
António Nunes, presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses
Gerardo Santos / Global Imagens
António Nunes, presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, reclama comando nacional autónomo, deseja uma academia superior e defende carreira profissional.
Mais de 1500 voluntários participam amanhã, no Porto, na "maior afirmação dos Bombeiros de Portugal jamais realizada". Convocada pela Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP), a parada integra a nova estratégia de imagem deste agente da proteção civil.
Porque exige para os bombeiros o combate aos fogos rurais?
Cada corpo de bombeiros (CB) tem uma área de atuação. Se são para o risco de incêndio urbano ou industrial ou acidente rodoviário, porque não sê-lo também para os incêndios florestais? Foi o que a Liga conseguiu em 1980. Desde 2006, quando aparece o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) da GNR, a atual UEPS, há um emaranhado de entidades nos teatros de operações. Não é razoável do ponto de vista da gestão e organização de meios. O Governo tem toda a legitimidade para determinar que a GNR tenha uma unidade especial. Mas não deve atuar na primeira linha, só para reforço. Não entendemos que nos helicópteros esteja só a UEPS. Os bombeiros que resolvem os incêndios mais complicados não são capazes de resolver os mais simples? Mas já criaram os bombeiros sapadores florestais, os agentes florestais...
E a Força Especial de Proteção Civil (FEPC)...
Podemos chamar o que quisermos, mas não é uma força especial de proteção civil, é uma força especial de bombeiros. Não quiseram chamar-lhe bombeiros para, mais uma vez, enfraquecer a palavra bombeiros. Não aceitamos esta desnatação da tradição, dos valores, da história, do que são os bombeiros. Temos vindo a defender um comando nacional de bombeiros, único, na dependência da Proteção Civil mas com autonomia. Somos o único agente de proteção civil que não tem um comando. O ICNF criou uma estrutura de sapadores bombeiros florestais: ainda não existem e já têm um comando nacional. Os bombeiros são 30 mil em 464 CB e não o têm.
Os bombeiros têm capacidade para tomar conta do dispositivo?
Terão todas de acordo com os reforços que fizeram. Desde 2012, o Estado deu viaturas a 35% das associações humanitárias - setenta e tal viaturas - e dará mais 80 até 2025. Com 464 CB, já se vê o diferencial. É preciso saber que investimento foi feito na UEPS da GNR. Se tivesse sido feito nos CB e na FEB, teríamos mais capacidade. Não há nenhum programa de investimento para as associações.
Tem o levantamento das necessidades?
Temos vindo a pedir ao Governo um programa para prolongar a vida das viaturas com mais de 20 anos. O problema fundamental não são viaturas. Há casos pontuais de urgência. No panorama nacional, diria que se forem distribuídos adequadamente e com bons planos de pré-posicionamento de meios, se recebêssemos 100 a 150 viaturas, seria o ideal. Falo dos incêndios florestais; para os urbanos temos uma capacidade muito boa.
Há disponível um corpo de comandantes?
Amanhã, se quiser. Se desenhar aqui um organograma de comando nacional, tenho 23 para as comunidades intermunicipais (CIM), cinco regionais, um comandante nacional e dois adjuntos. Têm formação, experiência, são comandantes de bombeiros ou ex-comandantes. Muitos dos comandantes distritais são ex-comandantes. A Escola Nacional de Bombeiros (ENB) estará à altura. Demorará mais tempo a produzir a legislação para se fazer o comando nacional do que a formar comandantes. Gostaríamos de ver uma carreira de oficial.
Não existe?
Há uma categoria a que se tem acesso com determinadas qualificações e requisitos, mas não é uma carreira. Até pela profissionalização que cada CB começa a ter, com as equipas de intervenção permanente (EIP), os comandos tendem a ser profissionalizados. Temos de encontrar um mecanismo e ensino para oficial bombeiro, numa carreira com várias graduações, como a PSP ou as Forças Armadas. Um dia teremos um general bombeiro.
Isso exige formação.
Claro. Temos a ENB com um curso de comando e várias universidades abordam os temas de proteção civil, proteção e socorro e áreas de bombeiros. Em 15 dias, uma comissão de sábios faz um programa para uma Academia Superior de Bombeiros, com aulas dentro da Escola, outras na Academia Militar, outras em diversas universidades, por "e-learning", e a ENB tem a parte prática. Em quatro ou cinco anos teremos os primeiros oficiais formados pela Academia.
Que nível de profissionalização pretende?
Um CB que não possa mobilizar voluntários para sair com uma viatura de combate a incêndios, uma ambulância e uma viatura de resgate, tem de fazê-lo com profissionais. Estamos a falar em 20 pessoas (dois turnos), no mínimo. A ANEPC tem uma diretiva financeira para os incêndios florestais e outra para os outros acidentes, há acordos com o INEM, os hospitais, as ARSS, as autarquias - uma vastidão de fontes que cria intranquilidade.
Alarga o financiamento ou condiciona-o?
Condiciona porque uns estão à espera dos outros e o modelo não é claro.... Nas EIP está claro que é metade pelo Município e metade da Administração Central, mas há equipas que não estão constituídas porque o Município não concorda. Há 600 e tal autorizações para a constituição de EIP, mas 130 ou 140 não estão constituídas por várias razões. Defendemos um contrato-programa entre o Estado e a associação de bombeiros, que contratualiza o socorro, os meios, o número de profissionais e de voluntários, o nível de prontidão.
Qual é o futuro do voluntariado?
Está para ficar se soubermos fazer um bom estatuto. Se o Estado nos acompanhar, temos condições para incentivar os novos jovens. Um programa de incentivo ao voluntariado não passa só pelas propinas, creches, deduções ao IRS, isenções no imposto de circulação, passes sociais, mas por incentivos do ponto de vista da reforma, de a ENB conferir qualificações.
Que objetivos tem para este mandato?
Comprometemo-nos a que, no final, os bombeiros veriam a sua dignidade devolvida. O objetivo central é ter um comando nacional de bombeiros nestes quatro anos. Se não conseguirmos, falhamos. O segundo é criar condições para que os CB não acabem: ou encontramos modelos de financiamento estáveis ou corremos riscos desnecessários.
Sobre o objetivo central, já falou com o Governo?
Falei e com várias entidades. Um dos grandes defensores é o próprio presidente da ANPC. Tenho esperança que os políticos não entendam isto como um recuo, mas que ocorreu um interregno entre 2012 e 2022.

