Mesmo sem resultados oficiais, o liberal Donald Tusk declarou-se vitorioso nas legislativas polacas de domingo. Entenda a seguir os resultados, as implicações para o partido conservador do atual Governo e como será um Executivo liderado por Tusk.
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Quem ganhou as eleições?
Depende do ponto de vista. O partido mais votado e que se apresenta como vencedor é o Lei e Justiça (PiS), do atual primeiro-ministro conservador Mateusz Morawiecki. O PiS, no entanto, deve perder a maioria absoluta e, segundo a sondagem à boca da urna do instituto IPSOS, ficará com 198 assentos (menos 37 em relação às legislativas de 2019). A Sejm, a câmara baixa do Parlamento polaco, tem 460 cadeiras.
Já a Coligação Cívica (KO), do antigo chefe de Governo Donald Tusk (2007-2014), deve conquistar mais 27 lugares, chegando aos 161. Mesmo em segundo lugar, a força política do também ex-presidente do Conselho Europeu (2014-2019) deverá conseguir os apoios necessários para uma maioria absoluta – o que explica Tusk ter reclamado a vitória eleitoral. "A Polónia venceu. A democracia venceu. Nós expulsámo-los do poder", disse o líder da aliança de partidos de Centro e Direita liberal, citado pela agência Lusa.
Os resultados finais devem ser divulgados pela Comissão Nacional Eleitoral até esta terça-feira, de acordo com o jornal "Gazeta Wyborcza".
Como ficou o resultado do referendo?
A realização de um referendo com perguntas altamente enviesadas foi contestada numa eleição marcada pela tentativa de influência por parte do partido do Governo. Mesmo com a perda de assentos, o PiS conseguiu resultados favoráveis na consulta: mais de 96% dos que participaram votaram contra a venda de ativos do Estado a estrangeiros, o aumento da idade da reforma, a retirada da barreira na fronteira com a Bielorrússia e a admissão de imigrantes irregulares do Médio Oriente e de África.
A taxa de afluência aferida pelo IPSOS mostra uma participação de 40% do eleitorado no referendo, com o grupo com entre 50 e 59 anos a ser o mais participativo – com 45,7%. A baixa participação entra em contraste com um recorde de 72,9% nas eleições legislativas – maior taxa desde o fim da União Soviética.
O PiS ainda tem hipótese de continuar no Governo?
O chefe de Gabinete do PiS e vice-presidente do partido, Joachim Brudziński, afirmou esta segunda-feira que o Lei e Justiça deveria receber do presidente Andrzej Duda a missão de formar um Governo, já que foi a força política mais votada. Embora o chefe de Estado, um independente ex-PiS, já tenha indicado que proporia ao partido com mais votos, o chefe do Gabinete presidencial Paweł Szrot admitiu hoje que a "situação pode ser complicada desta vez".
O Polónia 2050 e o Partido Popular Polaco (PSL), integrantes da coligação Terceira Via (Centro-Direita), recusaram a participação num Executivo do Lei e Justiça. "Senhores, parem de enganar-se. Durante oito anos estiveram a destruir-nos, a destruir os outros partidos democráticos, a cuspir em nós, a humilhar-nos, a fazer de tudo para nos enojar", disse o porta-voz do PSL Miłosz Motyka, em declarações à TVN24. "E agora estão a falar numa coligação? Realmente confundiram tudo", acrescentou.
Mesmo um aliado mais esperado para o PiS, a Confederação Liberdade e Independência, fechou às portas a uma aliança com o PiS ou com a Coligação Cívica. O partido de extrema-direita teve um desempenho abaixo do esperado, e deve ficar com 14 assentos no Sejm, segundo a sondagem da IPSOS.
O que esperar de um Executivo liderado por Donald Tusk?
O ex-presidente do Conselho Europeu deverá formar um Executivo composto pela KO, pela Terceira Via e pela Nova Esquerda (de Centro-Esquerda), o que resultaria em 248 dos 231 assentos necessários para uma maioria absoluta.
Tusk quer desfazer as reformas judiciais promovidas pelo PiS, com o objetivo de descongelar fundos europeus. O liberal quer reaproximar a Polónia da União Europeia, após anos de desentendimentos entre Varsóvia e Bruxelas.
Essa aproximação à causa europeia poderá significar mais apoio à Ucrânia. Apesar de o atual Governo do PiS ter sido um dos principais fornecedores de equipamentos militares a Kiev, a tensão entre os dois países cresceu nos últimos meses. Varsóvia suspendeu o envio de novas armas devido à entrada de cereais ucranianos, mais baratos, na Polónia – manobra que pode ter sido temporária, no entanto, para agradar o principal eleitorado do partido conservador, que é do meio rural.
Outra medida que Tusk defende é a legalização do aborto – que foi quase banido em 2021. Naquele ano, entrou em efeito uma decisão do Tribunal Constitucional que impediu a interrupção voluntária da gravidez no caso de o feto ter anormalidades. O aborto atualmente é permitido em apenas duas hipóteses: no risco à vida ou à saúde da mulher, ou no caso de uma suspeita razoável que a gestação é fruto de uma violação ou de incesto.