Comité de peritos reúne-se na segunda-feira, devendo dar luz verde ao fármaco, num processo único e sob forte monitorização.
Corpo do artigo
21 de dezembro de 2020. Dia D. Do expectável início de uma libertação que se almeja. Dia em que os peritos do Comité de Medicamentos de Uso Humano da Agência Europeia do Medicamento (EMA) autorizam - tudo indica que sim - a introdução no mercado da vacina contra a covid-19 da Pfizer/BioNTech. Naquela que será, de facto, a primeira autorização, uma vez que em países como os EUA ou o Reino Unido foi aprovado o seu uso de emergência.
Num processo nunca antes visto. Em tempo recorde. Que não retirou etapas no processo de validação, garantem os peritos em uníssono. São seis. Não se encurtaram, nem se anularam. Sobrepuseram-se.
Enquanto num processo tradicional se passa à fase seguinte após concluir a anterior, nesta vacina sobrepuseram-se fases, avançando para a seguinte quando se estava a meio da primeira. Assim se explica que, neste momento, estejam ainda a decorrer ensaios clínicos de nível II e III. Objetivo? Ganhar tempo numa pandemia que toma há meses a dianteira da corrida e que já matou 1,67 milhões de pessoas em todo o Mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
13157431
Apertando e reforçando a monitorização. Porque está em causa, sublinhe-se, uma aprovação condicional. O que significa que a introdução da vacina da Pfizer (com uma eficácia de 95%), e das seguintes, vai ser seguida de perto pela EMA, pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças e pela Comissão Europeia.
E se se chegar a um ponto em que, afinal, os benefícios não imperam sobre os riscos, então a autorização será retirada. É exatamente essa análise, recorde-se, que a Agência Europeia do Medicamento está a fazer para o remdesivir, cuja utilização a Organização Mundial de Saúde veio recentemente desaconselhar.
Incógnita sobre imunidade
Dada luz verde pelo Comité, que conta na sua vice-presidência com o farmacologista português Bruno Sepodes (ler entrevista), Bruxelas deverá selar a autorização na próxima quarta-feira. Esperando-se a chegada das primeiras, poucas (9750 unidades), vacinas a Portugal entre os dias 24 e 26 de dezembro para administrar entre 27 e 29.
Uma prenda de Natal em doses minimais, a marcar o arranque da vacinação no espaço europeu. Com reforço previsto a partir de 4 de janeiro (303 mil). Com os profissionais de saúde na linha da frente para a imunização.
13154946
Segue-se um processo longo, que se arrastará durante todo o ano. E que não permite baixar a guarda. Nem descurar medidas de proteção. Porque a imunidade de grupo não se atinge com milhares de imunizados, mas com milhões.
Isso mesmo vincou, na passada sexta-feira, o diretor do programa de emergências sanitárias da OMS. "A vacina é motivo de esperança e devemos comemorar, mas os próximos três a seis meses serão difíceis. Os países que têm transmissão intensa do vírus verão que ela vai intensificar-se", avisou Mike Ryan.
Sob a mesma batuta, a ministra da Saúde recusou, no mesmo dia, avançar qualquer prazo quanto à imunidade de grupo. "Se algum membro do Ministério da Saúde disser que é garantido que a vamos atingir em maio, junho ou julho, não é com base em factos porque não temos informações para isso. Temos de ser muito sérios. Não quero passar mensagens incorretas", disse Marta Temido.
Refira-se que o Comité da EMA volta a reunir-se a 6 de janeiro tendo sob a mesa a autorização de introdução no mercado da vacina da Moderna. Sendo que a agência norte-americana (FDA) autorizou já o uso de emergência de ambas.
Suíça aprovou no sábado
A Swissmedic, entidade responsável pela aprovação de produtos de saúde na Suíça, anunciou ter aprovado o uso da vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Pfizer, considerando-a "segura e que os benefícios superam os riscos".
Onde já há autorização
A vacina já tem autorização em vários países, incluindo Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Singapura, México e Costa Rica.
Perguntas e Respostas
Sendo autorizada para o mercado europeu, estamos perante a vacina mais rápida da História?
As empresas BioNTech (Alemanha) e Pfizer (EUA) já deixaram o seu marco quando o uso de emergência da vacina foi aprovado por países como o Reino Unido e os EUA. A luz verde para a Europa confirma um dia histórico para a Ciência, com a aprovação de uma vacina em poucos meses. Por comparação, a vacina contra a meningite demorou quase cem anos entre a descoberta do patógeno e a sua aprovação. Havendo doenças como a malária ou dengue a que a ciência não conseguiu ainda dar resposta.
Qual a importância da publicação do código genético do SARS-CoV-2?
Quando, a 12 de janeiro, a China publicou o código genético do vírus SARS-CoV-2, a BioNTech/Pfizer, especializada em tecnologia RNA mensageiro para doenças infeciosas, avançou para o desenvolvimento da vacina. Esta tecnologia, até agora nunca usada, dispensa a manipulação de vírus, como acontece nas vacinas tradicionais, que os abrandam ou inativam.
Num processo tão rápido, dispensaram-se fases do processo de validação?
Conforme a infografia explica, não se saltaram passos. Aceleraram-se. O que acontece é que, quando se chegava a meio de uma fase, avançou-se para a seguinte, quando no método tradicional só após a conclusão da primeira fase. Em emergência sanitária mundial, concentraram-se tempo e recursos. Daí que decorram ainda ensaios de nível II e III da vacina da Pfizer.
Que mecanismo regulatório permitiu que se acelerasse o processo de avaliação?
13155333
Chama-se "rolling review", isto é, revisão em contínuo, e é uma das ferramentas de regulação que a EMA usa para acelerar a avaliação de um medicamento durante uma emergência de saúde pública. Por norma, os dados sobre eficácia, segurança e qualidade de um medicamento são apresentados no início da avaliação de um pedido de autorização. Já a revisão em contínuo permite que o comité de peritos analise os dados à medida que vão chegando, a partir dos estudos em curso, antes mesmo de decidir que existem informações suficientes e que a empresa pode apresentar um pedido formal de introdução no mercado.
Como vão ser monitorizadas as reações adversas?
Até à data foram reportados quatro casos de reações adversas, que levaram as autoridades do Reino Unido e EUA a alertar que pessoas com histórico de alergias graves não devem ser imunizadas. A EMA já fez saber que durante dois anos vai monitorizar de perto a segurança das vacinas, centralizando os efeitos secundários no "EudraVigilance", sistema de vigilância europeu. O objetivo é identificar riscos para uma atuação rápida.