A hora avança 60 minutos no domingo: como surgiu a mudança e quais os impactos
Na madrugada deste domingo os relógios adiantam uma hora. Desde 2018 que a União Europeia discute o fim da mudança de hora, mas a medida nunca avançou. Joaquim Moita, presidente da Associação Portuguesa de Sono, aponta que a hora de verão é “nefasta” para a saúde humana.
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Os dias mais longos estão mesmo aí à porta e serão ainda mais notados com a mudança da hora que ocorre este fim de semana. Na madrugada de domingo, 31 de março, se estiver em Portugal Continental ou na Madeira, à 1 hora o relógio anda para a frente uma hora, fazendo a mudança para o horário de verão. No caso dos Açores a mudança é feita à meia-noite. A próxima mudança de horário vai ser em outubro deste ano.
A transição para a hora de Verão não é consensual e sempre gerou muita discussão. Frequentemente, as pessoas dizem não gostar do horário de inverno e preferem o de verão. No entanto, o relógio atual, ainda de Inverno, tem os ponteiros mais próximos do ritmo solar, sendo esta hora considerada por muitos investigadores a que faz mais sentido. A União Europeia, através de uma diretiva fixada no ano 2000, define que todos os países-membros são obrigados a mudar para a hora de Verão.
Em 2018, o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia propuseram acabar com a mudança de hora. Foi realizado um inquérito a nível europeu que contou com 4,6 milhões de respostas, onde mais de 80% bateu o pé e disse que não queria mais a mudança da hora. A proposta foi aprovada pelos eurodeputados em 2019, mas desde então nada aconteceu, com a pandemia de covid-19 a adiar a decisão. Não há previsão para introduzir o horário único.
A partir de domingo os dias vão ser mais longos, mas porque será que mudamos a hora? Qual a explicação e o que se deve fazer para atenuar eventuais efeitos na saúde?
Como surgiu a mudança da hora
Tudo começou, na prática, em 1916. Durante a I Guerra Mundial, foi implementada a mudança da hora com o intuito de poupar combustível utilizado na iluminação. Os primeiros a implementarem foram a Alemanha e a Áustria, mas rapidamente outros países, nomeadamente Portugal, fizeram o mesmo.
Mas a ideia não surgiu aí. Foi Benjamin Franklin, um dos fundadores dos Estados Unidos da América, que sugeriu a mudança de horário para que se aproveitasse mais a luz do dia, poupando assim noutras coisas, como as velas.
Ainda assim, a questão da poupança de energia é algo que já é debatido há alguns anos, uma vez que os valores atuais não são significativos para justificar a mudança de hora por si só.
Impacto na vida das pessoas
O Observatório Astronómico de Lisboa (OAL) defende que a hora de Verão se mantenha. No parecer publicado em 2018 pelo astrónomo Rui Agostinho, ex-diretor do OAL, concluiu-se que “a existência da hora de Verão em todo o espaço da União Europeia é genericamente benéfica para a população”. Contudo, Rui Agostinho considerou que o último domingo de setembro seria uma melhor opção para a transição para o horário de inverno, antecipando assim em um mês.
Sem o período de Verão, as “horas matinais seriam efetivamente desperdiçadas”, uma vez que o sol iria nascer entre as 5 e as 6 da manhã. Depois de analisar três situações possíveis, Rui Agostinho chegou à conclusão de que “nenhuma das hipóteses sem hora de Verão é uma boa solução para o país”.
Se por um lado Rui Agostinho defende a manutenção da mudança de hora, para que a luz possa ser aproveitada no inverno e para que não seja desperdiçada no verão, a Associação Portuguesa do Sono é a favor da abolição desta lei e defende que o horário a manter deve ser o do Inverno, devido aos “efeitos benéficos para a saúde física e psicológica, com eventual repercussão sócio-económica positiva”.
Joaquim Moita, presidente da associação, falou com o JN sobre esta mudança da hora e considerou que se trata de uma medida nefasta. No seu entender, é uma “hora artificial”, pelo que a hora que se devia manter seria a de inverno, ou seja, a ”hora padrão”.
O pneumologista explicou ao JN que os humanos “têm ritmos diferentes e um deles é o circadiano, o relógio interno, que está quase de acordo com o ritmo solar, sendo necessária uma sincronização de ambos”.
Para Joaquim Moita, o ponto de partida é o facto de se dormir menos de uma hora. Isto causa, segundo o presidente da Associação Portuguesa do Sono, “mais acidentes, mais ataques cardíacos e mais AVC”.
Por outro lado, o médico aponta para outros efeitos negativos como o pior desempenho escolar e profissional, uma vez que “os efeitos da transição arrastam-se por alguns dias”.
Os trabalhadores e as crianças são os que saem mais afetados. O médico aponta a agricultura como um exemplo de profissões que saem lesadas com esta mudança. As pessoas trabalham até mais tarde e os animais continuam a ter a sua própria rotina, independentemente da mudança de hora.
No caso dos jovens, reforçou que “a luz é um fator importante para nos manter acordados” e esta alteração vai transtornar a rotina das crianças.
Sabia que…
A hora legal, independente das mudanças de hora, é escolhida por cada país. Portugal está com a hora UTC 0 (tempo universal coordenado), enquanto a maioria dos outros estados-membros da UE segue o UTC+1. Entre 1992 e 1995, durante o mandato de Aníbal Cavaco Silva, o ex-primeiro-ministro quis acertar a hora com a maioria dos outros países europeus, mantendo o horário alinhado com o país vizinho. Esta decisão causou problemas no país e no inverno, às nove da manhã por vezes ainda era de noite, enquanto no verão o ocaso da luz solar parecia só chegar perto das 23 horas.