Trump e líderes do Ruanda e da RDCongo assinam acordo de paz, mas violência permanece

Cerimónia de assinatura de acordo de paz com os presidentes do Ruanda, Paul Kagame, dos EUA, Donald Trump, e da República Democrática do Congo, Félix Tshisekedi, no Instituto da Paz dos Estados Unidos, em Washington
Foto: Andrew Caballero-Reynolds/ AFP
O presidente norte-americano, Donald Trump, e os líderes do Ruanda e da República Democrática do Congo (RDCongo) assinaram na quinta-feira um acordo de paz, mesmo com o retomar da violência a levantar dúvidas sobre o pacto que visa pôr fim a uma das guerras mais longas de África.
Trump afirmou que os Estados Unidos também assinariam acordos sobre minerais críticos com os dois países durante a cerimónia de receção em Washington, onde recebeu Paul Kagame, presidente de longa data do Ruanda, e o presidente congolês Félix Tshisekedi. "Penso que será um grande milagre", considerou o chefe de Estado norte-americano após a assinatura, realizada no Instituto da Paz - que a Administração acaba de renomear em sua homenagem.
Ao falar sobre os dois líderes, acrescentou: "Passaram muito tempo a matar-se, e agora vão passar muito tempo a abraçar-se, a dar as mãos e a aproveitar-se economicamente dos Estados Unidos, como todos os outros países fazem."
Mas os líderes africanos adotaram um tom mais cauteloso, enquanto os combates se intensificavam no Leste da RDCongo, onde o grupo armado M23 - que, segundo a ONU, é apoiado pelo Ruanda - tem vindo a ganhar terreno nas últimas semanas contra as forças de Kinshasa. "Haverá altos e baixos no caminho à frente, disso não há dúvida", declarou Kagame, cujos aliados conquistaram uma vantagem decisiva no terreno contra o turbulento vizinho.
Tshisekedi, da RDCongo, considerou o acordo "o início de um novo caminho, um caminho exigente".
"Muito dinheiro"
Trump vangloriou-se de que o conflito no Leste da RDCongo, onde centenas de milhares de pessoas morreram ao longo de várias décadas, está entre as oito guerras que pôs fim desde que regressou ao cargo em janeiro. O presidente norte-americano não escondeu o desejo de ganhar o prémio Nobel da Paz.
O magnata disse que o acordo abrirá caminho para que os Estados Unidos tenham acesso a minerais críticos em ambos os países. O Leste da RDCongo, devastado pela violência, em particular, possui reservas de muitos dos ingredientes-chave das tecnologias modernas, como os carros elétricos. Este é o mais recente de uma série de acordos em que o republicano negociou uma participação para que as empresas norte-americanas extraiam minerais de terras raras, incluindo na Ucrânia.
"Vamos extrair algumas das terras raras", frisou Trump. "E todos vão ganhar muito dinheiro", completou.
A assinatura do acordo acontece mais de cinco meses depois de os ministros dos Negócios Estrangeiros dos dois países terem-se também reunido com Trump e anunciado outro acordo para pôr fim ao conflito. O conflito, que já se arrastava há algum tempo, explodiu no final de janeiro, quando o M23 capturou as principais cidades de Goma e Bukavu. Após o acordo de junho, o M23 - que nega ligações ao Ruanda - e o Governo de Kinshasa prometeram um cessar-fogo após a mediação do Qatar, parceiro dos EUA, mas ambos os lados acusam-se mutuamente de violações.
"Muitos mortos"
A violência continuou no terreno mesmo no dia da assinatura. Um jornalista da agência France-Presse (AFP) presente no local ouviu disparos de armas nos arredores de Kamanyola, uma cidade controlada pelo M23 na província de Kivu do Sul, perto das fronteiras com o Ruanda e o Burundi. "Muitas casas foram bombardeadas e há muitos mortos", disse Rene Chubaka Kalembire, um funcionário administrativo em Kaziba, uma cidade também controlada pelo M23, na véspera da assinatura do acordo.
Após vários dias de confrontos em torno de Kaziba, os aviões de combate voltaram a bombardear a cidade na quinta-feira de manhã, disse à AFP um representante da sociedade civil local que pediu o anonimato. Também se ouviram explosões vindas do posto fronteiriço de Bugarama, no Ruanda, do outro lado da fronteira, no vizinho Burundi, e a Polícia ruandesa fechou temporariamente o posto fronteiriço.
A AFP não conseguiu obter um número verificável de mortos nos combates junto de fontes independentes. Fontes locais reportaram um grande contingente de reforços do M23, acompanhados por carros blindados, no planalto de Kivu do Sul. A passagem pela região montanhosa permitiria às suas tropas cercar Uvira, a última grande cidade do Kivu do Sul a escapar à captura pelo M23.
O acordo intermediado por Trump, por sua vez, surge numa altura em que ambos os países estão em negociações com o seu Governo sobre a prioridade de acolher migrantes no meio da ampla campanha de deportação do presidente.
