Autarquias asseguram bem essencial a preços mais acessíveis do que as empresas concessionárias.
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O encargo anual de uma família de Santo Tirso/Trofa com um consumo mensal de 10 metros cúbicos de água é mais de seis vezes superior ao de uma família com consumo equivalente no Peso da Régua. A primeira família paga 265,49€ e a segunda apenas 43,20€. A diferença está na empresa que fornece o bem essencial - privada, no primeiro caso, e pública, uma autarquia, no segundo caso.
Os valores são relativos a 2019, fornecidos ao JN pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (Ersar) e não incluem outras tarifas que, frequentemente, fazem mais do que duplicar as faturas, como a de saneamento, de resíduos sólidos ou a de disponibilidade/recursos hídricos.
Dos 25 concelhos com abastecimento de água mais caro no país no ano passado, 24 estão entregues a empresas privadas concessionárias, nomeadamente a Indaqua. Só em Portalegre existe gestão municipal.
Gestão mais cara
A Indaqua explica o elevado preço da água com "o investimento a efetuar pelo operador no município, os custos da operação, o número de clientes que vão suportar estes mesmos custos, assim como a renda a pagar ao município e a qualidade do serviço". No caso de Santo Tirso, Trofa e Vila do Conde, trata-se de municípios "com grandes necessidades de investimento em infraestruturas" para o número de clientes, ao passo que "Matosinhos [também gerido pela Indaqua] tem a tarifa mais baixa da Área Metropolitana do Porto".
A Ersar defende que "a agregação dos sistemas multimunicipais tem como vantagem a harmonização tarifária, promovendo a equidade territorial", todavia a igualdade tem sido conseguida pelo aumento de preços. Como em Ponte de Lima, onde a Águas do Alto Minho (parceria entre a Águas de Portugal/Estado e o município), que começou a operar em janeiro deste ano, aumentou o tarifário até 300%. Antes, 35 metros cúbicos eram taxados a 0,40€ (total de 14€), agora os escalões começam em menos de cinco m3 (0,2741€) e vão subindo até 2,4999€ a partir de 26 m3 (total 53,57€). O custo da mesma água para a autarquia era de 27,99€ (0,7999€/m3), segundo uma fatura anterior à mudança. A empresa nega.
contestação popular
Mais recentemente, surgiram outras entidades responsáveis pela gestão da água, congregando vários municípios, como é caso das Águas do Pinhal Interior Norte, que passou a gerir a água de 11 municípios dos distritos de Coimbra e de Leiria. A empresa intermunicipal continua a ser alvo de contestação, também devido aos aumentos nas faturas (chegaram a 30%).
Este ano, vai haver mais aumentos de tarifários de água, segundo a Ersar, em concelhos servidos pela Epal (Amadora, Cascais, Loures, Odivelas, Oeiras, Sintra e Vila Franca de Xira) e pela Águas do Norte (Amarante, Arouca, Baião, Castelo de Paiva, Cinfães, Espinho, Felgueiras, Lousada, Ovar, Paredes, Santa Maria da Feira e Vila Nova de Gaia). Além disso, deverão aumentar as tarifas do lixo, uma vez que o ministro do Ambiente anunciou a duplicação da Taxa de Gestão de Resíduos, a partir de setembro. A Associação das Empresas Portuguesas para o Setor do Ambiente alertou que esse custo irá refletir-se nas faturas da água das famílias e das empresas.
Já em 2014, o Tribunal de Contas auditou 19 contratos de concessão de água e concluiu que não têm sido benéficos para o consumidor, nem para as autarquias. Recomendou uma redução das taxas de rentabilidade dos acionistas e a partilha de benefícios com utentes e/ou autarquias. Em 2017, o relatório de seguimento notou que "a Ersar não tomou qualquer iniciativa, direta e concreta, com o objetivo de promover, junto dos municípios concedentes, o acatamento das recomendações".