Tudo aconteceu às claras. Há vários dias que os apoiantes mais fervorosos de Donald Trump usavam fóruns online de extrema-direita e conservadores para incitar à violência e também à posse de armas nos protestos programados para esta quarta-feira, em Washington, durante a ratificação de Joe Biden como presidente dos EUA pelo Congresso.
Enquanto isso, o ainda presidente Donald Trump usava a sua conta do Twitter para incendiar o clima pós-eleições ao difundir teorias da conspiração e acusações de fraude eleitoral sem apresentar quaisquer provas. Chamava todos a participar na marcha de protesto desta quarta-feira, que terminou com a invasão do Capitólio.
As ameaças deram origem aos atos. O assalto histórico ao Capitólio, fatal para quatro pessoas, durou cerca de quatro horas. Apesar de não ter sido programado em secretismo, as forças de segurança não conseguiram travar a multidão em fúria em defesa de Trump.
Ainda no dia anterior, o diário "The Washington Post" denunciava num longo artigo as ameaças de violência publicadas em fóruns na internet como o Thedonald.win, o Parler e o Gab, com mensagens a apelar aos manifestantes a infiltrarem armas na capital, que tem algumas das leis de armas mais rígidas do país, e a não aceitar os resultados eleitorais.
As mensagens a apelar à violência também foram partilhadas no Facebook, no Tik Tok e no Twitter, com hashtags como #StopTheSteal (pára o assalto).
Um tweet de Trump do mês passado a alegar fraude eleitoral e a promover o "grande protesto" de 6 de janeiro - "Esteja lá, será selvagem!" - "tornou-se um grito de guerra central. Era a publicação no topo do Thedonald.win, na terça-feira de manhã [um dia antes], e os comentadores anónimos encararam-na como um apelo à ação", diz o "The Washington Post". "Temos ordens de marcha", dizia a resposta principal.
Sobre o porte de armas na capital, dizia outro comentário: "Sim, é ilegal, mas isto é uma guerra e nós estamos claramente numa fase pós-legal de nossa sociedade."
"Nós, o povo, não vamos tolerar um roubo. Não vamos retroceder, não nos renderemos. Devolvam-nos o nosso presidente, que vocês roubaram, ou enfrentem as consequências", lia-se noutra das publicações.
De acordo com o grupo Advance Democracy, citado por aquele jornal, o Thedonald.win teve mais de 18 milhões de visitas em novembro e as publicações recentes com apelos à violência tiveram mais de 40 mil reações. Uma das publicações mais preocupantes apelava a que os manifestantes andassem "armados com espingarda, revólver, duas facas e quanta munição consigam carregar".
A página Thedonald.win surgiu há cerca de um ano, depois da conta original na Reddit ter sido encerrada por esta rede social devido às suas frequentes mensagens racistas, misóginas, antissemitas e a incitar à violência.
Entre as conversas dos últimos dias neste fórum também se falava sobre como entrar no Capitólio e "inclusivamente matar todos os traidores do Distrito da Colúmbia e recuperar o país", como relataram vários meios de comunicação social do país.
Apesar de tudo, os seus utilizadores denominam-se patriotas e, depois do que aconteceu esta quarta-feira, continuam a publicar mensagens, nas quais asseguram que o protesto foi pacífico e nas quais culpam a polícia pela morte de uma mulher no Capitólio, uma veterana da Força Aérea, apoiante de Trump. O atual vice-presidente dos EUA, Mike Pence, também se tornou um "traidor", por não ter travado a ratificação de Biden no Congresso.
Publicações semelhantes foram feitas em grupos no Telegram e também no Parler e Gab, redes sociais que se afirmam entre os extremistas de direita em alternativa ao Twitter, ao Facebook e a outras com políticas mais restritas contra notícias falsas e mensagens de ódio.
Entre vários exemplos, o "Buzzfeed" destacava uma mensagem no Parler que perguntava quem se deveria enforcar primeiro, Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes, ou Mike Pence, entre outras opções.
O fundador do Gab publicou, esta quarta-feira, um texto a anunciar que criou e reservou uma conta para o presidente Donald Trump, caso a queira usar, tendo em conta que o seu perfil foi bloqueado no Twitter, no Facebook, no Instagram e no Snapchat na última noite. Esta conta tem replicados os tweets de Trump e já conta com mais de 400 mil seguidores.