Ovelhas controlam crescimento da erva e morcegos reduzem quantidade de insetos. Vitivinicultura sustentável gasta menos água e energia.
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As alterações climáticas não deixam alternativa à produção de vinho em Portugal. Tem de ser sustentável ambiental, económica e socialmente. Desde a videira à garrafa pronta a abrir. Consumir menos água e energia é tão imperativo como reduzir uso de herbicidas e pesticidas. Animais, como ovelhas e morcegos, são aliados.
A vitivinicultura sustentável ganha terreno no país e o Alentejo está na linha da frente com um programa que a promove e monitoriza. A certificação é a meta já conseguida pela Herdade dos Grous (ler texto ao lado). Espera-se que outros produtores alcancem o objetivo este ano.
A Comissão Vitivinícola Regional Alentejana, com a colaboração da Universidade de Évora, iniciou o Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo (PSVA) em 2015. O coordenador, João Barroso, justifica que "o novo mundo dos vinhos - Califórnia (EUA), Chile, Austrália e Nova Zelândia - tem iniciativas desta natureza e o Alentejo viu-se na necessidade de entrar no comboio".
O programa, voluntário e gratuito, tem quase duas centenas de critérios. Vão desde a "redução dos consumos de água e energia à formação contínua dos trabalhadores e à relação das adegas com as comunidades". Pelo meio, João Barroso destaca a "promoção da biodiversidade e a conservação dos ecossistemas, potenciar ao máximo a resiliência das castas e a economia social", entre outros. E tudo isto enquanto se "aumenta a qualidade do produto e se fica com dinheiro em caixa".
João Barroso evidencia a redução do uso de herbicidas e pesticidas, bem como o combate a pragas e doenças da vinha aproveitando "animais que comem outros". É aqui que entram os morcegos. Em média, por noite, "comem uma quantidade de insetos equivalente a cinco vezes o seu peso". Têm sido instaladas caixa de madeira nas vinhas para que sejam povoadas por eles. "Estudos provam que comem os insetos que nós queremos", acentua.
Douro mais sustentável
O Douro ainda não tem um programa como o Alentejo, mas está para breve. Não obstante, Rosa Amador, diretora-geral da Associação de Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID), diz que "têm sido desenvolvidas muitas atividades de sustentabilidade ambiental".
As mentalidades também se alteraram. "Há 30 anos o duriense gostava de ver a vinha sem erva. Hoje fazem-se arrelvamentos. No controlo de pragas, Rosa Amador destaca a confusão sexual da traça da uva. "Através da libertação de feromonas, o macho fica baralhado e acasala menos".
Moutinho Pereira, docente e investigador da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, defende a "escolha de castas de uvas mais resilientes e com maturação mais tardia, que não sofram tanto com o escaldão e com a secura".
A sua equipa estuda a aplicação de caulino - argila esbranquiçada - nas folhas da videira para aumentar a capacidade de refletir a luz solar. Já se faz em algumas quintas do Douro. A Herdade do Esporão, no Alentejo, usa-o em quase todas as vinhas para poupar água na rega. "Não é uma solução milagrosa, mas ajuda nas regiões de clima tipicamente mediterrânico".
430 produtores
O Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo tem cerca de 430 produtores entre os 1800 da região. Representam quase metade da área de vinha e aproximadamente 80% do volume de vinho.
Menos água
Há seis anos, 5% de produtores usavam morcegos, hoje são 45%. Só 20% controlavam o consumo de água, agora são 80%. Alguns gastavam 14 litros de água por litro de vinho produzido, atualmente utilizam cinco.
Painéis fotovoltaicos
A energia fotovoltaica teve um aumento substancial nas vinhas e adegas alentejanas. Muitos produtores não só garantem as necessidades, como têm excedente que vendem à rede, gerando rendimento.
Rega só em stresse
A rega da vinha é permitida no Douro há dois anos. Apenas em situações de défice hídrico que provoquem desequilíbrios na composição e qualidade da uva, e ponham em causa o desenvolvimento da videira.
Impedir o escaldão
Uma das castas que a equipa da UTAD liderada por Moutinho Pereira tem estudado é a tinto-cão. Tem uma folha mais clara, que permite enfrentar melhor situações de excesso de sol e impedir o escaldão.