Da Áustria à Austrália, ninguém ficou indiferente à coragem de Gisèle Pelicot, durante décadas abusada sexualmente pelo marido e dezenas de homens por ele recrutados. As homenagens multiplicam-se: há flores, um lenço especial e cartas, muitas cartas, com agradecimentos, elogios e palavras de amor.
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Drogada pelo marido e violada por desconhecidos durante dez anos, Gisèle Pelicot rapidamente se tornou o rosto da coragem em França, sendo efusivamente aplaudida não só em ações de apoio mas sempre que entra e sai do tribunal, em Avignon. Todavia, a admiração pela mulher que decidiu dar a cara como grito contra o abuso, num julgamento "público" no qual quer, inclusivamente, exibir os vídeos do horror, transbordou. As homenagens chegam de várias partes do Mundo.
São muitos os que seguem atentamente os desenvolvimentos do caso, que envolve Dominique Pelicot, o marido, e outros 50 homens, por ele recrutados para as violações. Na Austrália, a bravura de Gisèle desarmou a organização "Older Women’s Network", dedicada a dar voz às mulheres mais velhas, que também são alvo de agressões. "Se pudessemos estar lá, levavamos cartazes a dizer 'Acreditamos em ti, Gisèle!' e 'És a nossa campeã'", revelou Yumi Lee, da instituição, citada pelo britânico "The Guardian".
Mas não podem e, por isso, arranjaram uma solução: recolheram donativos para lhe enviar um lenço de seda bordado pela comunidade indígena australiana. A ideia é que funcione como um abraço à distância. "Esperamos que, ao usá-lo, sinta a solidariedade das mulheres que estão a milhares de quilómetros do tribunal", explicou.
Flores e cartas, também de homens, para a "heroína"
Os gestos de carinho não páram de chegar a Avignon, em forma de flores e cartas com carimbos dos mais diversos sítios. Um austríaco saudou-a, por escrito, pela coragem de pôr fim à domínio masculina, assim como uma americana, que lhe agredeceu o facto de ter tornado a história pública. "És a minha heroína", escreveu, na missiva enviada para França.
Em meados de setembro, como eco das manifestações realizadas no país, centenas de pessoas saíram às ruas de Bruxelas e Liège, em apoio a Gisèle. Muitas delas seguravam cartazes com o rosto estilizado da francesa, uma obra feita pela conhecida artista belga Aline Dessine, que, num ato de solidariedade, abriu mão dos direitos da imagem. "Desde que seja usada para apoiar Gisèle Pelicot, podem fazer com ela o que quiserem", referiu.
Na Grécia, 30 organizações escreveram a Pelicot. "Queríamos mostrar-lhe que estamos em dívida com ela pela resiliência", explicou Anna Vouyioukas, da instituição Diotima, de defesa da igualdade de género. "Sabemos como é difícil suportar um julgamento num sistema judicial que, muitas vezes, é hostil com os sobreviventes", acrescentou.
Em Espanha, na associação feminista Ca la Dona, também se agradeceu à francesa pela coragem de "quebrar o silêncio". "Para a violência masculina existir, todos os que a conhecem têm de ficar calados. E o que a Gisèle fez foi iluminar toda a estrutura que sustenta essa violência. É um exercício incrível de solidariedade e generosidade, especialmente tendo em conta o que ela viveu", notou Natalia Cámera, daquela instituição.