Cavaco Silva aproveitou mais uma intervenção pública para atacar o Governo e irritar o PS, com dirigentes e governantes a negarem qualquer "falhanço" na habitação. Após as críticas que levaram dois autarcas socialistas a sair a meio do discurso do antigo presidente, o politólogo José Palmeira considera "impressionantes" os "anticorpos" do PS em relação a Cavaco. Mas vai dizendo que, "se calhar, toca-lhes nos pontos fracos" de forma "mais eficaz" pela longa experiência governativa. Seguiu-se Marcelo Rebelo de Sousa, que veio a terreiro arrasar o pacote para a habitação.
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A polémica instalada após as críticas de Cavaco, no sábado, nas comemorações dos 30 anos do Programa Especial de Realojamento (PER), continuou hoje, com o presidente da Câmara de Loures a revelar, à Renascença, uma conversa com Carlos Moedas, autarca de Lisboa que organizou a conferência.
"Comício do PSD"
"Pediu-me desculpa" por ter sido "algo que saiu fora do programado" e se "transformou num comício do PSD", disse Ricardo Leão, que saiu da sala com a autarca Luísa Salgueiro.
O secretário-geral adjunto do PS, João Torres, tinha dito que esperava "uma atitude menos destrutiva de um chefe de Estado". E a ministra da Habitação elogiou o PER e o seu programa. Pelo PSD, Luís Montenegro lamentou que o PS "conviva mal" com o "espírito crítico" de Cavaco Silva.
Ao JN, José Palmeira, professor de Ciência Política da Universidade do Minho, fala em "anticorpos impressionantes em relação a Cavaco Silva", admitindo que toca "nos pontos fracos" dos socialistas e "é eficaz no que diz". A propósito, faz a comparação com Passos Coelho que, embora também irrite o PS, é visto como parte interessada enquanto possível candidato a Belém.
José Palmeira sublinha que Cavaco fala "com conhecimento de causa"e os portugueses "ainda lhe atribuem credibilidade". "Goste-se ou não", tem "um longo currículo na vida política, com 10 anos como primeiro-ministro e 10 como presidente". E "a sua experiência executiva, que incluiu a erradicação de barracas, dá-lhe autoridade para falar", considera ainda.
Belém contra lei cartaz
Marcelo veio depois atacar o plano de habitação, num programa da CMTV, considerando que é "inoperacional" e não passa de "uma lei cartaz". "Tal como está concebido, logo à partida, o pacote da habitação é inoperacional. Quer no ponto de partida, quer no ponto de chegada", disse ontem.
Uma vez aberto o "melão", José Palmeira não crê que Marcelo tenha criticado o programa por causa de Cavaco. Mas admite que, por causa disso, tenha sido "mais contundente".
Questionado sobre se gostou da posição de Marcelo, António Leitão Amaro, vice do PSD, preferiu destacar que o partido "foi e continua a ser dos primeiros a denunciar o erro profundo da estratégia do Governo". E se "não emendar" o plano, o PSD votará contra.
Pela IL, Carlos Guimarães Pinto disse que Marcelo "finalmente teve tempo" de "provar o melão" e ver que "era tão mau por dentro como parecia por fora". Para a bloquista Mariana Mortágua, o presidente "constatou o óbvio" sobre o programa "Mais habitação", ou seja, que "é ineficaz e sem aplicação prática".
O líder do Chega, André Ventura, pede a Marcelo que vete as propostas e à ministra que pondere demitir-se.