Não vai ser um "querido mês de agosto" para metade dos portugueses que seriam esperados a partir de sábado nas fronteiras nacionais e que este ano decidiram não vir.
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Há quem alegue quebra de rendimentos e medo de contrair o vírus com as deslocações, mas também há quem tenha sido pressionado pelos patrões estrangeiros a não viajar.
As ameaças denunciadas pelas comunidades portuguesas da Suíça e Alemanha dão conta que muitos patrões "aconselharam" os portugueses a não virem de férias a Portugal em agosto, advertindo-os de que não seriam pagos e estariam a pôr os seus empregos em risco caso tivessem de fazer quarentena no regresso.
A pressão é injustificada, pois a esmagadora maioria dos países onde existem grandes comunidades de emigrantes portugueses não tem qualquer restrição nas fronteiras, aéreas ou terrestres. Ainda assim, a simples ameaça demoveu uma parte dos emigrantes, como confirma ao JN a secretária de Estado das Comunidades Portuguesas (ver entrevista) e representantes de comunidades espalhadas pela Suíça.
sem QUARENTENAS
O Governo tem multiplicado incentivos ao regresso dos emigrantes portugueses para férias, assegurando, por exemplo no caso de França, que "nenhuma medida de quarentena será aplicada", fez saber o primeiro-ministro, António Costa.
Segundo Nuno Santos, da Associação de Apoio à Comunidade Portuguesa na Suíça, o receio tem vindo a desvanecer, mas já desmotivou muitos: "Antes do verão havia mais apreensão da comunidade portuguesa em ir a Portugal de férias exatamente porque o patronato punha como advertência, se tivessem de fazer quarentena, que esse período não seria pago e punham em risco os seus empregos".
Negócio é que paga
Só agosto será o tira-teimas, mas as primeiras projeções indicam que metade dos emigrantes não passará férias em Portugal no verão. A circunstância já se sente em freguesias como Longos, em Guimarães, onde mais de metade da população é emigrante. "Nesta altura já gastava 12 ou 13 litros de leite nos pequenos-almoços e esta semana ainda não cheguei aos cinco", regista Daniel Ribeiro, da pastelaria Europa.
Lá fora, na esplanada, sentam-se José Silva, Jerónimo Ribeiro e João Ferreira. Juntos, têm mais de 100 anos de emigração em França e os dois primeiros, que chegaram esta semana, não se lembram de uma viagem tão calma. "Não se via ninguém, nem a Polícia", relata José Silva, serralheiro de 52 anos, que trabalha na zona do Mónaco.
Constatam que há menos emigrantes e não só pela ameaça dos patrões, mas também porque muitos já tiraram férias nos meses em que os negócios fecharam, entre março e maio. Depois, há "muita gente que tem medo do vírus e não é só lá, é aqui também", acrescenta José Silva.
"Aqui até parece que olham para nós com cara de desconfiados", diz João Ferreira, reformado de 64 anos da zona de Paris. "Oui! Aqui no café não, mas há sítios em que desconfiam mais dos emigrantes", corrobora Jerónimo Ribeiro, de 54 anos, aposentado da construção civil, também de Paris.
FESTAS E VIAGENS CANCELADAS
Este ano, os três vão passar mais tempo na freguesia do que em visitas ao centro comercial ou praias movimentadas onde o risco de contrair o vírus é maior. As tradicionais festas do emigrante com grandes arraiais também não se realizam por causa da covid-19. O cancelamento das festas é outro dos fatores que está a desmotivar as viagens de férias, pois muitos emigrantes "também iam aproveitar essas festividades anuais", constata Nuno Santos, da associação suíça.
A redução do número de emigrantes que vem de férias está bem espelhada nas viagens de autocarro. A Top Evasion, microempresa familiar de Leiria que trabalha com viagens a partir de Paris, é uma entre muitas que estão a sentir os efeitos. "No primeiro fim de semana de agosto, que é o mais forte, eu trazia 150 a 200 pessoas de autocarro, neste momento tenho 50", contabiliza o gerente, João Paulo Sá.