Aumentaram para mais do dobro operações realizadas com espera acima dos tempos máximos definidos por lei, conclui avaliação da reguladora da Saúde.
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O acesso dos doentes a consultas e cirurgias nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) é cada vez mais penoso. Afeta transversalmente o país e, no caso das cirurgias, o volume de trabalho não serve de justificação para o incumprimento. O Ministério da Saúde garante que está em curso um "plano de ação" para melhorar o acesso a cirurgias e consultas nos hospitais, mas continua sem explicar como tenciona implementá-lo.
Um relatório da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), divulgado na terça-feira, permite constatar que 80% das unidades hospitalares aumentaram o número de doentes operados fora dos tempos máximos definidos por lei. No Hospital de Évora e na Unidade Local de Matosinhos, cerca de metade dos inscritos para cirurgia (51,2% e 45,1%, respetivamente) foram operados fora dos prazos.
A avaliação da reguladora aos tempos de espera no SNS reporta ao período de janeiro a maio de 2018 e compara com dados de agosto a outubro de 2017. "Verificou-se um aumento para mais do dobro na percentagem de cirurgias realizadas com espera acima do TMRG (de 9,1% para 18,5%)", refere a ERS, assinalando que o aumento global se deveu ao forte crescimento do incumprimento dos tempos na prioridade normal.
Nas cirurgias oncológicas e cardíacas, cujos TMRG são diferentes das restantes, a ERS encontrou taxas de incumprimento de 18% e 21%, respetivamente.
Pela primeira vez, a ERS procurou associar o nível de incumprimento dos TMRG e o volume da atividade. Nas cirurgias não foi encontrada "nenhuma associação relevante". Já para as consultas foi possível estabelecer uma relação "com os hospitais com maior nível de atividade a apresentarem maior taxa de incumprimento".
Mais espera na obesidade
Em termos globais, os hospitais apresentaram taxas de incumprimento dos tempos de espera de 18,5% para as cirurgias e de 39% nas primeiras consultas de especialidade.
O tratamento cirúrgico da obesidade é a cirurgia com maior percentagem de doentes operados fora dos tempos máximos de espera (52%), seguida da Pediatria (51%) e Otorrinolaringologia (32%). Nas consultas, a Obesidade também surge no lugar cimeiro com 70% de incumprimento do TMRG, seguido de Oftalmologia (64%), Dermato-Venereologia (63%) e Neurocirurgia (60%).
O Ministério da Saúde diz estar "ciente da necessidade de melhorar os tempos médios de espera" no SNS e garante ter um plano de ação que pretende que os hospitais tomem medidas concretas que permitam resolver todas as situações em que o tempo médio de espera seja superior a um ano até ao final de 2019.
FICHA
Incumprimento
Nos centros hospitalares de Leiria e de Setúbal, no Hospital Garcia de Orta, nas unidades locais de Saúde do Nordeste, do Litoral Alentejano e de Matosinhos, mais de 30% das cirurgias realizaram-se com espera acima dos tempos máximos.
Onde se cumpre
O Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/ Vila do Conde, o IPO do Porto e o Centro Hospitalar do Porto apresentam as menores taxas de cirurgias além do tempo máximo legal (com menos de 6%).
CONSEQUÊNCIA
Alteração dos tempos limite por critérios "políticos" leva doentes para privado
A reguladora da Saúde concluiu que os hospitais do SNS não foram capazes de acompanhar a redução do Tempo Máximo de Resposta Garantida (TMRG) para os casos de prioridade normal, de 270 dias para 180 dias, que entrou em vigor em janeiro de 2018. Ainda ontem, o bastonário da Ordem dos Médicos voltou a alertar para o facto de se terem reduzido por "critérios políticos e não clínicos" os TMRG sem terem sido dadas condições aos hospitais para produzir mais. Como os doentes têm direito a ser operados noutro hospital quando os TMRG são ultrapassados - recebem uma nota de transferência ou um vale cirurgia - o aumento do incumprimento só pode ser atenuado com recurso ao setor convencionado, referiu Miguel Guimarães, ouvido na Comissão de Saúde.