
Primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, ordenou o primeiro confinamento já tardiamente, aponta o relatório
Oli SCARFF / AFP
Um relatório do Parlamento britânico sobre a gestão pandémica no Reino Unido arrasa totalmente os esforços do executivo britânico no sentido de impedir a propagação do vírus no início da pandemia e descreve o "fracasso" do país como uma das piores falhas de saúde pública de todos os tempos. A vacinação salva o panorama.
De acordo com os parlamentares, a abordagem do governo de Boris Johnson, apoiada por cientistas, foi a de disseminar a infeção pela população em vez de tentar impedi-la, num plano para alcançar a imunidade de grupo através do contágio, o que levou a um atraso na implementação do primeiro confinamento no Reino Unido (só dois meses depois do surgimento dos primeiros casos). Esta decisão provocou mortes que poderiam ter sido evitadas. O resultado, lê-se no relatório, foi um dos "maiores fracassos de saúde pública que o Reino Unido alguma vez experienciou".
A estratégia foi desenhada para lidar com uma gripe pandémica e avançou com o conselho de consultores científicos do Governo, do Grupo de Aconselhamento Científico para Emergências (Sage, na sigla em inglês), indica o documento. A falta de contestação política e científica em todo o Reino Unido delineou um "pensamento de grupo", aponta o relatório, que também responsabiliza por isso algumas partes da Europa e sublinha a falta de abertura a outro tipo de abordagens adotadas em outros lugares do mundo, como na Ásia, onde os países impuseram controlos de fronteira rígidos assim que o vírus começou a circular.
As conclusões constam de um relatório de 150 páginas da Comissão de Saúde e Assistência Social e da Comissão de Ciência e Tecnologia, que agregam deputados de todo o espetro político. "Coronavírus: Lições aprendidas até agora" cobre uma variedade de sucessos e fracassos ao longo da pandemia, que já custou mais de 150 mil vidas e que é descrita como o "maior desafio em tempos de paz" do último século.
Notando que, numa pandemia, é "impossível fazer tudo certo", os conservadores Jeremy Hunt e Greg Clark, que presidem às comissões, consideraram que "o Reino Unido combinou algumas grandes conquistas com alguns grandes erros" e que "é vital aprender com ambos".
Vacinação foi "uma das iniciativas mais eficazes na história" do país
Entre a catástrofe que é o balanço sobre a ação do Governo durante o início da pandemia, o relatório - que se foca predominantemente nas medidas tomadas em Inglaterra, não tendo analisado as que foram implementadas individualmente pelo País de Gales, Irlanda do Norte e Escócia - aponta, por outro lado, o sucesso que foi o programa de vacinação, desde a investigação e desenvolvimento das vacinas, até ao lançamento de toda a operação logística, tendo este sido descrito como "uma das iniciativas mais eficazes na história do Reino Unido".
O Governo já anunciou que, no próximo ano, haverá um inquérito público completo à gestão da pandemia. "Nunca nos esquivámos de tomar medidas rápidas e decisivas para salvar vidas e proteger o nosso Serviço Nacional de Saúde, incluindo a introdução de restrições e confinamentos. Graças a um esforço nacional coletivo, evitámos que os serviços do NHS ficassem sobrecarregados", disse um porta-voz, citado pela BBC.
Mas Jonathan Ashworth, o ministro-sombra da Saúde do Partido Trabalhista - o membro da oposição responsável por escrutinar o trabalho do governo naquela área - descreveu as "maltidas" conclusões como representativas de "erros monumentais". E o grupo que representa as famílias que perderam entes queridos durante a pandemia ("Covid-19 Bereaved Families for Justice") criticou os autores do relatório por não terem falado com nenhum familiar das vítimas.
