Todas as manhãs, jovens fazem o percurso entre duas colinas de Lisboa até às aulas. Acompanhados por um monitor, vão descobrindo novos recantos da cidade e afinando estratégias para caminhar em segurança. Pais aplaudem iniciativa da Junta de Santo António e destacam o benefício ambiental
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Ainda pouco passa das sete da manhã, mas os gémeos Artur e Rosa, de 10 anos, já estão de mochila às costas em plena Avenida da Liberdade, no coração de Lisboa, à espera do monitor e dos colegas para seguirem caminho até ao Liceu Passos Manuel, do outro lado da colina do Príncipe Real. O caminho tem muitas subidas, mas o grupo não quer mostrar fraquezas e diz que "até é fácil". Alguns ainda vêm a esfregar o olho, mas despedem-se dos pais com a tradicional promessa de que se vão "portar bem". Aqui, não é preciso apertar os cintos para começar a viagem. Basta ajeitar as mochilas, ouvir as indicações de Paulo Sequeira, o monitor, e o Pedibus está pronto a arrancar.
O projeto, que arrancou no início do ano letivo, é promovido pela Junta de Freguesia de Santo António, e consiste em organizar uma espécie de "autocarro humano", à semelhança de outros que já existem na capital e em outras cidades europeias.
Emília tem 10 anos e anda no 5.o ano. Chega ao ponto de encontro, acompanhada pelo pai. Diz que "gosta de ir a pé", embora às vezes tenha algumas saudades das viagens de carro, porque "as subidas cansam um bocadinho". David Valente, o progenitor, aplaude porém a iniciativa da Junta de Santo António. "É uma grande mudança de hábitos, que acaba por ser boa para o Ambiente, porque, ao irem a pé, estão a fazer com que haja menos carros e menos poluição", diz. Um sentimento que faz questão de transmitir à filha. "Explico como é importante andar pela cidade para a conhecer, de forma a que daqui a uns anos possa ir sozinha e em segurança", descreve.
O "terrível" peso das mochilas
Sílvia Conde, a mãe de Gonçalo, concorda. "Isto além de eliminar uns quantos carros a circular, combate a tendência para uma eventual obesidade e ajuda-os a saber como se movimentar na cidade", destaca.
Passo a passo, os jovens vão seguindo o seu caminho. "Umas vezes vamos mais caladinhos, outras a falar mais", diz Rosa, sublinhando que há "uns que são mais preguiçosos". "Como o meu irmão", atira, em tom desafiante. Artur não se fica. Admite que as escadas entre a Praça da Alegria e o Príncipe Real "são o mais difícil" mas "nada de preguiça".
Gonçalo, 9 anos, é o "atleta" do grupo. Faz uso do treino que lhe vem do futebol federado que pratica para dizer que "é bom fazer exercício" logo pela manhã. Recorda, porém, como foram mais difíceis os primeiros dias, por causa do peso das mochilas. "Agora já tenho cacifo, é mais fácil", destaca.
Paulo Sequeira, o monitor encarregado do grupo, destaca a "grande evolução" que se nota desde o início do ano letivo. "Já vão mais juntos, atentos, e aprenderam a contornar obstáculos na cidade, como carros em cima do passeio", exemplifica.
É muito importante para dar mais qualidade de vida aos que ainda conseguem resistir e continuar a viver em Lisboa
Vasco Morgado, presidente da Junta de Freguesia de Santo António, não podia estar mais satisfeito com a iniciativa. "Sentimos que ao optarmos por este modelo estamos a dar um contributo real no combate ao sedentarismo e a ajudar os pais, que assim ficam menos pressionados pelo seus horários de trabalho", refere o autarca. Em termos ambientais, sublinha também a eliminação de várias deslocações em automóvel, o que, realça, "é muito importante para dar mais qualidade de vida aos que ainda conseguem resistir e continuar a viver em Lisboa".
Às 8.15 h, o grupo está a chegar à escola. A hora não é propícia a grandes euforias, mas admitem que o cansaço "é só até metade do caminho". "Mas eu gostava mais de vir de carro", destoa Inês, de 9 anos