este tema deveria partir não só dos meios de comunicação, "mas ainda mais do Governo".
Contactado pelo JN, o Gabinete Coordenador de Segurança, não esclareceu, em tempo útil, se o Executivo pondera avançar com algum tipo proibição em relação ao TikTok, que, em Portugal, conta com 3,1 milhões de utilizadores mensais.